segunda-feira, 5 de junho de 2023

Ponto e vírgula

 Grant Mariano

Encontraram-se num parágrafo.

Ele: um ser ínfimo, quase nada, um ponto;

ela: toda cheia de curvas, uma interrogação.

Ele lançou-lhe um olhar reticente

que se fixou nos dois pontos dos olhos dela.

Percorrendo seu corpo, deteve-se no etc.

Simétrica! Sem dúvida!

Para parnasiano nenhum botar defeito!

Subordinado àquela figura metafórica, sentou-se.

Ai!

Da voz grave saiu-lhe a interjeição.

Mas que desgraça a minha...

Não é que havia sentado num acento agudo?!

Por instantes, sentiu vontade de sair fora da linha.

Como?

Se um travessão os separava.

Circunflexo, apoiou-se na margem a sonhar.

Que bom seria se seus desejos fossem sinônimos

para poderem unir-se numa conjunção final.

Ele a cobriria de artigos indefinidos,

e, quem sabe até,

juntos poderiam iniciar uma oração.

Impossível!

Aquilo das maiúsculas era privilégio.

Mas, o verbo, ao menos,

haveria de permitir-lhe acompanhá-la

por um longo período.

Tão perto estaria que um adjunto tornar-se-ia;

quem sabe, um complemento.

Súbito, viu aproximar-se um sujeito,

que até então oculto estivera.

Possessivo de ciúmes, a princípio (numa exclamação)

classificou-o como anômalo.

Mas, finalmente, por sujeito indeterminado decidiu-se.

E ele então se sentiu reduzido a um diminutivo sintético.

Cruzaram asteriscos pela mente conturbada.

Só lhe restava jogar-se e sumir nas entrelinhas.

No entanto, dele se aproximou uma figura magra, curvada,

uma vírgula, em tudo colocando um ponto final.

Pondo seus pensamentos em ordem alfabética,

voltou à realidade de uma maneira coordenada.

O sonho foi desfeito, tornando-se ele, um agente da passiva.

Como pudera casar-se com aquela proparoxítona real,

sem predicado algum, sequer uma partícula de realce possuía?

Tornara-se objeto indireto das brincadeiras

de estilo irônico ou mesmo satírico.

Agora não restam alternativas ou explicativas,

concluiu numa análise sintática.

Esquecer era preciso,

e fazer daquilo

um ponto final.

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