terça-feira, 11 de novembro de 2014

Histórias do General Flores da Cunha



Homenagem

No auge do poder e glória, o general Flores da Cunha vai a Uruguaiana, ser “alvo de uma homenagem” como sempre temeu o Mário Quintana.
Foi escalado para saudá-lo o então acadêmico de direito Mirandolino Comaru. O rapaz deitava elogios ao interventor estadual.
- Bravo general Flores, corpo de espartano, cérebro ateniense, coração de pomba, alma de dama.
Flores chama o organizador do comício.
- Tira daqui esse demente, antes que me chame de fresco.

Prudência

Flores da Cunha era apaixonado por jogo. Qualquer tipo.
Entrou no cassino de Rivera, perdeu tudo. Já nascia o dia e lhe sobrara uma miserável nota de cem mil-réis. Numa última investida, largou-a no 17, com o revólver em cima.
Suando frio, olho grudado na arma, o crupiê gira a roleta, canta o número.
- Rojo 36... y negro 17 para el general!

Peru

Numa roda de pôquer no Clube dos Caçadores, Flores recebe de mão um four de damas.
Às suas costas um puxa-saco delira.
Impassível, o general dispensa o four e pede outras quatro cartas. O puxa-saco se surpreende: “Oh!”
E o general se volta, deliciado:
- Sofre, peru filho da puta!

Farroupilha

Apareceu na mesa um paulista bom de pôquer. Em coisa de uma hora já ia pelando o general. Numa dessas, sai uma rodada forte. O centro da mesa está forrado de fichas. O homem aposta grande, Flores paga e dobra. Até que o visitante desconfia e paga para ver. Flores abre o jogo – não tem carta que combine com outra. O paulista avança a mão para as fichas, enquanto ri.
- O que é isso, general?! Cachorrão!...
- O que é isso pergunto eu. Le ganhei a mão.
- Mas como, general?
- Flores tira o revólver e o coloca sobre a mesa, enquanto explica, muito sério:
- Aqui no Rio Grande, cinco cartas uma diferente da outra chamamos de farroupilha. É o jogo mais alto.
E recolheu as fichas. Olho na arma, o assustado paulista engoliu quieto.
Quase de manhãzinha, o parceiro apresenta, triunfante, um farroupilha na mesa. Ri contente. Porém, novamente é alcançado no caminho das fichas pelo revólver do Flores.
- Não, seu moço. Farroupilha é jogo tão importante que só vale um por noite.

Vivências

Surpreso, um jovem político conhece o general Flores já aposentado, no Rio, sem fortuna, depois de tanto poder. Ele explica:
- Minha vida foi generosa. Meu problema foi cavalos lerdos e mulheres ligeiras.


Flores da Cunha, já velho, no Jockey Club Brasileiro,
no Rio de Janeiro.

(Do livro “Tenho Dito!, de Paulo de Tarso Riccordi)


Um comentário:

  1. Nessa pandemia, me recordei de um jovem juiz da Barra da Tijuca, surfista e tão inesperado quanto o general, de excelente índole de magistrado. Era um Flores da Cunha. Soube que faleceu tragicamente num acidente e moto. Uma pena.

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