terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

A arte de enxergar

 Por Elias José

Olhar as coisas e descobrir.

O avesso.

O aviso.

A fenda.

O fundo.

O engenho.

O engano.

Olhar os livros e descobrir.

O claro.

O oculto.

O culto.

O definível.

A dúvida.

O decifrável.

Olhar os amigos e descobrir.

O afeto.

O aflito.

O fácil.

A manha.

A mão.

Olhar os filhos e descobrir.

A cria.

O crédito.

A dádiva.

O débito.

A promessa.

O milagre.

Olhar a amada e descobrir.

O enigma.

O enlevo.

O apelo.

A pele.

A ávida.

A vida.

Olhar-se no espelho e descobrir.

O tempo.

A têmpera.

A máscara.

O mesmo.

O outro.

Tempos difíceis

 Marta Kuhn

Eram tempos tristes ou não?

Lavava-se roupas no rio,

Dentro da água, molhada, no frio.

Trouxa na cabeça ou no bacião.


Com ferro a carvão se passava

Muitas saias engomadas,

Que se arrastavam ao chão...

 

Não sobrava nenhum tostão,

Trocava-se batata por feijão;

Banha, por leite,

Não existia azeite.

 

Se caminhava um montão

Até chegar ao destino

Pelas estradas empoeiradas, barrentas,

Entre o mato e a escuridão.

Não havia condução.

 

Procuravam-se achas de lenha

Para com machadado cortar

E ainda fazer o fogo no fogão

Para cozinhar!

 

Quando muito, se via a carreta

De bois, com rodas de ferro.

O condutor gritava:

− Oxe, boi!

E as rodas travavam

No chão, os bois cansados,

Judiados na tal lentidão!

 

Não era fácil não!

Tinha que fazer o biscoito,

Bolacha e assar o pão.

Limpar a chapa com areia

E fazer o sabão!

Correr no galinheiro atrás do frango

E ainda tirar seu coração.

 

A filharada era tanta,

Mal dava para todos.

Uns comiam; outros não.

 

Roupas quase não se comprava,

Boas almas doavam.

Se remendava, cosia-se de sacas de farinha:

Lençóis, camisolas e calcinhas!

Não era fácil não!

 

Os pés aos espinhos acostumavam-se

Com as geadas, endurecia o cascão!

E, na humilde maloca,

Um cachorro magro na porta

E a filharada dormindo no chão,

Fugindo das tantas goteiras,

À luz de vela ou lampião!

 

As crianças ranhentas cresciam,

Faltava-lhes quase tudo!

Sobretudo... sobrava amor,

Respeito e educação!


(Do livro “Palavras 2017” da AJEB*) 

AJEB: Associação de Jornalistas e Escritores do Brasil

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Amor da Minha Vida

 (Wilson das Neves e Paulo César Pinheiro)

Tu és o sol que faz brilhar, meu bem,

Cada manhã da minha vida.

Tua presença é que me dá

Motivação pra prosseguir na lida.

O teu olhar é que mantém

A minha chama sempre acesa.

O teu sorriso é um farol

Me guiando nas noites de tristeza.

 Tu és o bem mais importante que eu ganhei,

Afirmo e não vacilo.

Sem ter de noite um beijo teu,

Eu já não durmo mais tranquilo.

Tu és a paz que eu sempre quis a me esperar.

Se eu chego em casa e quero descansar

Pra me esquecer dos problemas da rua.

Tu és pra mim certeza de missão cumprida

E a esperança de que além da vida

Na tua vida a minha continua. 

Tu és alguém que eu esperei

Um dia achar

Pra enfim poder me realizar

Dando sentido a esse meu caminho.

Tu és a luz que veio pra me acompanhar

Me incandescer, me iluminar,

Não me deixando mais ficar sozinho.

Tu és enfim tudo que alguém

Já quis ganhar.

Não necessito mais sonhar

Nenhuma ilusão perdida,

Ganhei de Deus

O que eu jamais pude supor,

Porque tu és, ó meu amor,

O grande amor da minha vida. 

Essa música está na internet cantada por Wilson das Neves, que fez a música para os lindos versos de Paulo César Pinheiro.


Escrever

 Joaquim Ferreira dos Santos

A estudante perguntou como era essa coisa de escrever. Eu fiz o gênero fofo. Moleza, disse. 

Primeiro, evite estes coloquialismos de “fofo” e “moleza”, passe longe das gírias ainda não dicionarizadas e de tudo mais que soe mais falado do que escrito. Isto aqui não é rádio FM. De vez em quando, para não acharem que você mora trancado com o Domingos Paschoal Cegalla ou outro gramático de chicote, aplique uma gíria como se fosse um piparote de leve no cangote do texto, mas, em geral, evite. Fuja dessas rimas bobinhas, desses motes sonoros. O leitor pode se achar diante de um rapper frustrado e dar cambalhotas. Mas, atenção, se soar muito escrito, reescreva. 

Quando quiser aplicar um “mas”, tome fôlego, ligue para o 0800 do Instituto Fernando Pessoa, peça autorização ao bispo de plantão e, por favor, volte atrás. É um cacoete facilitador. 

Dele deve ter vindo a expressão “cheio de mas-mas”, ou seja, uma pessoa cheia de “não é bem assim”, uma chata que usa o truque de afirmar e depois, como se fosse estilo, obtemperar. 

Não tergiverse, não diga palavras complicadas, não escreva nas entrelinhas. Seja acima de tudo afirmativo, reto no assunto. Nada de passar páginas descrevendo o clima da estação, esse aborrecimento suportável apenas quando vemos as curvas da Garota do Tempo recortadas contra o chroma-key do “Jornal Nacional”. 

Abaixo o prólogo com a lente aberta, nada daquelas observações sensíveis sobre a paisagem e, a não ser que você seja o Dashiell Hammett ou o Raymond Chandler, esqueça o queixo quadrado do bandido ou a descrição pormenorizada dos personagens. Corte o que for possível. Depois dê uma de Raymond Carver e, nem aí para os pruridos da vaidade, mande o resto para o editor acabar de cortar. 

Sempre cabe uma linha a menos no texto, é o efeito Rexona aplicado na axila gramatical. Evite essas metáforas complicadas, passe por cima de expressões como “em geral”, como está no primeiro parágrafo, pois elas têm a mesma função-paralelepípedo dos parênteses, dos travessões. Chute para fora da página tudo mais que faça as pessoas tropeçarem na leitura ou darem aquela ré em busca do verdadeiro da frase que passou. 

Deixe tudo em pratos limpos, sem tamanho lugar-comum. Ouça a voz do flanelinha semântico gritando a chave para o bom texto. “Deixa solto, doutor.” 

É mais ou menos por aí, eu disse para a menina que me perguntou como é essa coisa de escrever. 

Para sinalizar o trânsito das ideias, use apenas o ponto e a vírgula, nunca juntos. Faça com que o primeiro chegue logo, e a outra apareça o mínimo possível. Vista Hemingway, só frases curtas. Ouça João Cabral, nada de perfumar a rosa com adjetivos. 

Mergulhe Rubem Braga, palavras, de preferência com até três sílabas. “Pormenorizada”, vista acima, é palavrão absoluto. Dispense, sem pormenores. 

O texto deve correr sem obstáculos, interjeições, dois pontos, reticências e sinais que só confundem o passageiro que quer chegar logo ao ponto final. Cuidado com o “que quer” da frase anterior, pois da plateia um gaiato pode ecoar um “quequerequé” e estará coberto de razão. A propósito, eu disse para a menina, perca a razão quando lhe aparecer um clichê desses pela frente. 

Você já se livrou do “mas”, agora vai cuidar do “que” e em breve ficará livre da tentação de sofisticar o texto com uma expressão estrangeira. É out. Escreva em português. Aproveite e diga ao diagramador para colocar o título da matéria na horizontal e não de cabeça para baixo, como está na moda, como se estivesse num jornal japonês. 

Pode-se escrever baixinho, como faz o Veríssimo, que ouviu muito Mario Reis para chegar àquela perfeição de texto de câmara. Outra opção é desabafar pelos cinco mil alto-falantes o que lhe vai na pena da alma, como faz o Xico Sá, que aprendeu a escrever com o Waldick Soriano. Escreva com a sonoridade que lhe aprouver, nunca com cacófatos assim ou verbos que façam o leitor perguntar para o vizinho do lado que maluquice é essa de “aprouver”. Fuja da voz passiva, da forma negativa, do gerundismo e principalmente da voz dos outros. Se falo fino, se falo grosso, ninguém tem nada com isso. O orgulho do próprio “falo”, e fazê-lo firme e com charme, é uma das chaves do ofício. 

De vez em quando, abra um parágrafo para o leitor respirar. Alguns deles têm a mania de pegar o bonde no meio do caminho e, com mais parágrafos abertos, mais possibilidades de ele embarcar na viagem na viagem que o texto oferece. Escrever é dar carona. Eu disse isso e outro tanto do mesmo para a menina. Jamais afirmei, jamais expliquei, jamais contei ou usei qualquer outro verbo de carregação da frase que não fosse o dizer. Evitei também qualquer advérbio em seguida, como “enfaticamente”, “seriamente” ou “bemhumoradamente”. Antes do ponto final, eu disse para a menina que tantas regras, e outras a serem ditas num próximo encontro, serviam apenas de lençol. Elas forram o texto, deixam tudo limpo e dão conforto. Escrever é desarrumar a cama. 

(Texto publicado no jornal O Globo)

domingo, 26 de fevereiro de 2023

Lágrimas benditas

 Heitor da Silva 

(Pe. Heitor Rossatti)

Chora a mãe... Por que é que chora?

É que o filho a vai deixar...

Vai deixá-la, vai-se embora,

Nem tão cedo há de voltar!...

Sim, o filho!... Que caminhos

Busca o filho? Os da cruz!

Deixa o lar com seus carinhos,

Deixa a rosa, busca espinhos:

Quer ser padre de Jesus! 

Chora a mãe!... Por que é que chora?

É que o filho já a deixou...

Sim, o filho que ela adora!

Oh! Deixar que fosse embora,

Quanto, quanto lhe custou!... 

Sim, custou naquele dia,

Vendo o filho seu partir

'Inda agora (quem diria?)

Sente n'alma noite e dia

Das saudades o pungir! 

Chora a mãe!... Por que é que chora?

É que o filho se ordenou!...

Sim, o filho que ela adora,

Ficou padre, sim ficou!... 

Sim, ficou! E a mãe chorava,

Vendo nele um Serafim!...

Quando o bispo o ordenava

De feliz a mãe chorava...

Como é bom chorar assim!... 

Quando após, num doce enleio,

Lhe beijou a ungida mão

E o cingiu com força ao seio,

Quis falar e a voz não veio,

Quis sorrir, mas foi em vão!... 

Um suave e doce pranto

Lhe embargou a voz então...

Mãe feliz! Invejo-a tanto!

Tinha na alma um gozo santo,

Tinha o céu no coração!... 



A carta de uma leitora

 

Tenho 55 anos, estou aposentada há dois anos e separada há dez. Tenho dois filhos com mais de 20 anos, que não colaboram em nada nas tarefas da casa. Os dois trabalham. O mais novo trabalha por conta própria, e vive reclamando que o dinheiro está curto. No entanto, vai bastante às baladas e trocou de carro por esses dias. Já pensei várias vezes em me mudar e deixá-los administrando o apartamento. Eles não gostam da ideia porque, inclusive, não se dão muito bem. Competem o tempo todo, não têm os mesmo amigos e já tiveram discussões feias. O mais velho é estressado, reclama de tudo. Não sei o que fazer da minha vida sem me sentir tão egoísta, culpada. Mas tenho vontade de sair mais e me entristecer menos. Sou meio parada para encontrar pessoas e diversões e tenho medo de sentir mais solidão se for morar sozinha. 

Marcela, Rio de Janeiro, RJ 

Nunca é tarde para mudar 

Alberto Goldin* 

Ainda era cedo quando acabou suas tarefas, casa limpa, comida pronta, roupa passada e organizadas nos armários. Finalmente poderia se dedicar a seu passatempo preferido: pensar, imaginar suas outras vidas, aquelas que não viveu. Do seu casamento sobraram, além dos filhos, móveis e utensílios, algumas cinzas e poucas fotografias nas quais ambos aparecem sorridentes e empolgados, antecipando um futuro que nunca chegou. 

− E agora? − perguntou-se Marcela pela milésima vez. 

Retomou seu filme no lugar onde parou no dia anterior. Usaria suas economias para a mudança, sem se preocupar em quebrar a sólida rotina que durante anos ocupou seus dias. A novidade foi o impulso de escrever para o jornal. Estava satisfeita de ter tido a coragem e a iniciativa de contar sua história, tirá-la do anonimato. Era sua vida e em rápida retrospectiva se viu quando era jovem, sensual e desejável, uma mulher que amou, chorou, construiu e habitou o palácio no qual reinou durante anos. 

Como acontece com a maioria dos palácios, a ação do tempo tinha lhe tirado brilho, altura, espaço e consistência, até ficar reduzido à sala, cozinha e três quartos que agora pretendia abandonar. Seus filhos, já adultos, se opõem, tentam segurá-la, não necessariamente por amor, mas com o propósito de manter o passado vivo. 

− A mãe deve morar com seus filhos − diz. 

É natural, só que as funções maternas, com o tempo, perdem a validade e atacam a feminilidade, e os filhos, presos ao mesmo passado, se instalam como adolescentes carentes. O resultado desse modus operandi é manter de pé as últimas colunas do antigo palácio, preservar a fase luminosa da família, quando juntos eram felizes. Essa armadilha prende Marcela, que se sente estar traindo o grupo se desmontar o cenário. Os filhos não querem sua independência e ela não quer a solidão. 

É estranho, porque sua vida já é solitária, os filhos não precisam dela e ela sabe que suas funções maternas são arcaicas. Deve a si mesma uma nova rodada de aventura, um novo contexto no qual possa rastrear a Marcela do passado, com direito a amigos, projetos e novidades. O paradoxo é que ao mesmo tempo em que retém o passado, rejeita os desejos e os valores da juventude. Existem duas possibilidades: uma é continuar como porteira da sua história, guardiã do museu; a outra é recuperar a mulher que foi na juventude. Não há idade para dançar, fazer turismo, recriar amizades... A única condição é se sentir livre, soltar filhos e lembranças e assumir uma proposta séria de mudança. A mudança não precisa ser imobiliária, importante é a mudança de atitude que, inexorável, acabará por levá-la a outro imóvel. Alguns precisam mudar de cenário para mudar o argumento, outros mudam o argumento para mudar de cenário. Não importa, Marcela, o essencial é a mudança. 

* Alberto Goldin é psicanalista. O nome da leitora foi alterado para garantir o anonimato da remetente. 

Texto da Revista O Globo, abril de 2010

sábado, 25 de fevereiro de 2023

Girassóis

 

Nossos olhos são seletivos, nós “focalizamos” o que queremos ver e deixamos de ver o restante. Escolha focalizar o lado melhor, mais bonito, mais vibrante das coisas, assim como um girassol escolhe sempre estar virado para o sol! 

Você já reparou como é fácil ficar de baixo astral? Baixo astral porque está chovendo, porque tem conta a pagar, porque não tem exatamente o dinheiro ou a aparência que gostaria de ter, porque ainda não encontrou o amor da sua vida, porque a pessoa que você quer e não te quer, porque... É claro que tem hora que a gente não está bem. Mas a nossa atitude deveria ser a de uma antena que tenta, ao máximo possível, pegar o lado bom da vida. 

Na natureza, nós temos uma antena que é assim: o girassol. O girassol se volta para onde o sol estiver. Mesmo que o sol esteja escondido atrás de uma nuvem. Nós temos de aprender a realçar o que de bom recebemos. Aprender a ampliar pequenos gestos positivos e transformá-los em grandes acontecimentos. Temos de treinar para ser girassol, que busca o sol, a vitalidade, a força, a beleza. Por que só nos preparamos para as viagens, e não para a vida, que é uma viagem? 

Apreciar o amor que alguém em um determinado momento dirige a você. Apreciar um sorriso luminoso de alegria de alguém que você gosta. Apreciar uma palavra amiga, que vem soar reconfortante, reanimadora. Apreciar a festa, a alegria, o sorriso. 

E se o mau humor voltar que volte também a lembrança dos girassóis. Selecione o melhor deste mundo, valorize tudo o que de bonito e bom haja nele e retenha isto dentro de você. É este o segredo de uma vida melhor. 

Texto de Fátima Carvalho 


sexta-feira, 24 de fevereiro de 2023

Estilos de liderança.

 Novo gerente...

Uma empresa entendeu que estava na hora de mudar o estilo de gestão e contratou um novo gerente geral. Este veio determinado a agitar as bases e tornar a empresa mais produtiva. 

No primeiro dia, acompanhado dos principais assessores, fez uma inspeção à toda empresa. No armazém todos estavam trabalhando, mas um rapaz novo estava encostado na parede com as mãos no bolso. Vendo uma boa oportunidade de demonstrar a sua nova filosofia de trabalho, o novo gerente perguntou ao rapaz: 

− Quanto é que você ganha por semana? 

− Trezentos reais, por quê? − respondeu o rapaz sem saber do que se tratava. 

O administrador tirou os R$ 300,00 do bolso e os deu ao rapaz, dizendo: 

− Aqui está o seu salário desta semana. Agora desapareça e não volte aqui nunca mais! 

O rapaz guardou o dinheiro e saiu conforme as ordens recebidas. 

O gerente então, enchendo o peito, pergunta ao grupo de operários: 

− Algum de vocês sabe o que este tipo fazia aqui? 

− Sim Senhor −− responderam atônitos os operários. 

− Veio entregar uma pizza e estava aguardando o troco. 

“Há pessoas que desejam tanto mandar, que se esquecem de pensar”.

Ara, que susto danado!

 

Um caminhão velho, desses de carregá tranquera, foi buscar na cidade um caixão de defunto pra ser usado por um dito cujo que tinha falecido lá praquelas redondezas. Lá vinha o caminhão com o caixão (sem o defunto, que ainda tava na casa de moradia). 

Eis que, ao passar por um capiau, o motorista é interpelado na tentativa do referido capiau cavar com isso uma bêra, que é praquelas bandas uma carona. 

Capiau: 

- Oh, moço! Será que o sinhô pode me dar uma bêra até o Lageado?

Motorista: 

- Pode trepá lá em cima, coió. E óia: lá na carroceria tem um caixão de defunto, mas não se preocupe porque ele tá vazio.

Capiau (trepando): 

- Brigado, moço! 

De repente, começa a chuviscar. O tar capiau tinha tomado remédio quente e não podia levar aquele chuvisqueiro na cachola. Abriu a tampa do caixão de defunto vazio e se agasalhou lá dentro dele, de um jeito até bem que gostoso. Fechou o caixão com a tampa, sem medo de nada. 

Acontece que, conforme o caminhão passava na estrada, outros capiaus também pediam bêra, chegando a juntar uns 20 no caminhão. Achavam naturalmente que ali tinha um defunto fresco, pois o motorista ia sempre avisando: 

- Óia. Pode subi, mas num liga praquele lá de riba, não. 

Eis que a chuva dá uma parada boa. Nessa hora, o capiau que ia dentro do tal caixão abre num impacto a tampa e, sentando-se num gesto brusco, pergunta a todos:

- Cumé, moçada? Já parô de chovê? 

Nem é preciso dizer o que aconteceu. Foi capiau pra tudo quanto era lado, com o caminhão em movimento. 

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Adaptado de Contando Causos, de Rolando Boldrin,

(Nova Alexandria, 2001).

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Queimaduras

 Para evitar queimaduras de crianças

► A cozinha é local de risco. Mantenha a criança afastada e a porta sempre fechada. No fogão, deixe as panelas com os cabos virados para dentro e nas bocas de trás, longe do alcance dos pequenos. 

► Evite usar chaleiras elétricas, pois as crianças podem puxar pelo fio. Não tome chimarrão, não faça o fogo do churrasco nem carregue nada quente com a criança no colo. 

► Ao fazer churrasco ao ar-livre, como beira da praia, não deixe brasas expostas ou enterradas na areia. 

► Isole as tomadas com protetor ou coloque móveis na frente. Não deixe velas ao alcance das crianças. Verifique a temperatura da água do banho do bebê e da mamadeira. 

Em caso de acidente

► Coloque a criança ou a parte atingida embaixo da água corrente, com temperatura ambiente, não gelada, e sem esfregar. 

► Não cubra o ferimento. Não passe nada por cima, como pomada ou pasta de dente − atrapalha o atendimento médico, pois tem e ser removido e causa mais dor. 

► Remova a roupa com cuidado. Se não der, não insista porque pode arrancar a pele. Deixe para o médico. 

► Após, leve a criança rápido para atendimento. O HPS de Porto Alegre é para causos mais graves e atende via SUS. O Centro Pediátrico de Queimados, na Santa Casa, é para queimaduras leves e moderadas e atende por convênio e particular. 

(Do jornal Zero Hora, fevereiro de 2023) 

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Saudade

 Lauro Rodrigues

Quando o sol golpeia no horizonte
e se vai reclinar por de trás do monte
como um boi colorado
repontado pelo mango de noite
que tropeia
eu sofro a mágoa de tristeza,
a quietude sem fim da natureza
na saudade cruel que me maneia.
Xomíco! Por que será
que Nosso Senhor nos dá
sem pena, nem julgamento,
a pua do pensamento
pra esporar o coração?
Há nisso tanta maldade
que eu até nem acredito
que fosse o "tal" Jesus Cristo
o inventor da saudade...

Saudade!
Ela vem chegando,
tropeando... tropeando
tudo de bom que vivi.
Depois que a saudade apeia
amarra o pingo e sesteia,
nunca mais a gente ri.
Isto é: sempre há sorriso
mas para isso é preciso
enganar como perdiz
que piando numa moita
noutra se esconde afoita
fingindo que não piou.
A gente não é feliz!
Sorri dos dentes pra fora,
um gargalhar disfarçado,
uma risada amarela,
como potro atropelado
como boiada que estoura
na saída da cancela.

Saudade cheira a alecrim
mas é ruim que nem cupim
que dá em várzea de campo;
fere a gente de tal jeito
que o coração cá no peito
se banha n´água do pranto.
 

Saudade é grama cidreira,
é guecha passarinheira
que a gente nunca domina;
é dor aguda e danada,
dói mais do que uma chifrada
de vaca mansa brasina.

Saudade, coisa esquisita,
que Deus te faça bendita
como a hóstia no altar!...
Pois, de tudo que já tive,
somente a saudade vive,
vive a me acompanhar!
 

Uma flor rara

 

Conta-se que havia uma jovem que tinha tudo, um marido maravilhoso, filhos perfeitos, uma boa mesada do companheiro e uma família unida. 

O problema é que ela não conseguia conciliar tudo. O trabalho doméstico e os afazeres lhe ocupavam quase todo tempo e ela estava sempre em débito em alguma área. Se o trabalho lhe consumia tempo demais, ela tirava dos filhos, se surgiam imprevistos, ela deixava de lado o marido... 

E assim, as pessoas que ela amava eram deixadas para depois até que um dia, seu pai, um homem muito sábio, lhe deu um presente: Uma flor muito rara, da qual só havia um exemplar em todo o mundo. 

O pai lhe entregou o vaso com a flor e lhe disse: 

Filha, esta flor vai lhe ajudar muito mais do que você imagina! Você terá apenas que regá-la e podá-la de vez em quando, e, às vezes, conversar um pouquinho com ela. Se assim fizer, ela enfeitará sua casa e lhe dará em troca esse perfume maravilhoso. 

A jovem ficou muito emocionada, afinal a flor era de uma beleza sem igual. Mas o tempo foi passando, os problemas surgiam, o trabalho consumia todo o seu tempo, e a sua vida, que continuava confusa, não lhe permitia cuidar da flor. 

Ela chegava em casa, e as flores ainda estavam lá, não mostravam sinal de fraqueza ou morte, apenas estavam lá, lindas, perfumadas. Então ela passava direto. 

Até que um dia, sem mais nem menos, a flor morreu. Ela chegou em casa e levou um susto! A planta, antes exuberante, estava completamente morta, suas raízes estavam ressecadas, suas flores murchas e as folhas amareladas. 

A jovem chorou muito, e contou ao pai o que havia acontecido. Seu pai então respondeu: 

− Eu já imaginava que isso aconteceria, e, infelizmente, não posso lhe dar outra flor, porque não existe outra igual a essa. Ela era única, assim como seus filhos, seu marido e sua família. 

Todos são bênçãos que o senhor lhe deu, mas você tem que aprender a regá-los, podá-los e dar atenção a eles, pois assim como a flor, os sentimentos também morrem. 

Você se acostumou a ver a flor sempre lá, sempre viçosa, sempre perfumada, e se esqueceu de cuidar dela. 

Por fim, o pai amoroso e sábio concluiu: 

- Filha! Cuide bem das pessoas que você ama! 

(Autor desconhecido)

Você sabia que...

 

O mais antigo Almanaque traduzido em português data da primeira metade do século XIV, com o título de Almanaque Perdurável, com observações astronômicas, tábuas astrológicas e latitudes de algumas cidades da Europa, da Ásia e norte da África. 

Em 1496 imprimiu-se, em Leiria (Portugal), o Almanach Perpetuum, de Abraão Zacuto, com observações astronômicas usadas pela marinha portuguesa.

O Almanaque de Ghota, anuário genealógico e diplomático, é publicado em francês e em alemão, desde 1763.

A origem do vocábulo Almanaque vem do árabe al-manakh: lugar onde os nômades se reuniam para conversar, rezar e trocar notícias.

A palavra almanaque, segundo o dicionário de língua portuguesa Aurélio, significa “publicação que, além de um calendário completo, contém matéria recreativa, humorística, científica, literária e informativa”.

Cantores do Rádio

 

Alberto Ribeiro, Braguinha e Lamartine Babo − 1936 

A música “Cantores do Rádio” foi composta por Alberto Ribeiro, João de Barro, o Braguinha e Lamartine Babo. 

“Segundo o pesquisador Suetônio Soares Valença, a marcha 'Cantores do Rádio' foi composta dentro de um ônibus, depois de uma noitada em que os três haviam perdido todo o dinheiro apostado no Cassino da Urca. Entusiasmado com a canção concebida no banco de trás do lotação, o trocador teria dispensado-os dos vinténs da passagem.” 

 “Cantores do Rádio” representou a primeira e única vez na qual as irmãs Carmen Miranda e Aurora Miranda apareceram juntas em um filme. Elas interpretaram a canção, enorme sucesso gravado em 1936, no filme “Alô, Alô, Carnaval”. 

Além de estar presente na trilha sonora do filme “Alô, Alô, Carnaval”, esteve também na trilha do filme “Quando o Carnaval Chegar”, interpretada por Chico Buarque, Maria Bethânia e nara Leão (1972). 

Cantores do Rádio 

Nós somos os cantores do rádio,

Levamos a vida a cantar.

De noite embalamos teu sono,

De manhã nós vamos te acordar.

Nós somos os cantores do rádio,

Nossas canções cruzando um espaço azul,

Vão reunindo,

Num grande abraço,

Corações de norte a sul. (bis) 

Canto pelos espaços afora,

Vou semeando cantigas

Dando alegria a quem chora.

Canto, pois sei

Que a minha canção

Faz dissipar a tristeza que mora

No teu coração. (bis) 

Canto para te ver mais contente,

Pois a ventura dos outros

É a alegria da gente. 

Canto e sou feliz só assim

E agora peço que cantem

Um pouquinho para mim.



Não posso fazer essa despesa

 Evan Hill

O filho de um pequeno sitiante que conheci, muitas vezes se acabrunhava por não poder manter o padrão de vida de alguns de seus colegas de famílias abastadas. Certa noite, ele ouviu, em silêncio, o pai de seu amigo predileto, diretor de uma companhia, aconselhando seu pai a que o mandasse passar as ferias de Natal esquiando na Suíça. 

− O menino passará umas férias inesquecíveis − observou o diretor. 

− Acredito − respondeu o pai do rapazinho − mas nós não podemos fazer essa despesa. 

Seguiu-se um longo silêncio entre os dois homens e o jovem que ouvira o diálogo. Até que o diretor estendeu subitamente a mão ao seu interlocutor, dizendo: 

− Nem eu, meu caro amigo. 

Mais tarde, o filho do sitiante me contou que quase chorou de puro orgulho do pai. 

− Naquele momento foi para mim como se ele tivesse três metros de altura − comentou − nunca mais em toda minha vida me constrangi por não dispor de dinheiro. 

Daquela conversa, entendi que a lição que lhe dera o pai o tornara capaz de encarar a si mesmo e aos colegas com honestidade, sem recorrer a falsas aparências... 

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(Trecho extraído de um artigo publicado na revista Seleções do Reader's Digest − maio de 1965)

domingo, 19 de fevereiro de 2023

Uma realidade do tempo atual

 Um minutinho de uma vida inteira 

Carpinejar

Antes mesmo de limitar o horário do celular das crianças, vejo como imprescindível restringir o tempo de uso do aparelho pelos pais. 

O celular virou babá dos adultos, cardápio de pessoas e lugares. Você se julga onipresente na virtualidade e comete uma ausência irreparável diante dos seus entes mais próximos na vida real. 

Os filhos podem fiscalizar o vício, já que os pais extrapolam o senso do aceitável. 

Não são as crianças que ficam o tempo todo no celular, elas apenas seguem os exemplos paterno e materno. 

Recebem o celular de presente para não incomodar seus pais entretidos com os seus celulares. É uma distração inventada pelos responsáveis sempre ocupados. 

Os pais tomam café com o celular, almoçam com ele, jantam com ele, interrompem passeios para atender a chamadas, numa disponibilidade integral aos estímulos externos. 

E jamais relatam o que de tão importante estão fazendo, porque nem eles sabem. 

Você abre as redes sociais sem um objetivo definido, para descobrir o que você procura enquanto desliza os dedos. De tela a tela, acaba em lugar nenhum, a ponto de não entender como parou no perfil daquela pessoa. 

Vê a postagem de um amigo, entra na página da namorada dele, daí passa para a página do amigo da namorada,  daí segue para a página da mãe do amigo da namorada, daí migra para a página da amiga da mãe do amigo da namorada. 

Trata-se de uma quadrilha digital jamais imaginada por Carlos Drummond de Andrade. 

É mentira que exista o hábito de navegar na internet para estar bem informado. Depois de horas zapeando, você não se lembra de coisa alguma. A memória se desintegra automaticamente. Como lapsos de uma bebedeira feita de imagens e links. 

A pressa é um embuste. Se você responder a alguém no minuto em que recebeu a mensagem ou após duas horas, não fará diferença. O destinatário vai ler quando quiser. Experimenta-se uma noção falsa de importância pessoal e profissional pela simultaneidade dos contatos. 

Não há mais rotina off-line: acariciar as costas do outro, olhar nos olhos, abraçar na chegada ou despedida de casa, fazer algum gracejo aproveitando o gancho de uma conversa, dar uma caminhada com os ouvidos livres e o rosto voltado para o céu. 

A exigência de música no fone para qualquer percurso roubou a nossa escuta. A inclinação em torno da luz azulada brilhante na mão roubou a nossa visão e a nossa postura. 

Surgirá uma mensagem mais urgente do que a família. Surgirá uma ligação mais inadiável do que o seu lar. Porque sua prioridade é o celular, mais ninguém. Como se todos os seus afetos morassem dentro dele, não fora dele. 

Só um minutinho hoje pode durar uma vida inteira. 

Qualquer um pode acessar o tempo que dedica ao telefone por dia, no símbolo da ampulheta de Ajustes (iOS) ou no símbolo do coração de Configurações (Android). 

Não estranhe que a estatística resulte em 18 horas diárias. 

Representa uma intoxicação. O único momento em que não vem empregando o aparelho é na hora do sono: as seis solitárias horas de sono. 

Se o filho quiser falar com o pai e com a mãe, terá que ser apenas quando eles estiverem dormindo, e ainda precisará torcer para que sejam sonâmbulos. 

(Do jornal Zero Hora, fevereiro de 2023) 

Lampião de gás

 

Composição de Zica Bérgami 

Canta Inezita Barroso 

Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
 

Da sua luzinha verde e azulada,
Que iluminava a minha janela;
Do almofadinha lá na calçada,
Palheta branca, calça apertada.
 

Do bilboquê, do diabolô,
Me dá foguinho, vai no vizinho;
De pular corda, brincar de roda,
De Benjamim, Jagunço e Chiquinho.
 

Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
 

Do bonde aberto, do carvoeiro,
Do vassoureiro com seu pregão;
Da vovozinha, muito branquinha,
Fazendo roscas, sequilhos e pão.
 

Da garoinha, fria fininha,
Escorregando pela vidraça;
Do sabugueiro, grande e cheiroso,
Lá no quintal da Rua da Graça.
 

Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
Lampião de gás, lampião de gás,
Quanta saudade você me traz.
 

Minha São Paulo, calma e serena,
Que era pequena, mas grande demais.
Agora cresceu, mas tudo morreu,
Lampião de gás, que saudade me traz.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

As Melhores Leis de Murphy

01. Se existe a chance de alguma coisa dar errado, com certeza dará. 

02. É impossível fazer qualquer coisa a prova de erros, os idiotas são muito inventivos. 

03. Quando vai tudo bem, alguma coisa vai dar errado. 

04. Não acredite em milagres, baseie-se neles. 

05. Nunca discuta com um idiota – Podem não notar a diferença. 

06. Todo o fio cortado no tamanho indicado, será curto demais. 

07. A outra fila sempre anda mais rápido. 

08. Não force, arranje um martelo maior. 

09. O homem que sorri quando as coisas vão mal, lembrou-se de alguém em quem colocar a culpa. 

10. Quando tudo mais falhar, leia as instruções. 

11. Em caso de dúvida, seja convincente. 

12. Sorria, amanhã será pior. 

13. Se você está se sentindo bem, não se preocupe, isso passa. 

14. O pão sempre cai com o lado da manteiga para baixo. 

15. A principal causa dos problemas são as soluções. 

16. A perna mais importante de uma mesa de três pernas é aquela que está faltando. 

17. Quando maior você é, mais fortes eles batem. 

18. Para cada ação existe uma crítica igual e no sentido contrário. 

19. É mais fácil conseguir o perdão que a permissão. 

20. Se o sapato couber, ele é feio. 

21. Tudo que custa mais, demora mais tempo. 

22. Todas as garantias acabam no ato do pagamento da fatura. 

23. Sexo leva o menor tempo e gera a maior confusão.  

24. A maioria das afirmações gerais são falsas, incluindo essa.  

25. O único modo de descobrir os limites do possível é ir além deles até o impossível. 

26. Em toda organização sempre há alguém que sabe o que se passa. Esse alguém deve ser demitido.  

27. A oportunidade sempre surge no momento menos oportuno.  

28.  Depois das coisas terem ido de mal a pior, o ciclo se repetirá.  

29. Coisas importantes que devem acontecer não acontecem, especialmente quando os outros estão olhando.  

30. A única coisa imperfeita na natureza é a raça humana.  

31. As palavras de um homem bêbado, são os pensamentos de um homem sóbrio.  

32. Amigos vêm e vão, mas inimigos se acumulam.  

33. O problema de resistir à tentação é que ela pode não aparecer de novo.  

34. Quando você estiver certo, seja lógico. Quando você estiver errado, seja confuso.  

35. O número de pessoas observando-o é diretamente proporcional à estupidez da sua ação.  

36. Qualquer coisa que começa bem termina mal. Algo que começa mal termina pior.  

37. Um homem com um relógio sabe a hora; um homem com dois relógios nunca tem certeza.  

38. Se você não pode convencê-los, confunda-os.  

39. Nada é impossível para o homem que não tem que fazer pessoalmente.  

40. É um erro permitir que qualquer objeto perceba que você está com pressa.