terça-feira, 9 de agosto de 2022

Irmão Inácio

 

Irmão Inácio, frade laico, diariamente recolhia a esmola para o Convento. Passava de bom grado pelas casas dos pobres, porque os humildes, o que lhe davam, era de coração; porém, a um tabelião chamado Franco nunca pedia, porque sabia que era homem sem compaixão, que sugava o sangue dos pobres. 

Um dia o tabelião Franco, ofendido com o irmão Inácio, porque evitava sua casa, foi ao convento queixar-se ao Prior por tanta desconsideração. 

- Parece-lhe, padre, que eu seja pessoa assim desprezível? 

O Prior pediu que se tranquilizasse, dizendo que já havia pensado em orientar o Irmão Inácio; o tabelião se acalmou e foi embora. 

Quando o Irmão Inácio voltou ao convento, o Prior o chamou e o repreendeu. 

- Que maneira é essa de tratar o tabelião Franco? Amanhã vai a casa dele e traga tudo o que ele te der. 

Irmão Inácio ficou quieto e baixou a cabeça. Na manhã seguinte, esteve na casa do tabelião, e Franco encheu a mala de garupa com tantas boas coisas que Deus dá. Irmão Inácio carregou a mala nas costas e se pôs a caminho do convento. Ao primeiro passo, uma gota de sangue pingou da mala, depois outra, e outras mais ainda. As pessoas no caminho, vendo o irmão com a mala que gotejava sangue, comentavam: 

- Coleta gorda, hoje, para o Irmão Inácio. 

À noite, os padres preparam um jantar daqueles. E Irmão Inácio, calado, continuava a caminhar, deixando atrás de si um rastro de sangue. 

No convento, os frades, vendo-o chegar com todo aquele sangue, diziam: 

- Irmão Inácio já nos traz carne pela manhã. Carne fresca. − Abriram a mala de garupa e não havia carne. – E aquele sangue todo? De onde veio? 

- Não se espantem, − interrompeu o Irmão Inácio. – O sangue sai mesmo da mala, porque a esmola que o tabelião Franco dá não é fruto de seu trabalho, mas sangue dos pobres que ele suga. 

Daquele dia em diante, Irmão Inácio nunca mais foi ao tabelião pedir esmola.

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É a fábula nº. 191 de “Fiabe Italiane” de Ítalo Calvino, recolhida por ele em Caglari. 

Nota do livro: ”Irmão Inácio nasceu em Laconi e seu nome é ainda popularíssimo em Caglari e em lugarejos de Campidano. Foi irmão arrecadador do convento dos capuchinhos e dele ainda se conservam o leito, o terço e o crucifixo; foi declarado venerável e os “caglaritanos” tem por ele a mesma veneração que a um santo.” 

(Colaboração de Celito Brugnara)

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