sábado, 30 de abril de 2022

Caminhos

 Matheus Piccini*

Quem nunca tomou caminho errado, que atire a primeira pedra. Mesmo um caminho errôneo tem o poder de nos tornar mais fortes. Existem muitos tipos de caminhos. Alguns avançam por uma trilha em meio a natureza. Outros têm a aparência de uma estrada sinuosa e estreita, cheia de pedras e buracos. 

Se o mar calmo nunca fez bom marinheiro, como diz o ditado, um caminho só de retas e fácil de trilhar, pode acabar tornando a pessoa mais frágil para enfrentar os dias amargos. Sim, eles existem mesmo na vida daqueles que andam por caminhos luxuosos. Ainda existem aqueles que, na maioria das vezes, tomam atalhos, porém, cuidado com os atalhos. Ao mesmo tempo em que eles encurtam a distância entre nós e nossos objetivos, acabamos por perder andanças essenciais para a nossa construção. São nos momentos de dificuldade, quando nos deparamos com aquela pedra enorme entre nós e o destino, que mais aprendemos. Trilhem seus caminhos, de cabeça erguida, pois o importante nunca foi a linha de chegada, mas sim o caminho. É ele que nos molda, que vai construir nossa determinação. 

******* 

(No Correio do Povo, 30 de abril de 2022)

* Matheus Piccini é Fotojornalista formado pela FAMECOS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil, fez esse trabalho para o Correio do Povo.

sexta-feira, 29 de abril de 2022

Pessoas carentes de empatia

 e desinteressadas pelos demais

Há pessoas que são uma luz em nosso caminho e outras que se transformam em uma escuridão que entorpece o nosso caminhar. Do mesmo modo, existem aqueles que fariam qualquer coisa por nós e outras pessoas carentes de empatia que não moveriam um dedo pelo nosso bem-estar. 

A verdade é que cada um de nós se relaciona de diferentes formas em cada contexto. Consequentemente, há relações que enriquecem nosso caminho e outras que nem tanto. Estas últimas podem acontecer com pessoas carentes de empatia. 

Alguma vez você já notou que existem pessoas que não compreendem que você cometa erros? Você já se relacionou com pessoas que não se importam com os seus pensamentos e sentimentos? Tratam-se de pessoas que não têm empatia, pessoas que não tentam se colocar no lugar do outro. 

A empatia é a capacidade de compreender a visão de realidade do outro ao perceber e ter consciência de seus sentimentos. Acontece que existem pessoas que não têm essa qualidade, por isso vamos contar como elas são, quais transtornos podem estar associados a elas e como se relacionar com elas. 

“Quanto menos empatia você tiver, menos amigos terá.

Colocar-se no lugar do outro ajuda a crescer como pessoa

e a fazer florescer as relações.” 

Coisas que as pessoas carentes de empatia não fazem 

As pessoas desinteressadas pelas demais não podem ter certas atitudes, pois não contam com a capacidade ou o interesse de compreender e perceber os sentimentos do outro. Há casos de pessoas desinteressadas que carecem de empatia, por isso vamos mostrar algumas coisas que elas não fazem a seguir: 

Preocupar-se com você. Estas pessoas não prestam atenção em você, ou porque estão concentradas em si mesmas ou porque não se importam com o que acontece ao redor delas. 

Sensibilizar-se. Mesmo que você conte a elas o que pensa e sente, elas não demonstram interesse em perceber e compreender o que está acontecendo com você. 

Confiar. Por não perceber o que pensamos e sentimos, as pessoas carentes de empatia não se sentem seguras em esperar algo de nós. 

Acreditar nos sentimentos dos demais. As pessoas desinteressadas nos demais duvidam das emoções alheias. Por essa razão, mostram-se frias com as pessoas ao seu redor. 

Ter compaixão. Elas não sentem um impulso por aliviar a dor ou o sofrimento dos demais. 

Se você tiver estas características em mente, vai ser mais fácil ver quem não é empático ao seu redor. Tenha em conta que existem variações para cada tipo de relação; existem pessoas que contam com pouca capacidade de empatia, e outras que contam com muita. 

Carentes de empatia, egoístas 

As pessoas carentes de empatia não se colocam no lugar do outro. Assim, negligenciam os sentimentos e os pensamentos dos outros. Uma das características mais sobressalentes dos desinteressados nos demais é o egoísmo. 

Dessa forma, os carentes de empatia podem ser muito egoístas, pois pensam no seu próprio bem-estar e deixam de lado as necessidades dos demais. Então, aproveitam as situações para se beneficiar. Deste modo, tiram proveito de nós.

Além disso, levam ao limite o fato de que os relacionamentos têm que ser recíprocos, então só dão se receberem algo em troca. Elas se relacionam de forma “utilitária”, fazendo da manipulação sua forma de vida. 

Assim, os carentes de empatia podem ser pessoas frias já que, com elas, experimentamos situações desagradáveis nas quais nos sentimos pouco compreendidos porque elas só desejam seu próprio bem-estar. Tratam-se de pessoas pouco amigáveis que não se conectam com os demais. 

Transtornos associados aos carentes de empatia 

Todos nós podemos ser carentes de empatia em algum momento das nossas vidas. No entanto, algumas pessoas costumam ter sempre essa característica. Alguns transtornos psicológicos estão estreitamente relacionados com a falta de empatia. Vamos falar deles aqui. 

Transtorno Narcisista de Personalidade. Estas pessoas são egocêntricas, apresentam uma preocupação extrema consigo mesmas e deixam os demais de lado. A falta de empatia neste transtorno de personalidade é relacionada com o fato de não verem nada além de si mesmas. 

Psicopatia. Consiste em pessoas que não podem se adaptar às normas sociais e na dificuldade de se conectar com os demais, por isso são percebidas como pessoas carentes de empatia. 

Transtorno de Personalidade Limítrofe. A pessoa costuma ter instabilidade emocional, por isso é difícil manter relações estáveis. Tem uma maior dificuldade para entender e prever como os demais se sentem. 

Quando fazemos um esforço para explicar para estas pessoas como nós nos sentimos e o porquê de suas ações nos ferirem, elas costumam não compreender. 

Inclusive, elas conseguem fazer com que nos sintamos culpados, então elas podem dar a volta por cima, insistindo que somos nós que nos comportamos mal. 

Tenha cuidado, a falta de empatia pode causar muita dor naqueles que são empáticos por natureza, naqueles que importam de verdade. 

Como enfrentar os carentes de empatia? 

Não só é muito difícil para estas pessoas compreender as demais, mas elas também manipulam para obter o que desejam. Daremos aqui algumas ideias de como enfrentar estas pessoas: 

Imponha limites. Você é quem decide até que ponto estas pessoas podem ir com você, não as deixe ultrapassar seu limite. 

Escolha bem os seus amigos. Se você acha que a pessoa não vê nada além das suas próprias necessidades, não a escolha. Ela vai acabar lhe fazendo mal. 

Seja assertivo. Comunique o que você quer dizer da melhor forma. Assim, o que você sente ficará claro. Deste modo, você não vai confundir uma pessoa carente de empatia com a dificuldade de transmitir adequadamente o que você quer dizer. 

Afaste-se caso não haja uma conexão emocional. Se você perceber que não há uma conexão entre os seus pensamentos e sentimentos com a pessoa, você pode estar diante de alguém carente de empatia. 

Entretanto, os extremos não nos levam a lugar algum. Às vezes podemos nos equivocar e ver somente os nossos próprios interesses, o que não significa que não sejamos empáticos. O importante é saber escolher quem está perto de nós e em quem depositamos nossa confiança, pois só assim sabemos com quem podemos contar nos momentos difíceis. 

As pessoas carentes de empatia são verdadeiras desinteressadas pelos demais. Então, não são capazes de se colocar em nossa pele para entender o que sentimos e o que pensamos. Além disso, elas não conseguem ver nada além de seu próprio mundo, por isso se mantêm em sua zona de conforto. 

Fuja das pessoas que dão uma volta no discurso para fazer com que você se sinta culpado. O que elas fazem é tentar usá-lo para conseguir o que elas querem. Então, são pessoas controladoras e frias, que não expressam verdadeiramente o que sentem, nem compreendem a situação pela qual você está passando. 

(Do Blog A mente é maravilhosa)

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Como eram os temas escolares

Usar enciclopédias era em si uma arte e um aprendizado sobre a árvore do conhecimento. 

Mário Corso

Esta geração talvez não entenda, mas vamos lá: no começo era Deus, Google veio depois. Não o contrário como alguns supõem. Portanto existiu um mundo sem Google. Verdade, sou testemunha. Como então que nós, os antigos, nos virávamos sem o supremo oráculo da internet? Simples, usávamos enciclopédias genéricas. 

Calma, eu explico. Trata-se de um livro em vários tomos com verbetes em ordem alfabética. Vários, pois em um só, este livro seria impraticável pelo volume. Cada família de posses tinha uma. Sendo de papel, não necessitava de wi-fi nem de luz elétrica. Salvo à noite, embora funcionasse também, com resultado similar, à luz de velas ou lampiões. 

Usar enciclopédias era em si uma arte e um aprendizado sobre a árvore do conhecimento. Afinal, a enciclopédia genérica era a porta de entrada, adquirir o significado básico para depois nos remeter aos outros livros. É difícil avaliar quanto a facilitação pelos dispositivos de busca possa enfraquecer nossa capacidade de encontrar e organizar mentalmente o saber, ou ainda de pensar o conhecimento como fragmentado. 

Gostava das enciclopédias temáticas. A Tecnirama era sobre tecnologia, física e química; a Naturama, sobre biologia, focada no reino animal; a Conhecer sobre tudo, mas não por verbetes, aleatória, como uma revista científica encadernada. 

A propósito, havia enciclopédias infantis. Réplicas das dos adultos, mas lúdicas, com volumes só de histórias e poesias. Outros tomos eram dedicados a como fabricar brinquedos, às festas populares e suas canções, ou ainda de como jogar jogos de tabuleiro. O Mundo da Criança era a mais popular. 

Quando precisávamos dar nossas palavras ao que tínhamos retido da pesquisa, era necessário folhas de papel almaço pautado. Eram folhas de um branco desmaiado, compradas soltas, tamanho aproximado ao A3. Vinham dobradas e assim eram usadas. 

Também usávamos uma máquina incrível. Acreditem, automaticamente, ao mesmo momento em que se digitava, ela já imprimia. Em caso de erro era recomeçar, ou passar um delete líquido branco por cima. 

Para ilustrar era na base do desenho. Permitido copiar, geralmente por transparência, colocava-se um papel fino que permitisse ver a figura a ser copiada. Outro recurso eram as decalcomanias, figuras prontas. Colocadas em água soltavam-se da base e aderiam a qualquer superfície lisa. Frágeis, exigiam tal perícia que era mais fácil desenhar. 

Gostava de usar mais que os dedos para aprender, do trabalho braçal de carregar aqueles livros enormes, distribuí-los pelo chão e mover-me entre eles. Havia uma concretude nos trabalhos escritos à mão, sensação de dever cumprido, mesmo com os borrados, com as pontas dobradas. Sobrando tempo, a delícia era se perder dentro das enciclopédias, espantando-se com o tamanho do mundo. 

(Do jornal Zero Hora, abril de 2022)

segunda-feira, 25 de abril de 2022

O jeans

 que era sonho de consumo dos jovens da década de 1960 

A busca pelo desbotado nas calças quebrava os parâmetros da época 

Ricardo Chaves

Talvez eu já tenha contado aos leitores do Almanaque Gaúcho, mas vale recordar. Quando eu, por volta dos 12 anos, fiz as provas para ingressar na Escola Técnica Parobé. Prestei o que, na época, era chamado de exame de admissão. Era uma espécie de vestibular de passagem do ensino primário para o ginásio.  

Desse momento, lembro de duas coisas: a primeira é que foi a minha melhor performance escolar, eram 800 candidatos e fui classificado em 11º lugar, um feito grande para alguém que nunca teve reputação de bom aluno; a segunda é que compareci para o primeiro dia de provas vestindo calças curtas! O termo bermuda (especialmente para uso masculino) só se tornaria comum muito tempo depois. Entre as centenas de estudantes, eu era o único com as pernas expostas. Baita mico, concluí, constrangido. 

Cedendo ao meu apelo patético, minha mãe Nilce tratou de comprar (urgente) uma calça Far-West, do afamado Brim Coringa (lançadas em 1956), para que eu usasse no segundo dia da competição escolar. Acho que todo mundo da minha idade, um dia, usou uma calça como essa. 

Era uma peça tosca e resistente para o uso diário e, segundo o fabricante, tinha uma grande vantagem: não encolhia a cada lavagem. Era coisa para guri ou trabalhador, ninguém se atreveria a usar para sair ou frequentar a missa de domingo. 

Mas, quem diria, quando Elvis Presley e James Deam começaram a aparecer nas telas de cinema usando jeans, a moda pegou. 

Ter uma legítima calça jeans americana passou a ser sonho de consumo da juventude. Poderia ser Levi's, mas as preferidas eram as da marca Lee. Qualquer esforço valia a pena para conseguir uma. Pilotos traziam na sua bagagem para revender; marinheiros traziam a bordo de navios; contrabandistas tratavam de enganar a alfândega para comercializar a preciosidade. 

E, aí, houve uma quebra de parâmetros. Se as calças, de outros tecidos, deviam ter um vinco marcado − frisar uma calça Lee era uma gafe imperdoável. Mais que isso: se, na virada da década de 1960 para 1970, havia propaganda de calças prontas que “não desbotavam e nem perdiam o vinco”, nos jeans se almejava exatamente o contrário. Uma calça Lee nova era legal, mas, se comparada a uma já gasta e desbotada, perdia longe. Havia até mesmo técnicas para anular a forte goma que quase impermeabilizava o tecido e para provocar um desbotamento “natural”.  

Logo surgiram as que se propunham a ser similares. Topeka, U S Top, entre outras. Essa última chegou a marcar a época da ditadura, lançando um slogan que mais parecia uma ironia: “liberdade é uma calça velha, azul e desbotada”. 

O fato é que o jeans veio para ficar. É verdade, também, que, no presente, está muito além do desbotado comportado dos anos de 1960 e 1970. Cortar uma velha calça Lee, transformada em bermuda, obviamente, sem fazer a bainha para permitir que se desfie, já não soa sequer como ingênua transgressão. Fico pensando o que meu avô acharia dos atuais (e já quase ultrapassados) jeans “destroyed”, rasgados, furados, puídos... 

Daria qualquer coisa para ouvi-lo... 

Colaborou Jorge Silva 

(Do jornal Zero Hora. abril de 2022)

Frases sarcásticas com sabedoria

 

Um homem pode até ser feio, mas se tiver um bom coração, vai continuar sendo feio, porque uma coisa não tem nada a ver com a outra. 

Pessoa que você nunca deve esquecer: 

1. Quem te ajudou nos tempos difíceis.

2. Quem te deixou nos tempos difíceis.

3. Que te colocou nos tempos difíceis. 

Eu até ligaria para sua opinião, mas estou sem créditos no celular. 

Bebi ontem como se não houvesse amanhã, só que teve... 

Se pizza que vem de moto demora, imagine o Príncipe que vem a cavalo... 

Sinto falta de algo na minha vida... acho que é dinheiro... 

Perdoar é divino, mas mandar à merda quem nos incomoda é sensacional! 

Pega essa sua safadeza e vem cá! 

Não coloque palavras na minha boca, coloque sua boca na minha! 

Rico come caviar; pobre come o que vier. 

O povo não é bobo, mas tem a maior cara. 

Economize água, tome banho comigo. 

Precisamos ter uma conversa urgente. E sem roupa!

Sai de cima do muro e vem cá pra cima de mim! 

Apenas me beija, o resto a gente resolve na cama. 

Já que um beijo vale mais que mil palavras, gostaria de escrever textos no seu corpo todo. 

Dizem que sexo prolonga a vida. Vem cá, que eu te faço imortal!

Se um dia você achar que estou pegando demais no seu pé, me avise que eu subo mais um pouquinho! 

Depois do jantar, já tenho algo especial programado para nós dois. Serei sua melhor sobremesa. 

A vida não está fácil, mas eu estou facinho, facinho... 

Namorado, hoje em dia, pode pegar na coxa, na bunda... menos mexer no celular, que aí já é falta de respeito. 

Passar álcool nas mãos você fica imune a várias doenças; bebendo, então, você fica quase imortal. 

Antes de você começar a falar, deixe eu dizer uma coisa muito importante: Pare! 

Um elefante incomoda muita gente, mas ser feliz incomoda muito mais. 

Necessito de alguém que me entenda para que logo me explique. 

Duas coisas te definem: Tua paciência quando não tens nada; e tua atitude quando tens tudo. 

Você se acha perfeito? Pois saiba que toda a perfeição é um grande defeito. 

Primeiro encanto, depois desencanto, por fim, cada um pro seu canto. 

Então ficamos assim: tudo certo e nada resolvido. 

Não sou nem bom nem mau. Sou como me tratam. 

Nunca desafies uma pessoa que não tem nada a perder. Quando perdeu tudo, também perdeu o medo. 

Quanto mais conheço as pessoas, mas entendo por que Noé só permitiu animais na arca. 

Há gente que é pacote completo: Além de lixo é um saco. 

Não sou um gênio da Matemática, mas tenho certeza que minha vida não é da sua conta. 

Regra simples em uma discussão: se você estiver perdendo, comece a corrigir o português da outra pessoa. 

Não transforme o que pensa em opinião, a menos que você saiba mesmo do que está falando.

domingo, 24 de abril de 2022

Encantamentos

 A Garota mais bonita que eu conheço 

Augusto Branco

A Garota mais bonita que eu conheço

A garota mais bonita que eu conheço
não é nenhuma miss,

nem engata tantos olhares quando passa por aí.

A garota mais bonita que eu conheço
nem acha que é bonita.
Acha graça e não acredita
quando eu a digo assim.

A garota mais bonita que eu conheço
não faz nada para parecer bonita.
Não faz boa maquiagem,
não usa joias ou roupas da moda,
não vai pra academia nem tem belo manequim.

A garota mais bonita que eu conheço

simplesmente sorri,
e, quando sorri,
ela é a garota mais linda do mundo!
 

******* 

Quero um homem que me chame de linda em vez de gostosa...

Que me ligue de volta quando eu desligar na cara dele...

Que deite embaixo das estrelas e escute as batidas do meu coração,

ou que permaneça acordado só para me observar dormindo... 

Quero um homem que me beije na testa...

Que queira me mostrar para todo mundo

mesmo quando eu estou suada e sem perfume... 

Um homem que segure minha mão

na frente dos amigos dele...

Que me ache a mulher mais bonita do mundo,

mesmo quando estou sem nenhuma maquiagem

e que insista em me segurar pela cintura... 

Aquele que me lembre, constantemente,

o quanto ele se preocupa comigo

e o quanto sortudo ele é por estar ao meu lado... 

Aquele homem que espera por mim...

Aquele que se vira para os amigos dele e diga:

“É ela! A mulher da minha vida!” 

Desconhecido 

sábado, 23 de abril de 2022

Por que morrem os grupos de WhatsApp

 David Coimbra

Tenho vários grupos de WhatsApp mortos dentro do meu celular. Não faz muito, eles eram tão ativos, tão resplandecentes de alegria ou pulsantes de opiniões definitivas, e hoje nem lembrança são, porque ninguém mais fala neles. 

De alguns, confesso com envergonhada sinceridade, nem sinto falta. Quando me inscreveram no grupo, pensei: “Quem são essas pessoas?” Aí é que está: na verdade, sou um tímido. Não me comporto com naturalidade diante de estranhos. 

Mas houve outros grupos, repletos de bons amigos, que, ao se formarem, exclamei: oh, que bela reunião! Achei que tudo seria perfeito entre nós, mas qual o quê! Coisas foram acontecendo. Coisas sempre acontecem. E os grupos foram desaparecendo devagar e, de repente, sumiram, como o sol atrás do Guaíba, no crepúsculo. 

Em alguns grupos, as pessoas se sentiam incomodadas pela presença de um determinado integrante. Aí, sabe o que elas fizeram? Criaram outro grupo, igualzinho, só que sem aquela pessoa. Ninguém comenta que aquela pessoa foi excluída, até porque o grupo antigo continua lá, mudo, ninguém saiu, só que ninguém se manifesta mais. É como se aquele cara, o excluído, estivesse em uma festa em que todas as pessoas ficassem sempre de costas para ele. Estremeço só de pensar que isso possa ter acontecido comigo em algum grupo. 

Eu, para evitar banimentos, me esforço para ser simpático no WhatsApp. Não emito opiniões polêmicas, mantenho-me distante de zonas de conflito, como a política, o futebol e a cloroquina. Mesmo assim, às vezes ocorre algo desagradável. Tipo: vou lá, escrevo uma mensagem que me pareceu interessantíssima e ninguém comenta. Ninguém! Não mandam nem aquelas irritantes mãozinhas com sinal de positivo. Por quê? Não gostaram do que escrevi? Acham que estou errado? Que é ridículo? Que fui bobo? Estão gozando de mim lá naquele grupo que fizeram sem a minha presença? Malditos! Vou sair desse grupo de esnobes. 

Sei que existe um instrumento que mostra quem leu a sua mensagem. Você vai lá e confere: ah, então o Fulano leu o que escrevi e não comentou nada... Esnobe! 

Mas não faço isso. Não vou perder tempo com acareações digitais. Se não querem comentar, não comentem. Mil vezes esnobes! 

Tenho um amigo que formou um grupo bem restrito, apenas com seu núcleo familiar: ele, a mulher e o filho. Ele passava mensagens que julgava curiosas, frases espirituosas, vídeos engraçados e tudo mais, e a mulher e o filho não comentavam. Ele saiu do grupo, indignado. O que me intriga: um grupo de duas pessoas é, tecnicamente, um grupo? 

Já saí de grupos. Hoje, não mais. É antipático. Conheço caras que se agastaram com as opiniões manifestadas em alguns grupos, saíram deles e foram recolocados. E de novo saíram e de novo os colocaram. E saíram mais uma vez, só que aí ninguém os recolocou, e eles ficaram de fora e todo mundo no grupo fala mal deles. Eu, não. Eu, agora, fico, para que não falem mal de mim. Já basta aquele em que estão todos, menos eu. 

Mas o que me intriga é: se não existem opiniões discordantes, se as pessoas se relacionam bem fora da internet, por que um grupo de WhatsApp formado por elas morre? É triste, isso. 

Sinto saudades de alguns grupos, admito, sobretudo nesse período de confinamento. Eram pessoas legais, por que se dispersaram? Dá uma sensação de abandono, entende? Tenho vontade de reunir essas pessoas fisicamente só para conversar sobre nosso velho grupo. Eram tantas boas tiradas, tantos vídeos hilários... Lembra daquela piadinha que o Beltrano contou? E o Sicrano, que sempre repetia postagens, lembra? Distraído, o Sicrano... O que houve conosco, para nos apartarmos? O quê? 

Penso, volta e meia, em retomar nosso relacionamento, mas sei que seria em vão, que se trata de uma nostalgia inútil. Não adianta mais tentar reativar o grupo que se foi. O que passou, passou. Vida nova, a fila anda. Mas, se as pessoas do grupo estiverem naquele em que estão todos, menos eu, vai dar problema. Ah, vai dar! Esnobes! 

(Texto publicado em agosto de 2020, em Zero Hora)

sexta-feira, 22 de abril de 2022

As vestes do O Laçador

“Antônio Caringi procurou-me em minha residência (na Rua Sarmento leite, 101, em Porto Alegre) para que posasse para o traço de seu lápis, o barro e o gesso de seus dedos. Como possuía uma espécie de museu, com trajes típicos, laços, boleadeiras, esporas, guaiacas, tirador, cuias, bombas e outros apetrechos, Caringi esteve várias vezes em minha casa. Tomava detalhes de mãos, braços, gestualidade e equilíbrio do tronco e pernas, peculiaridades e assentamento de cada peça ao corpo. Estas seções duravam de uma a duas horas, com as devidas paradas. Estava eu com 26 anos (1953). 

Assim, na grandiosidade da sua alma de artista, Caringi começava a criar e a modelar o seu ‘Laçador’, símbolo de um dos tipos mais característicos do homem rural gaúcho. 

Desta forma surgiram aspectos sobre peças do vestuário do futuro Laçador.

1) Tirador: espécie de avental de couro curtido e sovado que identifica sobremaneira a figura do Laçador e que protege a coxa do gaúcho na hora do correr o laço no momento da sujeição do animal. O artista o fez um pouco mais curto para usar melhor harmonia plástica na visão das pernas da figura humana na escultura. E o fez no tamanho perfeitamente dentro dos parâmetros campeiros. 

2) Laço: eu havia ganhado do velho campeiraço bajeense Severino Paes um laço que, pelo seu tamanho, era bastante raro: 14 braças e trança de quatro tentos. Assim usado em razão da dificuldade que o gaúcho de antanho tinha frequentemente para acercar-se de animais semisselvagens, muito ligeiros e perigosos, embora o campeiro procurasse montar cavalos ‘buenos de pata’ para laçar ‘campo a fora’. Ao manusear o laço demonstrativamente para Caringi formei uma armada maior, de acordo, abrindo-a adequadamente, de tal modo que essa, na parte inferior, ficasse apoiada no solo e a segurei, junto com as demais rodilhas harmonizadas em uma só mão, à direita, enchendo-a vigorosamente. Foi uma preocupação que tive para evitar eventuais discussões. 

O laço, com suas respectivas voltas não pequenas e apropriadamente enrodilhadas, não estava disposto de forma rígida, mas caía bem ao natural, pois era sovado a pealo. Arrematava as extremidades desta peça a característica ilhapa, junto da argola (grande) proporcional ao comprimento do laço de um lado e, na outra, a presilha. 

3) Guaiaca: espécie de cinta de couro largo, onde, por meio de repartições, guarda-se dinheiro e documentos, e que se destina a ajustar a bombacha à cintura. Esta usada pelo Laçador teve como inspiração um modelo antigo que eu possuía: de duas fivelas, com flores em relevo (tipo fabricado por Abramo Eberle de Caxias do Sul) e discretos medalhões metálicos ornamentais em sua extensão, aspectos estes a lembrar, através de tais formas cinzeladas, o bom gosto da ourivesaria sul-rio-grandense em peças da vestuária gaúcha. O mesmo cabe para a fivela do tirador. 

4) Bombacha: singela, sem exagero de panos, despida de plissados ou ornatos maiores (‘mondonguinhos’, ‘fofos’) e adequada às rudes lides do viver campestre. Enfim, uma bombacha como Mestre Caringi bem conhecia: não festivalesca. Foi dimensionada à sua sensibilidade plástica. 

5) Lenço: foi disposto por Antônio Caringi em uso distinto ao do hábito atual. Seguiu modelo dantes. Mostrei-lhe como, passado ao redor do pescoço, tinha suas extremidades bem nas pontas, disposição esta que, num entrevero de ‘ferro branco’, permite ao gaúcho desvencilhar-se do lenço quando eventualmente seguro pelo desafiante durante a peleia. Em razão de o lenço ser dobrado em retângulo deviam aparecer ‘as duas mosquinhas’ (dobras angulares) às costas. O escultor deu-lhe assentamento ao seu gosto estético. 

6) Camisa: simples, com gola e mangas dobradas e arregaçadas, adequadas à funcionalidade do laçar, botando a descobertos o vigor muscular dos braços e do peito seminu do campeiro, condizentes ao tipo de exercício árduo do seu trabalho quer nos parecer. 

7) Botas: preferiu esculpi-las em modelo rústico, a ‘meio-pé’ (aparecendo dedos e ‘meia planta’ do pé assentada no solo), lembrando a bota ‘de garrão de potro’ modelo artesanal primitivo que lhe mostrei em peça do meu acervo museológico. Este objeto está até hoje longe da vivência campesina. Na concepção simbólica do artista a bota-de-meio-pé dá uma integração mais íntima e telúrica do homem-terra e chão nativo. O Laçador não está descalço e nem de alpargatas ou chinelos. 

8) Vincha: fita estreita de pano, ou tento, disposta à cabeça, servia para prender ou sujeitar a abastada cabeleira que os gaúchos de outrora costumavam portar, cabelos estes, muitas vezes, aparados por afiadas facas. Pelos meus registros a vincha aparece com mais frequência na iconografia de ‘los gauchos cisplatinos’. Foi uma opção do escultor. Assim como o acréscimo de esporas ‘encabrestadas’ (tipo ‘chinela’ ou ‘papagaio’ virado para baixo) para dar mais assentamento plástico à figura maior, o motivo, junto ao pedestal de sustentação da estátua. A faca à cintura foi outra iniciativa sua”. 

Texto publicado em “O Laçador − Símbolo da Terra Gaúcha e sua Nova Morada”, de J.C. Paixão Côrtes.

P.S. O monumento permanece onde está, na entrada da cidade, próximo ao aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul.


Antônio Caringi entrega a Paixão Côrtes uma réplica da estátua.

quinta-feira, 21 de abril de 2022

No tempo da Romi-Isetta

Deu uma enorme vontade de expor aqui, às novas gerações, coisas, expressões e nomes esquecidos hoje, embora importantíssimos. 

Zé Victor Castiel

Não sou e nunca serei saudosista. Ao contrário, entendo e aplaudo todas as novidades tecnológicas que facilitam nossa vida. Acontece que dia desses, ao homenagear Porto Alegre, acabei relembrando algumas coisas boas que os sessentões de hoje viveram nas décadas de 1960 e 1970, o que me deu uma enorme vontade de expor aqui, às novas gerações, algumas coisas, expressões e nomes esquecidos hoje, embora importantíssimos, porque de certa forma são a gênese da evolução incrível que testemunhamos. 

Juro que não é por saudade, apenas a título de curiosidade. Quem não souber do que estou falando, pergunte aos mais velhos. Já estes podem chamar os jovens e perguntar se sabem do que se trata. 

Pão de meio, de quarto ou cervejinha (também conhecido como “bundinha”); bala 7 Belo; prensado só de queijo; Guaraná Caçula; Zé do Passaporte; TV Telefunken; Genius; orelhão; telefone fixo com disco; Pagoda; bondes; abrigo dos bondes; auto de praça; Transglobe da Philco; Maluquinho da Praça do Portão*; tobogã; reunião dançante; Ki-Suco de groselha; pó de arroz; cinco marias; sapata; funda; bolinha de gude; licença pra dois; choco preto e branco; Bataclã; Minuano e Charrua Limão; guaraná Sielva, Grapette; SP2; Variant; Vemaguet; LTD Landau; Simca Chambord; Rural Willys; Romi-Isetta; CB 400; Mini Enduro; transistor; Bat-Bat; Churrascaria Sherazade; Bar do Lola; Bar do IAB; relógio-ponto; calçado Passo Doble; Casa Maria, a Sua Sapataria; Von-Von; Gang, a loja que te entende; Escaler; Supermercado Real; Brim Coringa; Japona do Marinha Magazine; Amiguinha da Estrela; Topo Gigio; Parque de Exposições do Menino Deus; A Pantera Cor-de-Rosa; Thunderbirds; Jonny Quest; Cines Baltimore, Vitória, Cacique, Rio Branco, Atlas, Lido, Imperial, São João e Carlos Gomes; Tigrão Monark; kart de pedal; carrinho de lomba com rolimã; autorama, ferrorama; Falcon; Dom Pixote; Manda-Chuva; Catatau; Mesbla; Floresta Negra, Gattopardo; Birra e Pasta; Bar da Filô; Varig; Vasp; Transbrasil; Trem Húngaro; Banco Meridional; Caixa Econômica Estadual; Lula Lelé; Ilha da Fantasia; Jeannie é um Gênio; Shazan; Armação Ilimitada; Irmãos Coragem; O Direito de Nascer; Transasom; Mister Lee; Cascalho Time; Rádio Continental; Gordo Esbroglio; Pedrinho; 24 horas de Tarumã; Kichute; Mônica; Sônia; Saco & Cuecão; marofa; “é isso aí, bicho”; “uma brasa, mora?”; da lata; Fedor’s; TV Gaúcha; TV Difusora, TV Piratini; Valdomiro, Claudiomiro e Gilson Porto; Babá, Joãozinho, Alcindo e Volmir; e por aí vai. 

Não havia nenhuma das tecnologias de hoje. Nem redes sociais e muito menos comunicações em tempo real. Apenas a ironia de o homem já ter pisado na Lua, coisa que nunca mais o fez. Viva o moderno, mas há 50 anos também era divertido. 

(Do jornal Zero Hora, 21 de abril de 2022)

* A Casa Reinaldo era chamado, em reclames publicitários, de “A maluquinha da Praça do Portão”, de nome atual de Praça Conde de Porto Alegre.

“Paixão desde guri”

 

O escritor e jornalista Carlos Urbim, conterrâneo do célebre folclorista, revive a infância do menino João Carlos, já atento àqueles tempos para os pequenos requintes da vida doméstica e as manifestações culturais do povo rio-grandense. 

Ao preencher os espaços vagos no álbum Nosso Bebê, comprado havia meses na Livraria A Predilecta em Bagé, Dona Maria Fátima D´Ávila Paixão caprichou na caligrafia. Na página da dedicatória, chamou o marido, que assinou Julio Paixão Côrtes no lugar destinado ao papai. Com carinho e cuidado, a mãe registrou os dados na página sobre o nascimento: às três da madrugada do dia 12 de julho de 1927, na casa número 101 da Rua Rivadávia Corrêa, nasceu em Santana do Livramento uma criança do sexo masculino, pesando quatro quilos e medindo 59 centímetros. Na página sobre as roupinhas, com muitas linhas para o rol, Dona Fátima declarou com econômico orgulho: o bebê, ao nascer, já possuía o enxoval completo. 

Entre os casacos, mantilhas e sapatinhos tricotados estavam também a certeza de uma infância feliz e a paixão que começou desde guri. Na esquina da Rivadávia com a Rua Uruguai, entre a casa dos pais e a dos avós maternos, o menino João Carlos ouvia todos afirmarem: foi bem aqui que o argentino José Hernández, depois dos entreveros da Guerra do Paraguai, começou a declamar os primeiros versos do célebre Martim Fierro. Nada melhor para um moleque curioso, que um dia entregaria a vida à pesquisa da cultura popular. 

Os pátios das duas casas − imensos − eram interligados. Em torno do poço, os jardins e a horta com abóboras, alfaces, couves, repolhos, nabos, beterrabas e cenouras. Mais adiante, o pomar com laranjas, pêssegos, uvas, bergamotas, limas, abacates. Tão grandes eram os pátios que o pai, técnico de ovinocultura da Secretaria da Agricultura, trazia cordeirinhos quando voltava das viagens de inspeção. Eram os bichos de estimação do guri que, adulto, enveredaria pela mesma profissão e se tornaria expert na classificação de ovinos. 

Está no sangue, qualquer Ávila gosta de tocar um instrumento, cantar e dançar. Tem sido assim desde os primeiros que vieram do condado de Ávila, em Portugal. O avô, João Pedro Rodrigues Ávila, alto, moreno, bigodudo, tirava da gaita de oito baixos rancheiras e polquinhas de limpar banco. Foi repassando para o neto o gosto pelos ritmos e pelas coreografias das danças campeiras. E o piá herdou ainda a predileção por bigodes imensos, que se tornariam uma característica. 

Bem que João Carlos tentou. Foi, durante dois anos, aluno assíduo e esforçado nas aulas de piano da Dona Mosquita. Aprendeu a ler partituras e a aprimorar o ouvido, lições que aproveitaria para sempre, mas desistiu de ser pianista. Nas festas dos Ávilas, passou a cantar e dançar. E o interesse pelas indumentárias pode ter nascido numa fusão cultural só possível no Carnaval: quando tinha cinco anos, usou pela primeira vez pilchas gaúchas. E lá se foi ele para o baile infantil de chiripá, lenço, bombacha, bota e chapéu virado na testa. Se tivesse na mão um laço, em vez de pacotinho de confete e bisnaga de lança-perfume, não seria o esboço inicial de uma estátua? 

O gosto pelos detalhes, pequenos requintes da vida doméstica e as manifestações culturais do povo rio-grandense, tudo com o jeito artístico dos Ávilas, vem junto desde a Rua Rivadávia Corrêa. Baixinha, delicada, a avó espalhava aromas de essências pela casa. No banho, jamais esfregava o rosto de maçãs largas, para conservar a pele cor de cuia. Habilidoso, o avô sentava na frente de casa para esculpir palitos. Espalhava na calçada pedacinhos de sarandi bem maleável e, com faca afiadíssima, moldava centenas de palitos. Os prontos iam para caixas de chá da índia. Não havia visita que não saísse com uma caixinha de presente. 

Quem é Ávila tem olhos vivos, contornados por olheiras. De tanto querer ver tudo. Movido por essa paixão, o guri de Livramento se mudou para Uruguaiana, onde foi escoteiro e craque de basquete. Quando estava mais taludo, veio de muda para a Capital, como aluno do internato do IPA. E aquele pimpolho do álbum Nosso Bebê um dia virou modelo de monumento, esculpido por Antonio Caringi. Adulto, chegou a 1m82cm. Mas a escultura de bronze inaugurada em 20 de setembro de 1958 na porta norte de Porto Alegre tem 4m45cm de altura, pesa 3,8 toneladas e está sobre um pedestal de granito de 2m10cm. De bom tamanho para quem nasceu com quatro quilos e 59cm.

João Carlos D'Ávila Paixão Côrtes foi um folclorista, compositor, cantor, radialista e pesquisador rio-grandense. É também um dos fundadores do MTG, o Movimento Tradicionalista Gaúcho. 

Nascimento: 12 de julho de 1927, Santana do Livramento, Rio Grande do Sul;

Morte: 27 de agosto de 2018 (94 anos); Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

E para quem não sabe, ele foi o homem que pousou pilchado (com vestimentas típicas gaúchas), para servir de modelo ao escultor Antônio Caringi para que este realiza-se sua maior obra: a estátua do O Laçador.


quarta-feira, 20 de abril de 2022

Padre detalhista

 

Aquele padre havia sido nomeado recentemente para a paróquia. Instalou-se na casa paroquial que lhe estava destinada e, imediatamente, a velha governanta veio se queixar dos problemas que a casa tinha. 

− Seu teto está com goteiras, padre. Seu fogão está velhíssimo e sua geladeira não funciona. Sua televisão está sem som... e por aí afora. 

− Minha filha, respondeu o padre, esta casa não é só minha, é sua também, na verdade é de todos os nossos paroquianos... Por que você não diz “nosso teto”, “nossa televisão”? 

Passaram-se algumas semanas, e um dia o bispo veio visitar o padre. Estavam os dois conversando muito sossegados, quando a governanta entra de repente na sala e declara: 

− Padre, tem um rato no nosso quarto, debaixo de nossa cama. 

(P.C., Revista Seleções Reader’s Digest, julho de 1989)

domingo, 17 de abril de 2022

O diamante e o vaga-lume

 Fábula britânica 

(Robert Dodsley, 1703-1764) 

Uma jovem andava pelo jardim quando o diamante caiu de seu anel e aterrissou numa fenda entre duas pedras.

– Boa noite! Quem é você? – perguntou um vaga-lume* ao se aproximar para olhar de perto o recém-chegado. 

– Sou um diamante brilhante – respondeu o outro. 

– Bem-vindo ao lado escuro da vida – disse o vaga-lume. – Você não vai brilhar muito aqui embaixo. 

O vaga-lume fez sua lanterna brilhar o mais que pôde e acrescentou: 

– Ah, diamante, o que aconteceu com seu brilho agora? Nesta hora de má sorte você ficou à mercê do meu esplendor. 

– Talvez por enquanto – respondeu o diamante. – Contudo, você é apenas um vaga-lume convencido, que deve sua luzinha à escuridão ao seu redor. Eu continuo sendo um diamante, que passa na prova do dia. 

Na manhã seguinte, quando o Sol se elevou fulgurante no céu, o vaga-lume desapareceu. Mas o diamante cintilou, pois ele refletia os raios solares. 

(Do livro “Fábulas do mundo todo”) 

P.S. Há pessoas que possuem um brilho natural pela sua forma gentil e amorosa de viver, e há aquelas que imaginam que possuem esse brilho... 

*Antes da Reforma Ortográfica, a forma vagalume, sem hífen, era considerada correta. Contudo, com a entrada em vigência do Novo Acordo Ortográfico, a grafia certa passou a ser a com hífen: 

vaga-lume.


sábado, 16 de abril de 2022

O churrasco

 Luiz Coronel

Nos tempos de antigamente,

era galopar sem parar,

pois do suor da montaria

saía o sal, para salgar.


Eis, a lo largo, o churrasco:

chão de brasas e o espeto,

límpida lança de paz

assando a carne, a preceito.

 

Deite-se o carvão, noite escura,

com pendores para aurora.

Dois dedos de canha pura,

venha o mate, sem demora.

 

A farinha, em justa medida.

A picanha é uma medalha

ao esmero e precisão

do assador que a prepara.

 

Louve-se então a costela

e a maminha, com certeza,

convidando ao vinho tinto,

rubra rosa, sobre a mesa.

 

Tudo começa no afiar

das facas de bom talho.

Deite-se os pratos da lua,

nas nuvens, brancas toalhas.

 

O churrasco, já se viu,

é bem mais que refeição.

Churrasco, para o gaúcho,

faz do amigo um irmão.

Malhação de Judas

 

Embora a tradição venha perdendo força ao longo dos últimos anos, especialmente os dois últimos em virtude da pandemia do novo coronavírus, o Sábado de Aleluia  costuma ser dia em que grupos de garotos saem às ruas arrastando bonecos, numa referência à malhação de Judas, mais uma das simbologias da Semana Santa. 

Nas cidades, já foi comum esses grupos saírem pedindo balas e doces aos comerciantes que, em tempos passados, já se prepararam, guardando as iguarias que seriam distribuídas aos garotos durante a manhã de sábado. 

A malhação simboliza a morte de Judas Iscariotes, o apóstolo que entregou a localização de Jesus aos romanos por 30 dinheiros.

No dia seguinte à crucificação, Judas foi encontrado morto, enforcado em uma árvore. Como ele foi considerado um traidor na tradição católica, muitas pessoas queriam desforra. Por isso, o sentido da malhação, com as crianças espancando os bonecos que arrastam pelas ruas. 

Por conta da presença de possíveis grupos de garotos malhando o Judas e pedindo balas e doces aos comerciantes, a Polícia Militar recomenda mais atenção aos motoristas que estiverem circulando pela cidade, durante o sábado, já que envolvidos com as brincadeiras, muitas crianças acabam indo parar o meio da rua, diante de veículos, o que pode acabar em atropelamento. 

Símbolos 

Em algumas áreas rurais ainda persiste o costume de se “queimar” o Judas durante o Sábado de Aleluia. Neste dia, moradores costumam encher as roupas de um homem com o chamado capim barba-de-bode, já seco e de fácil combustão, transformando-as em um boneco que recebia, como parte do enchimento, bombinhas explosivas e moedas. 

Esse “Judas”, cuja fisionomia se aproximava o máximo possível de algum personagem conhecido da política ou da própria localidade que merecesse ser castigado, era, geralmente, amarrado a um poste. Ao meio-dia do Sábado de Aleluia, o boneco era incendiado e a cada explosão dos fogos de artifício, as moedas aquecidas pelo fogo eram lançadas à distância para serem recolhidas pela garotada. Na ânsia de recolher a maior quantidade possível de moedas, muitos acabavam não se dando conta e queimando as próprias mãos com as moedas, quentes em demasia. 

Esta era um tipo de “malhação” ou de “queima” de Judas, muito comum em locais mais distantes de áreas urbanas, onde persiste a malhação com bonecos. 

Em São Paulo, Capital, na região do bairro Lava-Pés, a malhação de Judas quase sempre acaba descambando para a violência com pessoas feridas e muita confusão. 

Testamentos 

(...)


Geralmente, os “Testamentos”, espécie de crônica indiscreta de costumes, traziam fofocas ou fatos inconfessáveis envolvendo personagens da comunidade.
 

Há muito tempo, os “Testamentos” deixaram de ser feitos. 

Uma tentativa recente de revivê-los, décadas atrás, acabou indo parar na Polícia e nunca mais os versos apareceram sob as portas dos moradores. Um fato que ocorria sempre ao final da Semana Santa, quando a localidade ainda não dispunha de iluminação pública, o que tornava mais fácil a preservação da identidade dos responsáveis pelos tais “Testamentos”. 

(Do Blog de O Diário)

Maestro Tom Jobim

 

O maestro Tom Jobim, que faria 90 anos nesta quarta-feira, (25 de janeiro de 2017) foi também um grande frasista, contador de causos e piadista. Reportagem de capa de VEJA de 14 de dezembro de 1994, sobre a morte do compositor reuniu algumas de suas melhores tiradas – e também desabafos: 

01) Vivo me justificando das coisas que não disse. O pessoal inventa tanta coisa que no fim você não tem tempo de ser todas elas. 

02) Hoje em dia, eu sou arrimo de família. Tudo é comigo: papai, furou um pneu, vovô, eu estou chegando, etc. e tal. 

03) O voo direto para o Rio acabou. Precisa parar em São Paulo antes. Acabou o samba do avião. 

04) No Brasil tudo é importado: eu, você, a língua, os índios, a cana-de-açúcar e o café. 

05) Dizem que eu fico copiando música dos outros. Isso me tiraria todo o prazer da criação. 

06) O que balança mesmo é a música dos Estados Unidos, Cuba, Caribe e arredores e Brasil. O resto é valsa. 

07) Minha vida é extraordinariamente monótona. Não tenho nem um robe roxo, que melhora a biografia de tantos compositores. 

08) Vou trocar as lentes dos meus óculos mais uma vez. Já estou na idade de olhar as garotas de longe. E o pior é que você vai ficando mais velho e as moças mais bonitas. 

09) Cada mulher que não tenho é uma música que faço. 

10) O louvor vem do povo; a canalhice, da intelligentsia. 

11) Nunca fui um músico profissional, no sentido do compositor que só pensa em música. 

12) Não tenho muito tempo para ouvir música, porque eu sou um músico. Como profissional, depois de um dia inteiro de trabalho, horas e horas sentado ao piano, você chega em casa exausto, não quer ouvir mais nada. 

13) Dediquei minha vida à música brasileira, porque já tem francês para escrever música francesa, americano para escrever música americana. 

14) Eu acho que universal mesmo é fazer samba. Quer dizer, um pintor universal é aquele que pinta bem o seu quintal. Agora, se o brasileiro vai querer pintar o quintal sueco, aí já fica mais difícil. 

15) Você ama, ama, ama o seu país. E o país te tortura, te prende, te tira as coisas. Que diabo é isso? 

16) Nunca vi país mais corrupto, mais burocrático do que o nosso. 

17) Quando desabafo, digo coisas tristes, que sinto. Mas não sou eu quem fala mal do Brasil. É o Brasil que fala mal do Brasil. 

18) O Brasil tem tudo para dar certo, é um país riquíssimo, onde você pode ter cinco, seis colheitas por ano. 

19) Temos a mania da miséria. O Brasil não pode ver nada dar certo. O Brasil ama Garrincha, mas precisa aprender a amar Pelé. Ele deu certo, e o Garrincha morreu na miséria. 

20) Quero esquecer o Tom Jobim. Eu não sou nem nunca disse que era Tom Jobim. 

“Tom e bom é a mesma coisa”

A mesma reportagem de VEJA colheu o depoimento emocionado do amigo e parceiro de bossa nova João Gilberto. 

Antonio Carlos Jobim era um poeta, um filósofo. Tom era bom. Sabe, um homem bom? Pois é: era Antonio. Tom e bom é a mesma coisa. Divertido, inteligente, tão cheio de sensibilidade. Tom é uma das melhores pessoas que conheci na vida. Dizer assim, ‘das melhores’, é pouco. Conheci muitas pessoas boas, mas Tom era espetacular. Um escândalo. Nem sei dizer. 

Lembro de Tom na gravação de Chega de Saudade. Ele estava ali, na cabine, e eu no estúdio. Tom estava olhando, tinha os olhos emocionados, entusiasmados. Para fazer ‘O Amor, o Sorriso e a Flor’, subi a serra, até Petrópolis. Cheguei à noite, chovia, o carro encalhou, o trator veio tirar. Tom gostava de bichos, de plantas. Ele prestava atenção numa formiga passando. Imitava o barulho do macaco. Ele falava de pássaros, assobiava. Era um brasileiro. 

Lembro de Tom no concerto no Carnegie Hall. Ele moço, tocando piano. Nós ali, fazendo música. Nós ali, representando o Brasil. A gente querendo homenagear o Brasil, querendo o bem do Brasil, Nós querendo fazer uma coisa boa para o país. Um Brasil que fosse representado pela sua música, uma música bonita. Era uma coisa meio infantil, ilusão da juventude, o que seja. Mas acho que fizemos alguma coisa pelo Brasil. Tom fez tanto pelo Brasil (João Gilberto chora, chora, chora). O Brasil já foi tão bonito… 

Estou aqui, falando no telefone sem fio, de frente para a janela que mostra o Rio de Janeiro. Estou vendo o mar, a Lagoa, os morros. O Rio de Tom. O Rio de Janeiro do meu amigo Antonio Carlos Jobim. Mas agora onde está Tom? É Drummond, de quem Tom gostava tanto, quem pergunta: ‘E se todos nós vivêssemos?’ 

Não é fácil ser Tom Jobim 

Tom morreu nos Estados Unidos em 8 de dezembro de 1994, aos 67 anos, em decorrência de embolia pulmonar, dois dias após se submeter a uma cirurgia para remover tumores da bexiga. Na semana anterior, VEJA noticiava o lançamento de Antônio Brasileiro, novo disco do “garoto de Ipanema”: 

Novo? Mesmo com 65 000 cópias vendidas em três semanas e a certeza da gravadora de que o autor passará o Natal com mais um item na sua já formidável coleção de troféus, o Disco de Ouro das 100 000 cópias, a crítica não se intimidou como tanta glória. Elogiou, sim, como sempre, mas resolveu mostrar serviço arregaçando as mangas para reclamar que a maioria das quinze faixas não é inédita. Em momentos assim, realmente não é fácil ser Tom Jobim. 

(Revista Veja fevereiro de 2017)