sexta-feira, 24 de maio de 2024

O pássaro cativo

 

Armas, num galho de árvore, o alçapão;
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.
 

Dás-lhe então, por esplêndida morada,
A gaiola dourada;
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo:
Por que é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste, sem cantar?
 

É que, criança, os pássaros não falam.
Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;

Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:
 

“Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que a voar me viste;

Tenho água fresca num recanto escuro
Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores,
Sem precisar de ti!

Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola
De haver perdido aquilo que perdi…

Prefiro o ninho humilde, construído
De folhas secas, plácido, e escondido
Entre os galhos das árvores amigas…

Por que me prendes? Solta-me, covarde!

Deus me deu por gaiola a imensidade:
Não me roubes a minha liberdade…
Quero voar! voar!…”
 

Estas coisas o pássaro diria,
Se pudesse falar.
E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição:
E a tua mão, tremendo, lhe abriria
A porta da prisão…
 

Olavo Bilac – Poesias Infantis

PS: “Assim como o cavalo do telhado se transformou em símbolo de resistência e de heroísmo da tragédia climática, com louvor para a intervenção humana, a morte dos pássaros e dos demais animaizinhos cativos no interior do shopping (em Porto Alegre) alagado ficará como marca da nossa insensibilidade.” 

Acima, pequena parte de bela crônica de Nílson Souza, “Pelos pássaros afogados”, (Zero Hora de 21.05.2025) sobre uma loja famosa em todo o Brasil, que comercializa artigos para pets e animais pequenos, em que nenhum funcionário  teve a coragem de colocar as gaiolas dos pequenos animais em lugar mais alto da loja, e havia lugar, deixando-os que morressem afogados por falta de iniciativa. A direção do shopping os alertou que as águas do Lago Guaíba estavam subindo e havia grandes possibilidades de entrar no estabelecimento. O recado não foi ouvido.

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Em uma vistoria conduzida pela Polícia Civil, nesta quinta-feira (23 de maio), foram retirados 38 animais mortos (aves, roedores e peixes) em uma unidade da Cobasi em Porto Alegre. A loja de dois andares, localizada no subsolo de um shopping do bairro Praia de Belas, alagou com as chuvas e a alta do nível do Guaíba. 

GZH 

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