sábado, 29 de abril de 2023

Esta fundiu a cuca do garçom

 

O freguês entrou e pediu um chop*. 

Ele trouxe o chop e o freguês pediu para trocar o chop por uma laranjada. 

Ele trocou e o freguês bebeu e saiu sem pagar. 

− Ei! − disse o garçom. − O senhor não pagou a laranjada! 

− Claro. Troquei pelo chop. 

− É... mas o senhor não pagou o chop. 

− Claro. Eu não bebi!

********** 

(Ziraldo. Novas anedotinhas do Bichinho da Maçã. 12. Editora São Paulo: Melhoramentos, 1988. pág. 20-1.) 

 

* A grafia correta é chope. A palavra chop (ou chopp) – embora amplamente utilizada nos cardápios, campanhas publicitárias e fazer parte do nome de cervejas comerciais de grande vendagem – não é registrada no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras. 

O substantivo masculino chope indica um copo ou caneca de cerveja pressurizada de barril. Tem sua origem na palavra em alemão schoppen.

As rajadas de vento

 Malba Tahan

Certa vez, ao retornar da guerra, o Imperador Adriano convocou todos os nobres para fazer um anúncio: 

– Devido ao grande poder que conquistei pelas lutas que travei pelo mundo, declaro que, de agora em diante, considero-me um deus! 

Os nobres, sem entender direito o que se passava, começaram a bater palmas ao imperador, porém, um dos nobres se aproximou do soberano e falou: 

– Já que o senhor é um deus, rogo pelo seu auxílio em minha aflição! 

– O que aconteceu? 

– Meus navios estão parados há vários dias em uma calmaria a três milhas da costa. Já perdi muito dinheiro com o atraso desses navios. 

– Claro que irei te ajudar, enviarei uma frota com bons remadores para rebocar seus navios. 

– Não precisa tudo isso, esse problema é muito mais fácil de resolver. Somente mande algumas rajadas de vento e meus navios seguirão. 

– Mas, como mandarei vento? – falou o imperador. 

– Se não pode enviar de vento aos meus navios, como pode dizer que é um deus? Não foi o próprio Deus que criou tudo, inclusive o vento! 

O imperador viu o tamanho do absurdo que havia falado e ficou constrangido perante sua corte. 

O “Teu e o “Meu”

 

Vamos encontrar entre os homens que vivem pelo mundo quatro tipos bem definidos. Apontemos, em primeiro lugar, o tipo vulgar. Este diz a cada instante: 

− O que é meu é meu; o que é teu é teu. 

Há ainda o excêntrico − que se compraz com as confusões − Dele ouvimos esta afirmação sem cabimento: 

− O que é meu é teu; o que é teu é meu. 

Ao lado do excêntrico pode viver o santo. E santo é aquele que não se prende aos bens materiais. O seu lema é de renúncia: 

− O que é meu teu; o que é teu é teu. 

Não nos esqueçamos, porém, do quarto tipo; é o perverso. Proclama o perverso com o coração a transbordar de egoísmo e avidez: 

− O que é meu é meu; o que é teu é meu! 

(Misha) 

(Do livro “Lendas do Povo de Deus”, de Malba Tahan)

sexta-feira, 28 de abril de 2023

Conversa de botequim

 Noel Rosa e Vadico

Seu garçom, faça o favor de me trazer depressa

uma boa média que não seja requentada,

um pão bem quente com manteiga à beça,

um guardanapo e um copo d’água bem gelada.

Feche a porta da direita com muito cuidado,

que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol.

Vá perguntar ao seu freguês do lado

qual foi o resultado do futebol...

Se você ficar limpando a mesa,

não me levanto nem pago a despesa.

Vá pedir ao seu patrão

uma caneta, um tinteiro, um envelope e um cartão.

Não se esqueça de me dar palito

e um cigarro pra espantar mosquito.

Vá dizer ao charuteiro

que me empreste uma revista,

um cinzeiro e um isqueiro...

Telefone ao menos uma vez

para 34-4333

e ordene ao seu Osório

que me mande um guarda-chuva

aqui pro nosso escritório.

Seu garçom, me empreste algum dinheiro,

que eu deixei o meu com o bicheiro.

Vá dizer ao seu gerente

que pendure esta despesa

no cabide ali em frente... 

Não existe em nossa música popular crônica mais espirituosa sobre uma cena do cotidiano que a realizada por Noel Rosa em “Conversa de botequim”. Localizada em um café, ambiente que o autor conhecia como ninguém, a crônica tem como personagem principal um freguês desabusado que, ao preço de uma simples média com pão e manteiga, acha-se no direito de agir como se estivesse em sua casa. Assim, em ordens sucessivas, ele exige do garçom atendimento rápido e eficiente. 

Completa esta obra-prima uma melodia sincopada de Vadico (Oswaldo Gogliano), que se casa com a letra de forma primorosa, como se as duas tivessem sido feitas ao mesmo tempo, por uma mesma pessoa. 

(Do livro “A Canção no Tempo” Volume 1: 1901-1957, de Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello) 

Seu Nirso

 

Um gerente de vendas recebeu o seguinte FAX de um dos seus novos vendedores:

“Seo Gomis, o criente de Belzonte pidiu mais cuatrucentas pessa. Faz favor tomá as providenssa. Abrasso, Nirso.”

Aproximadamente uma hora depois, recebeu outro FAX:

“Seo Gomis, os relatório di venda vai xegá atrazado proque tô fexando umas venda. Temo que mandá treis mil pessa. Amanhã tá xegando. Abrasso, Nirso.”

No dia seguinte, outro:

“Seo Gomis, num xeguei pucausa de que vendi mais deis mil em Beraba. Tô indo pra Brazilha. Abrasso, Nirso.

No outro:

“Seo Gomis, Brazilha fexô 20 mil. Vô pra Frolinopolis e de lá pra Sum Paulo no vinhão das cete hora. Abrasso, Nirso.” 

Assim foi o mês inteiro.  O gerente, muito preocupado com a imagem da empresa, levou ao presidente as mensagens que recebeu do vendedor.

O presidente escutou atentamente o gerente e disse:

 - Deixa comigo, que eu tomarei as providências necessárias.

E tomou...

Redigiu, de próprio punho, um aviso, e o afixou no mural da empresa, juntamente com as mensagens de fax do vendedor: 

“A parti de oje, nois tudo vamo fazê feito o Nirso, si priocupá menos em iscrevê serto, mode vendê maiz. Acinado, o Prizidenti.” 

(Autor desconhecido)

quarta-feira, 26 de abril de 2023

Recurso de um caipira paulista

 (Episódio da revolução de 1932)*

 Cornélio Pires

Perto de Ribeirópolis, um caboclo estava fazendo jacás no terreiro da choça, quando de supetão chegaram-se a ele quatro soldados gaúchos. O que se intitulava comandante perguntou: 

− É você o dono disto aqui?  

− Isso aqui é nosso, seu sordado!... 

− Nós estamos precisando daquele cavalo que está ali, ouviu? 

− Si sior! A quistão que o cavalo é dum tar Generá João Francisco*, que me pidiu pra trata dele oito dias. 

− E aquela vaca? 

− Aquela vaca?... Aquela tá cum peste de canudo!! Ota peste loca pá pega in gente, seu sordado!... Se mecê quisé, é só corrê o laço na tar! 

− E aquele porco? 

− I, seu sordado, porco sadio tá li!... Só tem um sinão; é loco pá comê defunto! É seu o bicho, pode pegá. 

− Onde estão as mulheres desta casa? 

− Tá tudo ocupada, si sior! 

− E aquela bonitona que apareceu lá na porta? 

− Aquela?... Chi!... aquela coitada véve muito aperreada; não é duença mortá mái a coitada não tem servidão pra mardita coisa! 

− O que é que ela sofre? 

− Ela tá c'oa mãe do corpo fora do lugá; decerto é perduzido por úa sarnage muito grande quela tem! 

− Só isso? 

− De doença é. Ela não tem sorte, seu sordado!... Fiz casá essa ermã e o marido tava quermano úa roça e o fogo cercô ele de tudo lado; o remédio que teve foi se apinxá no Reberão e resurtô disso úa trapêra danada!... Fico ca massa do sangue dermanchada! 

− Está bem: e esse cestos que você está fazendo, para que são eles? 

− Ói nhô sordado. Tenho úa quizila danada côs Polista mór deles num respeitá famia dos outros. Vancêis sim. Num mexe cum muié de ningué, e são bão nas cundição; por via disso, tô fazeno cesto pra judá carregá os caraminguá dos Gaúcho, mode nós acabá côs Polistas dúa veis. 

− Muito obrigado, camarada, e até a volta! 

− Inté corqué dia pra mecêis, se Deus quisé. 

Quando os gaúchos já estavam longe, ele ainda disse: 

− Lovado seja Deus nosso Sinhô Zuscristo que desta escapei! Agarra o mato, meu povo, enquanto o Sór tá fora! 

********** 

(Do livro “Antologia de Humorismo e Sátira”,

de R. Magalhães Junior) 

* A chamada Revolução Constitucionalista de 1932 foi um confronto armado entre forças majoritariamente paulistas contra os gaúchos do governo de Getúlio Vargas, que havia ascendido por meio da Revolução de 1930, marco fundador do Brasil moderno. Os gaúchos invadiram o interior de São Paulo, onde houve forte reação de militares e do povo paulista. 

* General João Francisco, gaúcho da fronteira um gênio da improvisação.

Cravo Branco

 Paulo Vanzolini

Saiu de casa de terno tropical,
Camisa creme, lenço e gravata igual.
Jantou e saiu satisfeito,
Pra antes da meia-noite,
Morrer com um tiro no peito. (bis)
 

Ela lhe deu o cravo;
O outro se ofendeu.
Ele olhou no revólver,
Dava tempo e não correu.
 

Dobrou os joelhos,

Desabou no chão,
Os olhos redondos,
E o cravo branco na mão.
 

Ai, o pobre, caído no chão,
De bruços no sangue,
Com o cravo branco na mão,

De bruços no sangue,
Com o cravo branco na mão.



terça-feira, 25 de abril de 2023

A carta de um caipira

 

O caipira recebeu uma carta, mas ele era analfabeto. Ele, então, foi para a padaria e pediu para o padeiro ler. O padeiro leu em voz baixa, sem que o caipira escutasse, e o expulsou de lá.

Então, o caipira levou a carta para o farmacêutico ler e este fez a mesma coisa: leu e expulsou, também, o caipira do seu estabelecimento. 

Este foi a uma delegacia, e o delegado fez a mesma coisa, só que, achado uma grande falta de respeito, prendeu o caipira.

No julgamento, o caipira disse para o juiz:

− Seu juiz, antes docê fazê quarqué coisa cum eu, lê essa carta pra eu?

O juiz fez a mesma coisa e o isolou em uma ilha deserta, sem nenhum conforto. 

Na ilha, havia um velhinho sábio. 

O caipira lhe disse:

− Seu véio, ocê pode lê essa carta pra eu, é qui eu sô anarfabeto?

− Eu vou fazer diferente. Vou ensiná-lo a ler e a escrever e você mesmo vai ler essa carta.

Passaram-se três meses, e o caipira aprendeu a ler e a escrever. Ele se sentou, calmamente, em baixo de um coqueiro para ler, e quando foi começar a ler, bateu um vento e a carta voou e afundou no mar...

segunda-feira, 24 de abril de 2023

O Senhor veneranda e o ferro de passar

 Carlo Manzoni

O Senhor Veneranda fez entrar o eletricista que ele chamara e mostrou-lhe o ferro de passar. 

− Bom, disse o eletricista, olhando para o aparelho de todos os lados. O que é que ele tem? 

− É elétrico, disse o Senhor Veneranda. 

− Sim, estou vendo. Mas que tem ele? Está quebrado? 

− Não, disse o Senhor Veneranda. Quando ligo à tomada, funciona perfeitamente. Quando não ligo, não funciona. Contudo, eu nunca ligo. 

− E por que não o liga? − perguntou o eletricista, surpreso. 

− Bom, se o senhor insistir para que o ligue, ligá-lo-ei. Mas então, que farei com ele? 

− Como o que fará com ele? Passar, exclamou o eletricista. O ferro de passar é feito para passar. 

− Isso eu sei, disse o Senhor Veneranda. Mas vou passar o quê? O senhor trouxe algo para passar? 

− Eu, não, murmurou o eletricista que não mais sabia o que dizer. 

− Então, por que o ligaria, já que nem eu nem o senhor temos algo para passar? 

− Para ver se está quebrado. 

− Já lhe afirmei que ele não está quebrado. 

− Então, não o ligue, gritou o eletricista que começava a perder a paciência. 

− Claro que não ligarei, berrou o Senhor Veneranda. Há meia hora que repito que não quero ligá-lo e vem agora o senhor me dizer que não o ligue. O senhor é bem esquisito. 

− Diga-me, pois, por favor, disse o eletricista, procurando recuperar a calma, por que me chamou? 

− O senhor é eletricista, não é? 

− Sim, senhor, sou. 

− E este ferro de passar é elétrico, não é? 

− É, sim, senhor. 

− Então, se o ferro é elétrico, quem deveria eu ter chamado na sua opinião, um carpinteiro? 

− Eu, eu... gaguejou o eletricista, que não mais conseguia dizer uma palavra. 

− Escute-me, disse o Senhor Veneranda, vejo que hoje as coisas não vão bem. Melhor deixar para nos entendermos outro dia. Tanto eu quanto o ferro podemos esperar 

E acompanhou o eletricista até a porta, pedindo-lhe que voltasse no dia seguinte. 

********** 

(Do livro “Antologia Internacional do Riso”, Mansour Challita)

domingo, 23 de abril de 2023

Pequena prosa de rio

 Paulo Mendes

Campereada

Vai meu rio, desce em tua correnteza de certezas, sempre em frente, sempre mais, vai meu rio de canto e desencantos, lamento e tristezas. Vai, beija a barranca e se larga no remanso, descendo, fugindo, se esgueirando por entre as matarias que te ladeiam, em busca de quê? O que procuras, meu rio, eu que sempre te vi tão igual e diferente, o mesmo e cada dia outro. Que ânsias tu carregas nessas águas, que mistérios guardas em tuas entranhas? Como tu suportas viver assim, caminhando, rodando, correndo, nesse remanso infinito, quieto, calado, tão mudo? Junto a ti me sinto forte, mas na verdade sou muito frágil e medroso. Quer saber, na verdade tenho inveja de tua imensidão, de tua fortaleza líquida, de tua força bem maior que a minha, que sou um nada, só um campeiro, só um luzeiro na noite longa e profunda do esquecimento. 

Aqui fico, à margem, junto às pedras e aos juncais, como aqueles seres inertes que são feitos de barro e vertente, paralisados, mirando o infinito do céu e da vertigem. Minha alma, onde estará ela, nesta hora que venho aqui, de novo, rezar e te contar histórias tuas e tantas, contadas e recontadas por todos? Eu me resigno, aceito, reconheço minha insignificância, minhas saudades e desígnios. Poderia ter ido embora de mala e cuia, levando os mijados, e a foto da mãezinha, a faquinha de prata, as rédeas trançadas e o par de chilenas do pai. Mas fiquei apegado aqui para sempre, como esses umbus das planuras, solito, vago e parado, inerte, dando sombra pequena para uns paisanos de olhar de vidro.  

Hoje, sou eu que te conto meus desenganos, tens um tempo para me ouvir? Estou velho, rio caudaloso, imponente e tão forte. Os anos passam, tu sabes tão bem, vão minando a gente. Creio que tu também te sentes assim, um pouco desgastado com o que te fazem, todos os dias. E essas lavouras ao teu lado, te sugando, te exaurindo? Mas tu, hein, não te mixas, segues tão altaneiro, resiste, nem dá sinais de tanto cansaço. Tuas margens estão tão devastadas, parecem os meus cabelos, tão ralos, com tantas clareiras, e tuas árvores cortadas. Escuta, são os bugios. Parecem estar querendo me dizer algo, mas não entendo. Tossem, se afogam, se lamentam. E os capinchos, não os vejo mais, meu rio. Diga-me, tu se sentes bem com tantos homens te atropelando, te maltratando? Ah, rio tão largo e comprido, que ao invés de separar sempre uniste, diga-me alguma coisa para que possa dizer ao meu povo.  

Eu sei, ninguém vai te atravessar duas vezes. Mas e eu, quantos vão ainda me magoar até eu desaguar do oceano, como tu fazes todos os dias? Confesso, eu tenho medo. Por isso fico aqui te mirando, pedindo teus conselhos. Está bem, não queres dizer nada. Ou será que tu me falas e eu é que não te ouço? Ah, não sejas cruel rio de minha infância. Estou indo, mas saiba, mesmo longe, é a ti que procuro nas madrugadas sombrias e solitas. Quem mais? Gente como eu fica sem carinho, fica sem abraços e beijo de prenda. Nasce e morre por aí, por essas bibocas. Pior, nem sabe onde vai parar. Tu, pelo menos, sabes que vai descansar nas águas do mar. 

Então, velho rio caminhador, estou indo, a lida me espera. Um dia chegará meu fim, da vida paguei o preço, Deus saberá o que fazer de mim, e me dar aquilo que mereço...  

********** 

(Correio do Povo, 23 de abril de 2023)

sábado, 22 de abril de 2023

Oração Ecológica

 P. Nogueira Neto

Senhor, perdoai nossas faltas contra Vós.

Dai-nos sabedoria para entender

Que devemos também respeitar a Natureza,

Vossa maravilhosa criação,

Que a humanidade teima em destruir. 

Perdoai nossas faltas contra os outros homens,

Todos eles nossos irmãos. 

Dai-nos sabedoria para compreender

Que a qualidade da vida humana

Depende também da contribuição de cada um de nós

Na preservação do Meio Ambiente. 

Perdoai todas as nossas faltas.

Dai-nos sabedoria para contribuir de algum modo

Para que as águas sejam mais puras,

O ar menos poluído,

Os solos menos erodidos,

A vida silvestre melhor preservada

E as pessoas mais felizes.

Matemática para quem tem saco!

 

Veja o que acontece se multiplicarmos 37 por múltiplos de 3:

3 x 37 = 111
6 x 37 = 222
9 x 37 = 333
12 x 37 = 444
15 x 37 = 555
18 x 37 = 666
21 x 37 = 777
24 x 37 = 888
27 x 37 = 999

Agora veja isto:

111.111.111 x 111.111.111 = 12.345.678.987.654.321

Veja este trapézio:

1 x 9 + 2 = 11
12 x 9 + 3 = 111
123 x 9 + 4 = 1111
1234 x 9 + 5 = 11111
12345 x 9 + 6 = 111111
123456 x 9 + 7 = 1111111
1234567 x 9 + 8 = 11111111
12345678  x 9 + 9 = 111111111

E este outro trapézio:

1 x 8 + 1 = 9
12 x 8 + 2 = 98
123 x 8 + 3 = 987
1234 x 8 + 4 = 9876
12345 x 8 + 5 = 98765
123456 x 8 + 6 = 987654
1234567 x 8 + 7 = 9876543
12345678 x 8 + 8 = 98765432
123456789 x 8 + 9 = 987654321

E este outro:

0 x 9 + 8 = 8
9 x 9 + 7 = 88
98 x 9 + 6 = 888
987 x 9 + 5 = 8888
9876 x 9 + 4 = 88888
98765 x 9 + 3 = 888888
987654 x 9 + 2 = 8888888
9876543 x 9 + 1 = 88888888
98765432 x 9 + 0 = 888888888
987654321 x 9 - 1 = 8888888888
9876543210 x 9 - 2 = 88888888888
 

Agora cá pra nós... quem foi o cara que inventou isso?


O Goleiro

Luiz Coronel

O goleiro é um eremita

baixo a solidão das traves.

É um pacato cidadão.

Súbito é pássaro. Ave.


Sua casa é uma tapera

em patética solidão.

Jogam todos com os pés.

Só ele joga com as mãos.


Tem um destino de Átila

o goleiro em seus confins.

Onde ele pisa é chão raso.

Não cresce grama. Capim.


Por que não dorme na rede

enquanto o jogo acontece?

Não é possível. Há riscos.

A bola de repente aparece.


Ser goleiro é ser do contra.

Ele observa. Avalia. Mede.

O golo que todos procuram

por sua função, ele impede.


Nos dois tempos da partida

há calmarias e tormentos.

Perceba cobrança do pênalti:

Alinha-se um fuzilamento.


Ser goleiro é vocação?

Será que existe quem goste?

Preso às traves, qual um cão,

que se amarrasse num poste.


Ele salta do desamparo

com a fúria de um profeta.

Com que ímpeto o goleiro

chuta o tiro de meta!

 

Se a bola vem de escanteio

querem arrombar a porta.

Há tumulto em seus domínios.

É chuva de pedra na horta.

 

Para conter as torcidas,

os guardas formam paredes:

o suplício de um goleiro,

um frango no fundo das redes.

quinta-feira, 20 de abril de 2023

Viver de Letras

 

Alexandre Dumas, nome ignorado até então, chegou a Paris e apresentou-se ao general Fay a quem fora recomendado. O velho militar indagou: 

- Que sabe o meu amigo? Estudou Matemática? 

- Não, general. 

- Mas tem, talvez, algumas noções de Geometria, de Física? 

- Desconheço inteiramente tais matérias. 

- E alguns rudimentos de Direito? 

- Também não, general. 

- E Latim ou Grego? 

- Muito menos. 

- Tem, acaso, prática de escritório comercial? 

- Nenhuma. 

Disse-lhe, então, o general, compadecido já de tanta ignorância: 

- Dê-me o seu endereço. Pensarei, oportunamente, num meio de ajudá-lo. Por enquanto não vejo nenhuma possibilidade a seu favor, tamanho é o desconhecimento que revela sobre todos os assuntos essenciais ao desempenho de uma profissão qualificada. 

Num recorte de papel estendido pelo general, Alexandre Dumas escreveu o seu endereço: 

- Estamos salvos! – exclamou o general. Tem, pelo menos, uma linda letra. Vamos aproveitá-lo como copista de textos na Biblioteca Nacional. 

Após iniciar o trabalho, Dumas foi agradecer ao general o emprego que lhe destinara. E disse-lhe: 

- Vou viver da minha “letra”, general; mas asseguro-lhe que, um dia, hei de viver das letras...* 

********** 

* Alexandre Dumas escreveu “Os Três Mosqueteiros”. “O Conde de Monte Cristo”, “A Dama das Camélias”, “A Rainha Margot”, “O Homem da Máscara de Ferro”, entre outros romances famosos da literatura francesa.

quarta-feira, 19 de abril de 2023

Microscópio

 Humberto de Campos

Os salões do desembargador Marcelino Pedreira, à rua São Clemente, achavam-se repletos, como poucas vezes acontecia, naquela noite memorável. Políticos, magistrados, médicos, bacharéis, homens de letras e homens de negócios enchiam os grandes compartimentos do palacete magnífico, de mistura com o que há de mais fino, de mais chic, de mais distinto, nas rodas femininas do Rio. Lauro Müller, Miguel Couto, Pires do Rio, Antônio Azeredo, são silhuetas em evidência. O encanto da reunião está, entretanto, na revoada de moças e senhoras que volteiam pelas salas, e entre as quais se destaca, pela formosura, pela mocidade, pela inocência do olhar e dos modos, Mlle.* Júlia Petersen, noiva do Dr. Abelardo Moura e filha única do desembargador Feliciano Mendonça.

De repente, como se um punhado de folhas e flores obedecesse a um redemoinho invisível, faz-se uma roda em torno a uma das mesas da sala de chá. Homens de ciência e damas inteligentes formam o grupo.  Elevada, culta, a palestra versa os  assuntos mais variados, encantando as senhoras.

Na sala contígua, dança-se.  E, entre os pares, o Dr. Abelardo e a noiva. Súbito, parando, põem-se os dois a conversar:

- Que mãos tens tu, Julita! − elogia o noivo, maravilhado, apertando os dedos miúdos, finos, quase infantis, da sua prometida.

- Acha-a pequena? − indaga a moça.

- Microscópica!

 - Como?

- Microscópica! − insiste o rapaz.

Intrigada com o vocábulo, que ouvia pela primeira vez, a moça pede licença por um instante, penetra no salão de chá e, com a sua ingenuidade, indaga do Dr. Álvaro Osório:

- Doutor, que significa “microscópico?”

- É um derivado de “microscópio”, Mademoiselle! − explica o ilustre fisiologista.

- E que é “microscópio”? − torna a menina, franzindo a testa morena, que os olhos iluminam.

O Dr. Álvaro medita um momento, e, para não perder tempo, explica:

- É um aparelho que faz as coisas crescerem. Compreende?

A menina sorri, agradecida. De repente, porém, pisca os olhos, franze mais a testa, e enrubescendo:

 - Ahn!...

Morde o dedinho róseo, meio brejeira, meio encabulada:

- Sem vergonha!  Agora é que eu compreendo porque é que ele diz que eu tenho a mão microscópica...

E sai correndo, vermelha, a abraçar-se com o noivo.

* Mlle. abreviatura de Mademoiselle: tratamento antigo dado à mulher solteira, em linguagem de cortesia social.

Uma pequena história

 A bolacha e biscoito

Era uma vez uma bolacha que, sempre que passava na frente de um biscoito,  ficava cantando uma musiquinha irritante assim: 

- ...Sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha...”

O biscoito não suportava mais, por que não havia uma vez que ela não cantasse:

- ...Sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha...” 

Já fazia uma semana que ela, sempre que passava pelo biscoito, cantava: 

- ...Sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha...”

O biscoito, de saco cheio, resolveu comprar um revólver... 

E, assim que a bolacha passou cantando: “... Sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha, sou uma bolacha...” ele deu um tiro e a acertou em cheio!

Sabe o que aconteceu? 

? 

? 

? 

? 

? 

?

?

Ela saiu cantando: 

“ − ...Sou uma rosca, sou uma rosca, sou uma rosca, sou uma rosca...”

Deus nos livre

Luis Fernando Veríssimo

Deus nos livre da bomba de nêutron, do câncer

e das pessoas que cutucam e dizem “Hein? Hein?”.

Deus nos livre da crítica estruturalista e da fome.
Deus nos livre de todos os “ismos”.
Em especial do botulismo.
Deus nos livre da Censura.
E da morte prematura.
Deus nos livre da multidão.
Deus nos livre da solidão.
Deus nos livre, peremptoriamente,

de usar a palavra “peremptoriamente.
Deus nos livre do lirismo e da coriza nasal.
Deus nos livre de outro festival da canção.
E do nosso coração.
Deus nos livre dos bêbados que confidenciam.

Deus nos livre de um dia acordar, de ressaca,
no palco do Teatro Municipal lotado.

Deus nos livre do protocolo,

do requerimento em três vias, das fotografias 3x4,
da ficha de chamada e de descobrir que não é aqui,
é no outro guichê.
Deus nos livre do outro guichê.

Deus nos livre da gincana.

Deus nos livre de perder o Mário Quintana.

Deus nos livre da autoridade competente,
que com a incompetente ainda há diálogo.

Deus nos livre dos que pontificam

e dos que dizem  “óbice”.
Deus nos livre da fome dos outros.
Deus nos livre da meia-idade.
E da falsa humildade.
Deus nos livre da ira, da soberba, da gula,
da luxúria, da avareza, da inveja, da preguiça

e da mania de limpar o ouvido com uma tampa de caneta.
Deus nos livre da terrível faca de dois gumes.

Deus nos livre da paixão desenfreada e da grama artificial.

Deus nos livre dos que querem o nosso mal.
Deus nos livre dos que só querem o nosso bem.
Deus nos livre dos que querem o nosso.
Deus nos livre do  terror e do despertador.

Deus nos livre da tragédia.
E da alta classe média.
Deus nos livre dos futurólogos.
Deus nos livre do futuro!

Deus nos livre da burrice alheia,

que a nossa é pitoresca.
Deus nos livre da superstição.
E de tanta assombração.

Deus nos livre dos nossos salvadores.
Deus nos livre de colidir com um meteoro

e dos pontas que nunca cruzam para a área.

Deus nos livre dos que pedem que Deus os livre.
Deus nos livre das bravatas.
Deus nos livre das gravatas.
E, meu Deus, das literatas.

(Do livro “O Rei do Rock”, Editora Globo, 1978)

terça-feira, 18 de abril de 2023

Anúncios Modernos

 

PRECISA-SE de um espião da melhor qualidade, quanto menos referências, melhor. 

VESGO  troca olho direito pelo esquerdo de outro vesgo. 

PORTEIRO precisa de emprego com urgência, tratar com o porteiro. 

VENDE-SE um saxofone com urgência, tratar no andar de baixo e pegar o saxofone no andar de cima. 

TROCA-SE um rádio de pilha por uma pilha de livros sobre como consertar um rádio de pilha. 

TÉCNICO de som procura médico de ouvido, um dos dois está com a razão. 

MOTORISTA amador deseja trabalhar para motorista profissional. 

VIGIA procura emprego num edifício de respeito. Não deixa ninguém entrar sem perguntar para onde vai, nem sair sem perguntar a que horas volta. Trabalhou vinte anos na portaria da penitenciária. 

OCASIÃO − vende-se 1 metro pelo preço de 80 centímetros. 

BABÁ com oitenta anos com prática de crianças, procura uma patroa com prática de velhinhas. 

(...) 

VENDE-SE um foguete baratinho, semana que vem vai subir. 

VENDE-SE um segredo de cofre a quem conseguir abrir o cofre, porque o dono não consegue. 

(...) 

VENDE-SE um táxi com apenas cinco postes de uso. 

(...) 

MÉDICO especialista em médicos especialistas deseja consultar com médico não especialista. 

(...) 

VENDE-SE uma tranca de direção tão boa que os ladrões levaram o carro, mas não conseguiram levar a tranca. 

PROFESSOR aposentado deseja tomar aulas de aposentadoria. 

VENDE-SE uma cadeira de balanço que já não consegue mais balançar. 

PERDEU-SE uma jovem de dezoito anos, alta, esbelta, cabelos castanhos e olhos verdes. A quem devolver a jovem de 18, gratifica-se com duas de 35. 

CEGO procura psiquiatra para tratar sua mulher que deu para falar sozinha há mais de duas semanas. 

VENDE-SE um boato com a máxima urgência, antes que deixe de ser boato. 

VENDE-SE um fígado quase novo, favor não discutir na hora de acertar o preço. 

CONSERTAM-SE aparelhos de televisão, mesmo os que estejam funcionando bem. 

PRECISA-SE de um ator que saiba levar soco na cara, se reagir vai pro olho da rua. 

NEGOCIANTE com pequeno capital e grande capacidade de trabalho deseja dobrar o capital e reduzir a sua capacidade de trabalho. 

DETETIVE particular oferece seus serviços a mulheres enganadas. É tão particular que resolve seus problemas sem sair da sua casa. 

(...) 

VENDE-SE violino de menino-prodígio, faz-se um bom desconto a quem ficar também com o menino. 

DÁ-SE chance a uma secretária que dê chance. 

PROCURO piano desafinado para alugar, até meu vizinho aprender a tocar. 

(...) 

TIPÓGRAFO aflito compra um V com urgência, tratar com Bicente. 

(...) 

NOVELA DA TV precisa de ator responsável para fazer o papel de irresponsável. 

VENDE-SE um guarda-chuva por preço de ocasião, favor aparecer num dia de sol. 

VENDE-SE um véu de noiva que nunca foi usado, nem o véu nem a noiva. 

TROCA-SE um carro que pertenceu a uma só mulher e troca-se também uma mulher que pertenceu a vários carros. 

(Do livro “O Homem ao Zero”, de Leon Eliachar)

domingo, 16 de abril de 2023

Conto erótico nº 1

 Luis Fernando Veríssimo

− Assim?

− É. Assim.

− Mais depressa?

− Não. Assim está bem. Um pouco mais para...

− Assim?

− Não, espere.

− Você disse que...

− Para o lado. Para o lado!

− Querido...

− Estava bem mas você...

− Eu sei. Vamos recomeçar. Diga quando estiver bem.

− Estava perfeito e você...

− Desculpe.

− Você se descontrolou e perdeu o...

− Eu já pedi desculpas!

− Está bem. Vamos tentar outra vez. Agora.

− Assim?

− Um pouco mais para cima.

− Aqui?

− Quase. Está quase!

− Me diga como você quer. Oh, querido...

− Um pouco mais para baixo.

− Sim.

− Agora para o lado. Rápido!

− Amor, eu...

− Para cima! Um pouquinho...

− Assim?

− Ai! Ai!

− Está bom?

− Sim. Oh, sim. Oh yes, sim.

− Pronto.

− Não! Continue.

− Puxa, mas você...

− Olha aí. Agora você...

− Deixa ver...

− Não, não. Mais para cima.

− Aqui?

− Mais. Agora para o lado.

− Assim?

− Para a esquerda. O lado esquerdo!

− Aqui?

− Isso! Agora coça.

*************

(Do livro “O Rei do Rock”)

O Grande Axioma da Vida

 

Há uma história muito interessante, chamada “O Tesouro de Bresa”, onde uma pessoa pobre compra um livro com o segredo de um tesouro. Para descobrir o segredo, a pessoa tem que decifrar todos os idiomas escritos no livro. Ao estudar e aprender estes idiomas, começam a surgir oportunidades na vida do sujeito, e ele, lentamente (de forma segura), começa a prosperar. 

Depois, ele precisa decifrar os cálculos matemáticos do livro. É obrigado a continuar estudando e se desenvolvendo, e a sua prosperidade aumenta. No final da história, não existe tesouro algum. Na busca do segredo, a pessoa se desenvolveu tanto, que ela mesma passa a ser o tesouro. 

O profissional que quiser ter sucesso e prosperidade precisa aprender a trabalhar a si mesmo com muita disciplina e persistência. Vejo, com frequência, as pessoas dando um duro danado no trabalho, porque foram preguiçosas demais para darem um duro danado em si mesmas. Os piores são os que acham que podem dar duro de vez em quando. Ou que já deram duro e agora podem se acomodar. 

Entenda: o processo de melhoria não deve acabar nunca. A acomodação é o maior inimigo do sucesso! Por isso dizem que a viagem é mais importante que o destino. O que você é acaba sendo muito mais importante do que o que você tem. A pergunta importante não é “quanto vou ter?”, mas sim “no que vou me transformar? Não é “quanto vou ganhar?, mas sim “quanto vou aprender?. Pense bem e você notará que tudo o que tem é fruto direto da pessoa que você é hoje. Se você não tem o suficiente, ou se acha o mundo injusto, talvez esteja na hora de rever esses conceitos. 

O porteiro do meu prédio vem-me logo à mente. É porteiro desde que o conheço. Passa 8 horas por dia na sua sala, sentado atrás da mesa. Nunca o peguei lendo um livro. Está sempre assistindo à TV, ou reclamando do governo, do salário, do tempo. É um bom porteiro, mas em todos estes anos poderia ter se desenvolvido e hoje ser muito melhor do que é. Continua porteiro, sabendo (e fazendo) exatamente as mesmas coisas que sabia (e fazia) dez anos atrás. Aí reclama que o sindicato não negocia um reajuste maior todos os anos. Nunca consegui fazê-lo entender que, as pessoas não merecem ganhar mais só porque o tempo passou. Ou você aprende e melhora, ou merece continuar recebendo exatamente a mesma coisa. Produz mais, vale mais? Ganha mais. Produz a mesma coisa? Ganha a mesma coisa. É simples. Os rendimentos de uma pessoa raramente excedem seu desenvolvimento pessoal e profissional. Às vezes, alguns têm um pouco mais de sorte, mas na média isso é muito raro. É só ver o que acontece com os ganhadores da loteria, astros, atletas. Em poucos anos perdem tudo. 

Alguém, certa vez, comentou que se todo o dinheiro do mundo fosse repartido igualmente, em pouco tempo estaria de volta ao bolso de alguns poucos. Porque a verdade é que é difícil receber mais do que se é. Como diz o Jim Rohn, no que ele chama do grande axioma da vida “Para ter mais amanhã, você precisa ser mais do que é hoje”. Esse deveria ser o foco da sua atenção. Não são precisos saltos revolucionários, nem esforços tremendos repentinos. Melhore 1% todos os dias (o conceito de “kaizen”), em diversas áreas da sua vida, sem parar. Continue, mesmo que os resultados não sejam imediatos e que aparentemente, superficialmente pareça que não está melhorando. Porque existe, de acordo com Rohn, um outro axioma: o de não mudar: “Se você não mudar quem você é, você continuará tendo o que sempre teve”. “Fazer as coisas certas, e não certas coisas.  

“Quanto mais eu treino, mas sorte eu tenho.” 

(Tiger Woods – campeão mundial de golfe)