Tatuagem é uma canção escrita pelo
cantor e compositor brasileiro Chico Buarque
e pelo cineasta
Ruy Guerra
para a peça de ambos intitulada “Calabar: o Elogio da Traição”, escrita em 1973. A música Tatuagem
revela o desejo que o sujeito tem de se dedicar profundamente a um outro. Entretanto
o uso da tatuagem para a realização desse desejo pode revelar desejos não
confessados. Uma vil forma de mostrar para o outro quem é o dono daquele corpo,
o que estabelece uma forma de fidelidade entre as partes. Na música de Chico e
tão bem interpretada por Bethânia, o caráter melancólico e fúnebre da letra
revela algo que não se completou que não se consumiu pelo intenso desejo.
Assim, mesmo havendo a consumação das partes o forte desejo não foi suprido e
se exprime na melancolia e na produção da tatuagem na pele.
(Do Blog Clube de
Leitura)
Tatuagem
Chico Buarque - Ruy
Guerra/1972-1973
Para a peça Calabar de Chico Buarque e Ruy Guerra
Para a peça Calabar de Chico Buarque e Ruy Guerra
Quero ficar no teu corpo feito
tatuagem,
Que é pra te dar coragem,
Pra seguir viagem
Quando a noite vem.
Que é pra te dar coragem,
Pra seguir viagem
Quando a noite vem.
E também pra me perpetuar em tua
escrava,
Que você pega, esfrega, nega,
Que você pega, esfrega, nega,
Mas não lava…
Quero brincar no teu corpo feito
bailarina,
Que logo se alucina,
Salta e te ilumina
Quando a noite vem.
Que logo se alucina,
Salta e te ilumina
Quando a noite vem.
E nos músculos exaustos do teu
braço,
Repousa frouxa, murcha, farta,
Repousa frouxa, murcha, farta,
morta de cansaço…
Quero pesar feito cruz nas tuas
costas,
Que te retalha em postas,
Mas no fundo gostas,
Quando a noite vem...
Que te retalha em postas,
Mas no fundo gostas,
Quando a noite vem...
Quero ser a cicatriz risonha e
corrosiva,
Marcada a frio, ferro e fogo,
Em carne viva…
Marcada a frio, ferro e fogo,
Em carne viva…
Corações de mãe,
Arpões, sereias e serpentes,
Que te rabiscam o corpo todo,
Mas não sentes…
Que te rabiscam o corpo todo,
Mas não sentes…
Do Projeto 365 canções
Registrada no histórico disco Drama
3º ato (1973) - gravado ao vivo no Teatro da Praia, RJ, − “Tatuagem” apresenta
todo o sentimento de um sujeito que quer se entranhar corpo adentro, do outro.
O uso da tatuagem, como metáfora desta vontade, porém, esconde desejos
inconfessos.
A tatuagem (como desenho permanente
na pele, marcado a frio, a ferro e fogo) é também uma forma de mostrar aos
outros quem é o 'dono' daquele corpo. A tatuagem estabelece uma relação de
fidelidade entre os amantes. Porém, ao evocar a serpente, o sujeito indicia
traições inconfessas.
Portanto, há um sedutor paradoxo quando o
sujeito diz: “também pra me perpetuar em tua escrava”. No jogo/embate erótico
(cruz nas tuas costas que te retalha em postas, mas no fundo gostas), afinal,
quem é escravo de quem? Quem canta querer ser tatuagem ou quem é tatuado? Pouco
importa.
É com estes pensamentos − de posse e de desejo absurdamente passionais − que a interpretação de Bethânia exibe a parte mais clara da alma do sujeito da canção. Bethânia toma para si o movimento serpenteante do sujeito na carne viva do outro.
Pétala por pétala, as rimas e as respirações (extremamente marcadas pela ênfase na consoante 'r') criam a imagem da bailarina brincando no corpo do outro.
“Tatuagem”, composta para a peça Calabar, de Chico Buarque e Ruy Guerra, na interpretação de Bethânia, em que cada letra é meticulosamente dita, cantada e ouvida, arrebata o ouvinte que, seduzido, se deixa tatuar.
A canção fica na memória da pele (como um canto de sereia, ou reduzido a um esconderijo tatuado) e, vira e mexe, em carne viva, nos lembra dos (des)domínios dos afetos.
Opiniões das mulheres:
Do que fala a música?
Adriana: “Fala da vontade de
permanecer no corpo do ser amado, como tatuagem, seja ela bailarina, cruz,
corações de mãe, arpões, sereias ou serpentes… e nunca mais sair: “que você pega,
esfrega, nega, mas não lava…”
Raquel: “Fala do quanto a mulher
quer se sentir importante na vida de um homem, ao passo de querer se comparar
como uma tatuagem, uma cicatriz que deixam marcas eternas, pois mesmo tentando
apagá-las, elas estão ali, mesmo que de forma diferente, meio apagadas, elas sempre vão estar ali…no fundo do coração do homem amado.”
Kássia: “Com maestria, Chico, o
maior compositor brasileiro de músicas com o “eu feminino”, fala de uma relação
de devoção, desejo e paixão de uma mulher…
Bruna: A canção foi escrita pela
perspectiva de uma mulher que está loucamente apaixonada por seu namorado. Ela
descreve esta paixão dizendo que quer se fixar no corpo dele “feito tatuagem”,
se perpetuando em sua escrava.
P.S. Escute, na internet, essa
música nas vozes de Chico Buarque ou de Elis Regina.
A gravação com Chico Buarque, está
correta com a letra cantada pelo próprio autor. A gravação com a cantora Elis
Regina, apesar de pequenas alterações quanto alguns pronomes que não existem na
letra original, tem mais densidade dramática na interpretação na voz de uma
grande cantora.
O contexto da canção
na peça Calabar: O Elogio da Traição
Bárbara era como se fosse uma
parte de Calabar, estava junto a ele. Quando Calabar morreu Bárbara se mostrou
questionadora e tornou-se uma das principais vozes da peça. Ao tentar buscar
justificativas para morte de seu amante, não deixou que a privassem em sua
fala, fez questão de acusar e desmascarar homens que eram chamados de heróis,
fez de sua fala seu protesto. A canção “Cala a boca Bárbara” evidencia bem essa
questão, o que ela dizia era algo para ser calado. Bárbara parecia amar Calabar
e jamais querer outro homem em sua vida, dizia que ele era uma marca
permanente, que não seria esquecida e ela ficaria com ele eternamente, como é
possível perceber na canção “Tatuagem”, que é cantada enquanto se desenrola as
cenas da execução de Calabar:
Bárbara queria estar com Calabar
para sempre, como tatuagem e cicatriz em seu corpo. Ao olhar por essa
perspectiva, o amor de Bárbara se torna indubitável. Não há como duvidar do
amor de Bárbara, que tem necessidade de se perpetuar mesmo depois da morte de
Calabar. Por seu amante ela não tem medo de enfrentar os outros, de dizer
verdades que estavam encobertas, de escancarar o que não estava às vistas.
A traição nas canções
do musical Calabar
Miriane Pereira
Dayrell Souto
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