domingo, 2 de novembro de 2014

Ipê dos Colhudos

               

Galpão de estância do extinto deputado e médico Aramy Silva, na divisa dos municípios de São Borja e Santiago, no rincão da Encruzilhada. O assunto, naquela manhã invernosa de chuva, era tamanho de árvore: altura, diâmetro, galharia. principalmente altura.

- No mato do meu finado avô – que o Senhor o tenha a seu lado -, havia uma timbaúva que quando era manhã de cerração a gente não enxergava a galharia, olhando cá de baixo. Quando serraram ela e a bruta se veio abaixo, abriu um boqueirão no mato. Dois laços de quinze braças, acolherados, não deram pra medir o tamanho do tronco...

- Deve ser a timbaúva onde os paraguaios, quando invadiram São Borja, acamparam tudo debaixo dela. E ainda sobrou sombra.

- Não te fresqueia, rapaz. Meu pai quase enricou vendendo gamela da dita cuja. Deu mais de duzentas, das grandes...

- Meu pai comprou uma. Das melhor. Serviu pra cama de três dos meus irmãos menor...

- Não te fresqueia, aborto de égua véia. Arrespeita os que têm mais vida do que tu. Tu tá me horrorizando a história...

- Ironizando, seu Pulchério. Horrorizar é outra coisa.

- Mas entenderam, pois não é? Pois vão à puta que os pariu, com licença das mães de vocês...

Coqueiro de trinta metros. Canafístula de quarenta. Pau-ferro de quarenta e cinco. A reunião estava animada, a cana corria frouxa, a altura das árvores aumentava como barriga de prenha.

Tio Xerembe cuspiu pela janela do galpão. Coçou a carapinha branca, soprou as caspas que lhe ficaram nas unhas encardidas e se meteu na conversa:

- Vão se cagá tudo vancês com essas arvezinhas miserável. Com estes óios que a terra há de comer eu vi, no Cerro do Ouro, quase na costa do Uruguai, um ipê que seu eu contar o tamanho vão me chamar de mentiroso. Agora, se me chamarem de mentiroso eu capo o fiadaputa que me afrontar.

- Conte no más, tio Xerembe.

- Conto e juro pelos ossos da finada. O tal ipê era tão alto, mas tão alto, que bugio pra chegar na última galhada tinha que levar fiambre para sestear na subida...




(Do livro “Rapa de Tacho” Casos Gauchescos, de Aparício Silva Rillo)
Tchê Editora de Bombacha


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