sexta-feira, 2 de junho de 2023

O último computador

 Luís Fernando Veríssimo

Um dia, todos os computadores do mundo estarão ligados num único e definitivo sistema, e o centro do sistema será a cidade de Duluth, nos Estados Unidos. Toda a memória e toda informação da humanidade estarão no Último Computador. As pessoas não precisarão mais ter relógios individuais, calculadoras portáteis, livros, etc. Tudo o que quiserem fazer – compras, contas, reservas – e tudo o que desejarem saber estará ao alcance de um dedo. Todos os lares do mundo terão terminais do Último Computador. Haverá telas e botões do Último Computador em todos os lugares frequentados pelo homem, desde o mictório ao espaço. E um dia, um garoto perguntará ao pai: 

− Pai, quanto é dois mais dois? 

− Não pergunte a mim, pergunte a Ele. 

O garoto apertará o botão e, num milésimo de segundo, a resposta aparecerá na tela mais próxima. E, então, o garoto perguntará: 

− Como é que eu sei que isso está certo? 

− Ora, ele nunca erra. 

− Mas se desta vez errou? 

− Não errou. Conte nos dedos. 

− Contar nos dedos? 

− Uma coisa que os antigos faziam. Meu avô me contou. Levante dois dedos, depois mais dois... Olhe aí. Um, dois, três, quatro. Dois mais dois quatro. O Computador está certo. 

− Bacana. Mas, pai. E 363 mais 17? Não dá para contar nos dedos. Jamais vamos saber se a resposta do Computador está certa ou não. 

− É... 

− E se for mentira do Computador? 

− Meu filho, uma mentira que não pode ser desmentida é verdade. 

− Quer dizer, estaremos irremediavelmente dominados pela técnica, mas sempre sobrará a filosofia.

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