segunda-feira, 7 de abril de 2014

Os últimos dias e a morte de Machado de Assis

(1839 – 1908)


(Machado de Assis, aos 30 anos) 


Ao sentir-se gravemente enfermo, Machado de Assis, que ainda morava na mesma casa de dois pavimentos da Rua Cosme Velho (foto acima), onde morrera Carolina, desceu para o pavimento térreo e passou a viver num quarto onde recebia os amigos mais chegados.

Aí ficava, segundo o testemunho da romancista Abel Juruá, que então o visitou − “estendido numa larga poltrona almofadada, com as pálpebras cerradas, os braços magros enrolados numa espessa manta de lã.”

Dias antes de seu falecimento, o seu amigo Alberto Carneiro de Mendonça, ao ver-lhe a fisionomia sofredora:

− Então, como vai passando? – perguntou:

− Mal... Muito mal... Vou morrer...

− Não diga isso – replicou o amigo, apara animá-lo.

Ao que o doente respondeu, abrangendo num gesto o rumor leve de vozes em outros aposentos:

− Escuta... Não conheces esse zunzum?

E cerrando fatigadamente os olhos:

− É de velório.

Últimos dias...

A vida de Machado de Assis era uma tênue chama que o mais leve sopro podia apagar. Em seu redor, os velhos amigos. Lá fora, o sussurro de vozes pesarosas. Nenhuma esperança de saúde para o velho escritor.

E um amigo, sentindo que se aproximava a hora final, propôs ao mestre, numa pergunta piedosa:

− Posso mandar chamar um sacerdote?

Machado moveu a cabeça numa negativa. E com uma voz distante, já quase extinta, marcando a coerência do homem com o seu pensamento:

− Não quero... Não creio... Seria uma hipocrisia...

A procissão fúnebre

Ao ouvir um piano tocar a dois passos da casa onde jazia sem vida o corpo de Machado de Assis, Coelho Neto disse a Euclides da Cunha, que o fitava com espanto, − que talvez o pianista não soubesse quem era o grande morto. E é possível que estivesse com a razão.

Sabe-se que foi por iniciativa do Barão do Rio Branco que o governo da República decidiu conferir ao mestre das Várias Histórias as honras de um enterro oficial.

O coche fúnebre, saído da sede da Academia, no Silogeu Brasileiro, após o discurso em que Rui Barbosa se despediu do morto em nome de seus confrades, caminhou lentamente até o Cemitério de São João Batista, acompanhado a pé pela multidão silenciosa.

Era um carro imponente, com anjos dourados e sanefas ricas, puxado por majestosos cavalos pretos. Os boleeiros, trajando calções curtos, casacões agaloados e chapéus de três bicos, segundo a descrição de uma testemunha, realçavam o aparato da cerimônia, comandando o cortejo fúnebre.

O povo aglomerou-se nas calçadas e janelas, atraído pela procissão, e logo muita gente se pôs a indagar, interessada, de quem era tão imponente enterro.

− É de Machado de Assis – respondiam.

Mas a resposta não dizia tudo. Porque a maioria dos que perguntavam não conseguiam unir o nome à importância do morto:

− Assis... Assis...

E era em vão que puxavam pela memória.

Até que um popular, na multidão curiosa à passagem do cortejo, teve uma lembrança repentina, que passou logo adiante:

− Esse Assis é o Senhor Major Assis, fiscal das Loterias...

Enterro de Machado de Assis

Os textos acima foram retirados do livro:
“Pequeno Anedotário da Academia Brasileira”,
de Josué Montello – Livraria Marins Editora.

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