Num texto do historiador Sérgio da
Costa Franco sobre a Rua José de Alencar, há a seguinte passagem: No outro extremo da rua, perto da Praia de
Belas, muito antes disso, no princípio do século, morava meu tio-avô Américo
Moreira (1856-1927), agente de seguros e poeta bissexto. Um de seus sonetos – o “Brinde de
Honra” – prosperou nos álbuns e salões antigos com uma famosa chave de ouro:
Um anjo como tu, quando se brinda,
Tem-se a missão cumprida, e a festa finda:
Quebra-se a taça e não se bebe mais.
Com o tempo, este soneto foi muitas vezes
declamado em aniversários pelo namorado da moça que completava anos, sempre
dando um pequeno prejuízo para a dona da casa que, invariavelmente, perdia uma
taça de sua coleção. Mas a moça ficava visivelmente emocionada com tal
homenagem, sem saber que o poeta (autor do poema declamado) não teve uma
carreira literária de sucesso, mas passou para a história de muitos enamorados
que queriam impressionar as suas amadas e futuras esposas.
Brinde Honra
Américo Moreira
Se
há nesta terra um Deus para os acasos,
Que,
pela humanidade, o bem reparte,
Que
alegrias te dê, sem leis nem prazo,
E
venturas te dê por toda a parte.
Eu,
de alegrias, tenho os olhos rasos
De
lágrimas, querida, ao vir brindar-te,
Quando
sinto que até para saudar-te
As
flores se debruçam sobre os vasos.
O
meu brinde é sumário, curto e breve.
Se
um nome que se quer, quando se escreve,
Quebra-se
a pena em traços ideais,
Um
anjo como tu, quando se brinda,
Tem-se
a missão cumprida, e a festa finda:
Quebra-se
a taça e não se bebe mais.
Américo Moreira (1856 ‒ 1927)
nasceu no Rio de Janeiro e morou, no final de sua vida, em Porto Alegre , Rio
Grande do Sul.
P.S. Há um soneto na Internet
chamado “Soneto de Homenagem”, atribuído a Antero de Quental, com os seguintes
versos:
Se há nesta vida um Deus para os
acasos,
Que pela humanidade o bem
reparte,
Que te dê da fortuna a melhor
parte
Que venturas te dê, sem lei nem
prazos.
Eu, de alegrias, tenho os olhos
rasos
de lágrimas, querida, ao vir
brindar-te
Quando vejo que até para
saudar-te,
As flores se debruçam sobre os
vasos.
O meu brinde é sumário, curto e
breve.
Se o nome que se quer, quando se
escreve,
Move-se a pena com traços ideais.
Um anjo como tu, quando se
brinda,
Tem-se a missão cumprida e a
festa finda.
Quebra-se a taça e não se bebe
mais.
Se alguém tiver a Antologia
completa dos sonetos de Antero de Quental, verá que este soneto não consta lá;
e o estilo do poeta português é completamente diferente do estilo do brasileiro
Américo Moreira.
P.S. Américo Moreira era carioca assim como sua esposa Ema e não tiveram filhos. Ele era irmão de Ercilia Gonçalves Moreira da Costa Franco. Era irmão, também, de Heloisa Gonçalves Moreira Buarque de Hollanda, mãe de Sergio Buarque de Holanda e avó de Chico Buarque.
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