(1839 – 1908)
(Machado de Assis,
aos 30 anos)
Ao sentir-se gravemente enfermo,
Machado de Assis, que ainda morava na mesma casa de dois pavimentos da Rua
Cosme Velho (foto acima), onde morrera Carolina, desceu para o pavimento térreo
e passou a viver num quarto onde recebia os amigos mais chegados.
Aí ficava, segundo o testemunho
da romancista Abel Juruá, que então o visitou − “estendido numa larga poltrona
almofadada, com as pálpebras cerradas, os braços magros enrolados numa espessa
manta de lã.”
Dias antes de seu falecimento, o
seu amigo Alberto Carneiro de Mendonça, ao ver-lhe a fisionomia sofredora:
− Então, como vai passando? – perguntou:
− Mal... Muito mal... Vou morrer...
− Não diga isso – replicou o amigo, apara animá-lo.
Ao que o doente respondeu, abrangendo num gesto o rumor leve
de vozes em outros aposentos:
− Escuta... Não conheces esse zunzum?
E cerrando fatigadamente os olhos:
− É de velório.
Últimos dias...
A vida de Machado de Assis era
uma tênue chama que o mais leve sopro podia apagar. Em seu redor, os velhos
amigos. Lá fora, o sussurro de vozes pesarosas. Nenhuma esperança de saúde para
o velho escritor.
E um amigo, sentindo que se
aproximava a hora final, propôs ao mestre, numa pergunta piedosa:
− Posso mandar chamar um
sacerdote?
Machado moveu a cabeça numa
negativa. E com uma voz distante, já quase extinta, marcando a coerência do
homem com o seu pensamento:
− Não quero... Não creio... Seria uma hipocrisia...
A procissão fúnebre
Ao ouvir um piano tocar a dois
passos da casa onde jazia sem vida o corpo de Machado de Assis, Coelho Neto
disse a Euclides da Cunha, que o fitava com espanto, − que talvez o pianista
não soubesse quem era o grande morto. E é possível que estivesse com a razão.
Sabe-se que foi por iniciativa do
Barão do Rio Branco que o governo da República decidiu conferir ao mestre
das Várias Histórias as honras de um enterro oficial.
O coche fúnebre, saído da sede da
Academia, no Silogeu Brasileiro, após o discurso em que Rui Barbosa se
despediu do morto em nome de seus confrades, caminhou lentamente até o
Cemitério de São João Batista, acompanhado a pé pela multidão silenciosa.
Era um carro imponente, com anjos
dourados e sanefas ricas, puxado por majestosos cavalos pretos. Os boleeiros,
trajando calções curtos, casacões agaloados e chapéus de três bicos, segundo a
descrição de uma testemunha, realçavam o aparato da cerimônia, comandando o
cortejo fúnebre.
O povo aglomerou-se nas calçadas e janelas, atraído pela
procissão, e logo muita gente se pôs a indagar, interessada, de quem era tão
imponente enterro.
− É de Machado de Assis – respondiam.
Mas a resposta não dizia tudo.
Porque a maioria dos que perguntavam não conseguiam unir o nome à importância
do morto:
− Assis... Assis...
E era em vão que puxavam pela memória.
Até que um popular, na multidão
curiosa à passagem do cortejo, teve uma lembrança repentina, que passou logo
adiante:
− Esse Assis é o Senhor Major Assis, fiscal das Loterias...
↓
Os textos acima foram
retirados do livro:
“Pequeno Anedotário
da Academia Brasileira”,
de Josué Montello –
Livraria Marins Editora.
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