Frineia em frente ao
Areópago, 1861, Jean-Léon Gérôme.
Julgamento de Frineia
→ Acusada de profanar os Mistérios
de Elêusis foi defendida pelo orador Hipérides, um de seus amantes. O
discurso de acusação, de acordo com Diodoro Periegetes, citado por Ateneu XIII.
591, foi escrito por Anaxímenes de Lâmpsaco. Quando Hipérides percebeu
que o veredito seria desfavorável, rasgou o manto da bela Frineia exibindo seus
seios, conseguindo com isso a mudança no julgamento dos juízes que a
absolveram. Outra versão diz que ela mesma tirou suas roupas. A mudança no
julgamento dos juízes não foi simplesmente porque eles ficaram fascinados pela
beleza de seu corpo nu, mas sim porque, naquela época, a beleza física era
muitas vezes vista como um aspecto da divindade ou um sinal de favor divino.
Frineia, 1867. Museu
Nacional, Varsóvia, pintura de Artur Grotteger
Frineia, a que chorava sorrindo
Por David Coimbra*
(...)
→ Fortuna, sucesso, beleza e
fama, tudo isso possuía Frineia. Transformando-a, evidentemente, em alvo ideal
para a inveja do próximo. Donde um certo Eutias, a quem Frineia deve ter
repudiado, acusou-a de impiedade. Acusação grave − a pena era de morte. O
advogado Hipérides, conhecido causídico grego, ofereceu-se para defendê-la. Não
por acaso: Hipérides também se refestelava nos coxins e almofadas de Frineia.
Mas, a despeito de toda a habilidade de oratória do causídico, os jurados
pareciam inclinados a condená-la.
→ Hipérides estava desesperado,
não sabia mais o que fazer. Foi então que, in
extremis, convocou Frineia para postar-se em frente aos jurados. Ela foi,
linda e obediente. Aí, num gesto brusco, de um único puxão, arrancou a túnica
da ré, deixando-a nua como uma coelhinha da Playboy.
Os jurados eram duzentos homens. Diante daquele espetáculo, disseram, em grego:
− Ooooohhhhhhh...
→ Ao que Hipérides indagou aos
julgadores se eles acreditavam que aquela perfeição seria capaz de cometer um
único ato merecedor de censura. Os jurados, sem fôlego, responderam que não, de
jeito nenhum, absolveram-na e agradeceram ao advogado pelo show. Frineia saiu
do tribunal em triunfo, a fama de sua beleza espalhou-se por todas as ilhas
gregas e a tornou mais rica. (...)
→ Esse episódio inspirou nosso
poeta Olavo Bilac, (...) que gostava muito de mulher, pode ser classificado
como o Vinicius de Moraes do século XIX. Entusiasmado com a história de
Frineia, ele escreveu o seguinte poema em seu livro Sarças de fogo.
Mnezarete, a divina, a pálida
Frineia,
Comparece ante a austera e rígida assembleia
Do Areópago supremo. A Grécia inteira admira
Aquela formosura original, que inspira
E dá vida ao genial cinzel de Praxíteles,
De Hipérides à voz e à palheta de Apeles.
Comparece ante a austera e rígida assembleia
Do Areópago supremo. A Grécia inteira admira
Aquela formosura original, que inspira
E dá vida ao genial cinzel de Praxíteles,
De Hipérides à voz e à palheta de Apeles.
Quando os vinhos, na orgia, os
convivas exaltam
E das roupas, enfim, livres os corpos saltam,
Nenhuma hetera sabe a primorosa taça,
Transbordante de Cós, erguer com maior graça,
Nem mostrar, a sorrir, com mais gentil meneio,
Mais formoso quadril, nem mais nevado seio.
Estremecem no altar, ao contemplá-la, os deuses,
Nua, entre aclamações, nos festivais de Elêusis...
Basta um rápido olhar provocante e lascivo:
Quem na fronte o sentiu curva a fronte, cativo...
Nada iguala o poder de suas mãos pequenas:
Basta um gesto, − e a seus pés roja-se humilde Atenas...
E das roupas, enfim, livres os corpos saltam,
Nenhuma hetera sabe a primorosa taça,
Transbordante de Cós, erguer com maior graça,
Nem mostrar, a sorrir, com mais gentil meneio,
Mais formoso quadril, nem mais nevado seio.
Estremecem no altar, ao contemplá-la, os deuses,
Nua, entre aclamações, nos festivais de Elêusis...
Basta um rápido olhar provocante e lascivo:
Quem na fronte o sentiu curva a fronte, cativo...
Nada iguala o poder de suas mãos pequenas:
Basta um gesto, − e a seus pés roja-se humilde Atenas...
Vai ser julgada. Um véu, tornando inda mais bela
Sua oculta nudez, mal os encantos vela,
Mal a nudez oculta e sensual disfarça.
cai-lhe, espáduas abaixo, a cabeleira esparsa...
Queda-se a multidão. Ergue-se Eutias. Fala,
E incita o tribunal severo a condená-la:
“Elêusis profanou! É falsa e dissoluta,
Leva ao lar a cizânia e as famílias enluta!
Dos deuses zomba! É ímpia! é má!” (E o pranto ardente
Corre nas faces dela, em fios, lentamente...)
“Por onde os passos move a corrupção se espraia,
E estende-se a discórdia! Heliastes! condenai-a!”
Vacila o tribunal, ouvindo a voz que o doma...
Mas, de pronto, entre a turba Hipérides assoma,
Defende-lhe a inocência, exclama, exora, pede,
Suplica, ordena, exige... O Areópago não cede.
“Pois condenai-a agora!” E à ré, que treme, a branca
Túnica despedaça, e o véu, que a encobre, arranca...
Pasmam subitamente os juízes deslumbrados,
− Leões pelo calmo olhar de um domador curvados:
Nua e branca, de pé, patente à luz do dia
Todo o corpo ideal, Frineia aparecia
Diante da multidão atônita e surpresa,
No triunfo imortal da Carne e da Beleza.
*Do livro “Jogo de Damas – Uma
história de grandes mulheres, grandes homens e grandes fatos que determinaram a
supremacia feminina”, da L&PM.
Antônio Parreiras -
Frineia, 1909
P.S. O interessante é que uma das
estátuas de Frineia que sobreviveram repousa agora recatadamente no Vaticano.
Tenho o orgulho e honra de ter o nome Hipérides, graças ao meu pai ter conhecimento, na época em que nascí - 1938, desta bela história damitologia grega. (320 AC)
ResponderExcluirRealmente, amigo Hipérides, por traz do teu nome há uma bela história...
ResponderExcluirExcelente matéria. Obrigado.
ResponderExcluirE eu agradeço pela leitura de nosso modesto almanaque.
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