quinta-feira, 22 de julho de 2021

Falando inglês em português

 Por Fábio Prikladnicki*

Bem que tento posar de moderninho, mas basta ler uma palavra em inglês no lugar em que caberia uma equivalente em português que já viro um ancião iludido com o tempo em que, ah, naquele tempo sim se falava português no Brasil. 

Pense em vitrine com uma chamativa sale no lugar de uma “promoção”, com 50% off em vez de “50% de desconto”. É disso que estou falando. 

Não perca tempo argumentando que a nossa língua − quero dizer, a língua que foi imposta aos indígenas pelos portugueses − sempre recebeu influência de diferentes idiomas. Embora simpatize com Policarpo Quaresma, não nego a realidade. 

Nada contra os americanos, que nos deram o jazz e o Google. Nem contra os ingleses, que nos presentearam com o football e nos fizeram vibrar com o primeiro goal. Seria um tanto chavão enumerar aqui os escritores, músicos, artistas e pensadores anglófonos que venero, sempre que possível, em sua própria língua. 

Prova disso é que, às vezes, uma simples maquiagem no estrangeirismo já me contenta. 

Em minhas mãos, surf vira “surfe”, e golf − surpresa! −, “golfe”. Deck, claro fica “deque”, e drink, “drinque”, mesmo que pareça menos chique. Mas também não sou um sem-noção. Jamais permitiria que rock fosse “roque”, porque tudo tem limite. Agora, quem toca rock é “roqueiro”, não quero nem saber − de qualquer forma, roqueiro que se preze nunca se define dessa forma. 

Alguns estrangeirismos servem para dar uma suavizada. É o caso de fake news, esse conceito quase filosófico que, usado na íngua portuguesa, parece menos perigoso do que “notícia falsa”. Ou outsourcing, que soa menos grave do que “terceirização”. Até feedback fica agradável quando não é uma “avaliação”. Coloque um pouco de glamour na sua sofrência. 

Agora: tem estrangeirismo que nos salva do sufoco da falta de uma boa alternativa em português? Tem sim. Mesmo no país do jeitinho e da malandragem, ninguém pratica dumping em português. Seria necessário um brainstorm para descobrir outra maneira de fazer um brainstorm. E já temos uma tradição nacional em talk show e stand-up. Veja bem, se nem os franceses resistem a um weekend depois de uma longa semaine de trabalho, o que sobrará para nós? 

Sinto que estou causando desgosto ao meu professor de linguística da época da faculdade. Foi ele quem me ensinou que a língua é um fenômeno vivo, que está em constante transformação. E eu não mereço ser chamado de reacionário, do que já senti que vocês, caros leitores, estavam prontos para me xingar no Twiter. Não levem a sério esse texto irônico, estou apenas exercitando o humour. 

Talvez seja a hora de abraçar o futuro. Startar uma nova vida. Linkar tudo que falamos com um novo mindset, mudar o approach. Quem não quer ser lembrado como um case de sucesso antes que budget termine ou que o deadline divino faça seu job? 

*(Em Zero Hora, julho de 2021) 

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