terça-feira, 6 de junho de 2023

SE

 Rudyard Kipling

(1865-1936), 

tradução de Guilherme de Almeida

 (1890 – 1969)


Se és capaz de manter a tua calma quando

Todo o mundo ao redor já a perdeu e te culpa;

De crer em ti quando estão todos duvidando,

E para esses no entanto achar uma desculpa;

 

Se és capaz de esperar sem te desesperares,

Ou, enganado, não mentir ao mentiroso,

Ou, sendo odiado, sempre ao ódio te esquivares,

E não parecer bom demais, nem pretensioso;

 

Se és capaz de pensar – sem que a isso só te atires;

De sonhar – sem fazer dos sonhos os teus senhores;

Se encontrando a desgraça e o triunfo conseguires

Tratar da mesma forma a esses dois impostores;

 

Se és capaz de sofrer a dor de ver mudadas

Em armadilhas as verdades que disseste,

E as coisas por que deste a vida, estraçalhadas,

E refazê-las com o bem pouco que te reste;

 

Se és capaz de arriscar numa única parada

Tudo quanto ganhaste em toda a tua vida,

E perder e, ao perder, sem nunca dizer nada,

Resignado, tornar ao ponto de partida;

 

De forçar coração, nervos, músculos, tudo

A dar seja o que for que neles ainda existe,

E a persistir assim quando, exaustos, contudo

Resta a vontade em ti que ainda ordena: “Persiste!”;

 

Se és capaz de, entre a plebe, não te corromperes

E, entre reis, não perder a naturalidade,

E de amigos, quer bons, quer maus, te defenderes,

Se a todos podes ser de alguma utilidade,

 

E se és capaz de dar, segundo por segundo,

Ao minuto fatal todo o valor e brilho,

Tua é a terra com tudo o que existe no mundo

E o que é mais – tu serás um homem, ó meu filho!

 

segunda-feira, 5 de junho de 2023

Ponto e vírgula

 Grant Mariano

Encontraram-se num parágrafo.

Ele: um ser ínfimo, quase nada, um ponto;

ela: toda cheia de curvas, uma interrogação.

Ele lançou-lhe um olhar reticente

que se fixou nos dois pontos dos olhos dela.

Percorrendo seu corpo, deteve-se no etc.

Simétrica! Sem dúvida!

Para parnasiano nenhum botar defeito!

Subordinado àquela figura metafórica, sentou-se.

Ai!

Da voz grave saiu-lhe a interjeição.

Mas que desgraça a minha...

Não é que havia sentado num acento agudo?!

Por instantes, sentiu vontade de sair fora da linha.

Como?

Se um travessão os separava.

Circunflexo, apoiou-se na margem a sonhar.

Que bom seria se seus desejos fossem sinônimos

para poderem unir-se numa conjunção final.

Ele a cobriria de artigos indefinidos,

e, quem sabe até,

juntos poderiam iniciar uma oração.

Impossível!

Aquilo das maiúsculas era privilégio.

Mas, o verbo, ao menos,

haveria de permitir-lhe acompanhá-la

por um longo período.

Tão perto estaria que um adjunto tornar-se-ia;

quem sabe, um complemento.

Súbito, viu aproximar-se um sujeito,

que até então oculto estivera.

Possessivo de ciúmes, a princípio (numa exclamação)

classificou-o como anômalo.

Mas, finalmente, por sujeito indeterminado decidiu-se.

E ele então se sentiu reduzido a um diminutivo sintético.

Cruzaram asteriscos pela mente conturbada.

Só lhe restava jogar-se e sumir nas entrelinhas.

No entanto, dele se aproximou uma figura magra, curvada,

uma vírgula, em tudo colocando um ponto final.

Pondo seus pensamentos em ordem alfabética,

voltou à realidade de uma maneira coordenada.

O sonho foi desfeito, tornando-se ele, um agente da passiva.

Como pudera casar-se com aquela proparoxítona real,

sem predicado algum, sequer uma partícula de realce possuía?

Tornara-se objeto indireto das brincadeiras

de estilo irônico ou mesmo satírico.

Agora não restam alternativas ou explicativas,

concluiu numa análise sintática.

Esquecer era preciso,

e fazer daquilo

um ponto final.

Os sapos

 

Arriscar, às vezes, é a melhor coisa a se fazer.

Existem três sapos na beira de um lago, e um deles decide pular da beira para a água. Quantos sapos restam na beira do lago? 

A resposta certa é: 

Restam três sapos. 

Porque o sapo apenas decidiu pular na água. 

Ele não fez a ação de pular. 

Nós não somos como sapo muitas vezes? Que decide fazer isso, fazer aquilo, mas, ao final, acabamos não fazendo nada? Na vida, temos que tomar muitas decisões. Algumas fáceis; algumas difíceis. 

A maior parte dos erros que cometemos não se deve às decisões erradas, mas sim, às indecisões. Temos que viver com as consequências das nossas decisões. E isto é arriscar. Tudo é arriscar. Ser feliz é a consequência de muitos riscos.

Por que passei de ano!

 

Þ Passei de ano porque estudei o necessário e, muitas vezes, até mais do que o necessário. 

Þ Passei porque tive projetos, sonhos e a certeza de concretizá-los. 

Þ Procurei sempre, em sala de aula, dirimir as minhas dúvidas, fazendo perguntas necessárias e concentrando-me ao máximo no que os professores explicavam. 

Þ Fazia apontamentos sempre que era solicitado e também quando não era. 

Þ Procurava estar presente em todas as aulas, só faltando em caso de urgência. 

Þ Chegava sempre no horário e, quando soava o sinal, dirigia-me prontamente para a sala-de-aula. 

Þ Zelei sempre pelo patrimônio da escola, advertindo àqueles que praticavam, em minha presença, atos de vandalismo contra o colégio em que estudo e que tanto amo. 

Þ Tratei, sempre, todos os professores com carinho e respeito, bem como os funcionários e, principalmente, os meus colegas, pois eles serão os amigos que terei para toda a vida. 

Þ Passei porque venci a preguiça, o cansaço, o mau tempo e até as aulas chatas. 

Þ Passei porque estudei por mim, por meus pais, por minha pátria e porque tinha um ideal na vida: vencer! 

Þ Passei porque tenho consciência da importância da educação num país como o nosso, onde há muitas barreiras a serem vencidas e muitas etapas para torná-lo uma grande nação. 

Þ Passei porque, sempre, antes da diversão, fazia as minhas tarefas. 

Þ Passei porque em cada prova que fazia, os conteúdos não me eram indiferentes, pois já os havia estudado anteriormente. 

Þ Por fim, passei porque tenho garra, ambição, vontade de vencer e de ser alguém na vida. 

(NSM)

Valor do tempo

A cada manhã nos são creditados 86.400 segundos, que não podem ser acumulados. 

Para perceber o valor de um ano, pergunte ao estudante que o repetiu. 

Para aferir o valor de um mês, pergunte a uma mãe que teve o bebê prematuro. 

O significado de uma semana: pergunte ao editor de um jornal hebdomadário. 

O valor de uma hora: pergunte aos amantes que estão esperando o encontro. 

Um minuto: pergunte a quem perdeu o trem. 

Um segundo: pergunte a quem conseguiu evitar um acidente. 

Um milésimo de segundo: fale com quem conquistou uma medalha em uma Olimpíada. 

Valorize, portanto, cada momento que você tem. Lembre-se de que o tempo não espera ninguém. O ontem é história. O amanhã é um mistério; o hoje, uma dádiva, por isso é chamado presente.

domingo, 4 de junho de 2023

Um conto de metalinguagem

 (E põe metalinguagem nisso...)

Era a terceira vez que aquele Substantivo e aquele Artigo se encontravam no elevador. Um Substantivo masculino, com um aspecto plural e com alguns anos bem vividos pelas preposições da vida. E o Artigo era bem definido, feminino, singular: era novinha, coisa mais linda de diminutivo, mas com um maravilhoso predicado nominal. Era ingênua, monossilábica, um pouco átona, ao contrário dele: um sujeito oculto, com todos os vícios de linguagem, fanático por leituras e filmes ortográficos. 

O Substantivo gostou dessa situação: os dois sozinhos num lugar sem ninguém para ver e ouvir. E sem perder essa oportunidade, começou a se insinuar, a perguntar, a conversar. O Artigo Feminino deixou as reticências de lado e permitiu esse pequeno índice. De repente, o elevador para só com os dois lá dentro: ótimo, pensou o Substantivo, mais um bom motivo para provocar alguns sinônimos. Pouco tempo depois, já estavam bem entre parênteses, quando o elevador recomeçou a se movimentar: só que ao invés de descer, subiu e parou justamente no andar do Substantivo. Ele usou de toda a sua flexão verbal e entrou com ela em seu aposto. 

Ligou o fonema, e ficaram alguns instantes em silêncio, ouvindo uma fonética clássica, bem suave e gostosa. Prepararam uma sintaxe dupla para ele, e um hiato com gelo para ela. Ficaram conversando, em gerúndio, sentados num vocativo, entre vírgulas, quando ele começou, outra vez, redundantemente, a se insinuar. Ela foi deixando, ele foi usando seu forte adjunto adverbial, e rapidamente chegaram a um imperativo. Todos os vocábulos diziam que iriam terminar num transitivo direto. Começaram a se aproximar; ela tremendo de vocábulos, e, ele, um pronome pessoal, sentido que seu ditongo ia ficando que vez mais crescente, se abraçaram, numa pontuação tão minúscula, que nem um período simples passaria entre os dois. Estar-se-iam até agora nessa mesóclise, se ela não confessasse que ainda era vírgula: ele não perdeu o ritmo e sugeriu um longo ditongo oral, e, quem sabe, uma ou outra soletrada em seu apóstrofo. 

É claro que ela se deixou levar por essas palavras, estava totalmente oxítona às vontades dele, e foram para um comum de dois gêneros. Ela totalmente voz passiva. Entre beijos, carícias e outros substantivos, ele foi se avançando cada vez mais: ficaram uns minutos nessa próclise, e ele, com todo seu predicativo do objeto, ia tomando conta dela por um longo período composto. Estavam nessa posição de primeiras e segundas pessoas do singular; ela era um perfeito agente da passiva, e ele todo paroxítono, sentindo o pronome do seu grande travessão forçando aquele hífen singular. Nisso a porta abriu repentinamente. Era o Verbo Auxiliar do edifício reclamando das altas interjeições que se ouviam por todo o prédio, dando conjunções e adjetivos fazendo com que os dois se encolhessem cheios de preposições, locuções e exclamativas. Mas, ao ver aquele corpo jovem, numa acentuação tônica, ou melhor, subtônica, o Verbo Auxiliar começou a ficar anômalo, diminuindo seus advérbios e declarou o seu particípio na história. Os dois se olharam e viram que isso era melhor do que uma metáfora por todo o edifício, pois além do Verbo Auxiliar, havia, acima dele, o Período Absoluto que mandava em toda a oração. O Verbo Auxiliar se entusiasmou e mostrou o seu adjunto adnominal, apesar de ser um termo acessório, dava para quebrar o verso. 

Oh que loucura! Minha gente vocativa, aquilo não era nenhum demonstrativo do seu caráter, mas um superlativo absoluto. Foi se aproximando dos dois com aquela maiúscula, com aquele predicativo do sujeito apontado para seus objetos. Foi chegando cada vez mais perto, segurando numa mão o travessão e, na outra, os dois pontos, propondo claramente uma mesóclise-a-trois, que galicismo do mau caráter! 

Só que as condições eram estas, enquanto um abusava do ditongo oral, o outro penetrava no gerúndio, culminado com um complemento verbal no artigo feminino. O Substantivo, vendo esta oração intercalada, reagiu, pois poderia se transformar num artigo indefinido com um til na cabeça, ou mesmo a cabeça entre duas aspas. Achando que o período estava por demais composto e, com mais uma oração coordenada sindética aditiva, resolveu pôr um ponto final na história. Agarrou o Verbo Auxiliar pelos dois pontos e, com ao auxílio de um conetivo, jogou-o pela janela e voltou ao seu trema, cada vez mais fiel à Língua Portuguesa. O Artigo feminino, que estava na voz passiva, pronta para receber a conjunção coordenativa conclusiva, relaxou. 

Os dois, unidos num aposto, chegaram, finalmente, apesar deste adjunto adverbial deslocado, juntos e exaustos ao ponto final do texto. 

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(Autor desconhecido)

sábado, 3 de junho de 2023

Vingança pelo telefone

 

Toca o telefone...

- Alô.

- Alô, poderia falar com o responsável pela linha?

- Pois não, pode ser comigo mesmo.

- Quem fala, por favor?

- Edson.

- Senhor Edson, aqui é da Telefônica (SP), estamos ligando para oferecer a promoção Telefônica linha adicional, onde o Senhor tem direito...

- Desculpe interromper, mas quem está falando?

- Aqui é Rosicleide, da Telefônica, e estamos ligando...

- Rosicleide, me desculpe, mas para nossa segurança, gostaria de conferir alguns dados antes de continuar a conversa, pode ser?

- ... bem, pode ser.

- De que telefone você fala? O meu bina não identificou.

- 103

- Você trabalha em que área, na Telefônica?

- Telemarketing Pró-Ativo.

- Você tem número de matrícula na Telefônica?

- Senhor, desculpe, mas não creio que essa informação seja necessária.

- Então terei que desligar, pois não posso ter segurança que falo com uma funcionária da Telefônica.

- Mas posso garantir...

- Além do mais, sempre sou obrigado a fornecer meus dados a uma legião de atendentes sempre que tento falar com a Telefônica.

- Ok... Minha matrícula é 34591212

- Só um momento enquanto verifico.

 (Dois minutos)

- Só mais um momento.

 (Cinco minutos)

- Senhor?

- Só mais um momento, por favor, nossos sistemas estão lentos hoje.

- Mas senhor...

- Pronto, Rosicleide, obrigado por haver aguardado. Qual o assunto?

- Aqui é da Telefônica, estamos ligando para oferecer a promoção linha adicional, onde o Senhor tem direito a uma linha adicional. O senhor está interessado, Senhor Edson?

- Rosicleide, vou ter que transferir você para a minha esposa, porque é ela quem decide sobre alteração e aquisição de planos de telefones. Por favor, não desligue, pois essa ligação é muito importante para mim. (coloco o telefone em frente ao aparelho de som, deixo a música Festa no Apê do Latino tocando no Repeat. Eu sabia que um dia essa droga iria servir para alguma coisa!), depois de tocar a porra toda da musica, minha mulher atende:

- Obrigado por ter aguardado.... pode me dizer seu telefone, pois meu bina não identificou o...

- 103

- Com quem estou falando, por favor?

- Rosicleide

- Rosicleide de quê?

Rosicleide Silva Judite! (já demonstrando certa irritação na voz)

- Qual sua identificação na empresa.

- 34591212!!! (mais irritada ainda)

- Obrigada pelas suas informações, em que posso ajudá-la?

 − Aqui é Telefônica, estamos ligando para oferecer a promoção de uma linha adicional, onde a Senhora tem direito a uma linha adicional. A senhora está interessada?

- Vou abrir um chamado e em alguns dias entraremos em contato para dar um parecer, pode anotar o protocolo por favor.....alô, alô!

- TUTUTUTUTU...

- Desligou... Mas que moça impaciente! 

(Autor desconhecido)