Em 1956/57 o conjunto Os
Gaudérios era um dos grandes sucessos da Rádio Farroupilha, inovando na
música regionalista, com arranjos belíssimos e usando instrumentos até então
alijados daquele segmento musical. Jarbas, vocalista e violonista; Moraes
Filho, vocalista; Fernando
Miranda - o Neneco -, acordeonista e o maestro José Gomes,
arranjador e violonista, traziam em cada apresentação maior brilho às raízes
musicais dos gaúchos.
O conjunto explodiu em
sucesso não só no Rio Grande do Sul, mas em todo o Brasil e, até, na Argentina
e Uruguai. E isto significava viagens. Viagens que Neneco, com seu pânico em
viajar de avião, detestava.
Frequentemente ele fugia do voo, trocando uma
passagem aérea por uma de ônibus. Mas o problema ficou incontornável quando Os
Gaudérios teve uma apresentação em Paris.
Sobrevoar o Atlântico
durante quase 24 horas, dentro de um Super G Constellation, era demais para
Neneco. Tentou todos os argumentos, oferecendo substitutos e, até, ameaçando
adoecer. Mas não houve como escapar. Doses maciças de calmantes, acompanhadas
de uísque, trouxeram a coragem necessária para subir a bordo. Neneco sentou
junto à janela, a lado dos motores. Suando frio, não desviava os olhos
arregalados das hélices que começavam a girar. Durante o taxiamento na pista e
a decolagem ele não ousava se mexer, como se um movimento seu pudesse
desequilibrar o avião.
Quando o enorme
Constellation ganhou altura e estabilizou o voo, Neneco levantou e chamou aos
gritos:
- Aeromoça! Aeromoça! Venha
urgente! Agora!
José Gomes, a seu lado,
tentava, inutilmente, acalmá-lo:
- Calma, Neneco. Está tudo
bem.
- Tudo bem, uma ova!
Aeromoooçaaa!
Os passageiros, já meio
alvoroçados, apressaram a chegada da comissária de bordo.
- Pois não, cavalheiro.
Algum problema?
- Problemão! O que está
acontecendo com estes dois motores? - falou apontando pela janela.
Uma olhadela e a resposta
tranquila:
- Nada, senhor. Os motores
estão normais.
- Normais, coisa nenhuma!
Estou cuidando desde a decolagem. Estes motores estavam, em Si bemol e agora
estão em Ré maior! Por que mudaram?
* * * * *
Músico da Rádio
Farroupilha, Arthur Elzner, foi atropelado por um carro à noite, quando se
dirigia para o restaurante Treviso, atravessando a Avenida Borges de Medeiros,
entre a Prefeitura e o Mercado Público.
O acidente não foi grave,
mas ele caiu junto ao meio-fio. O carro fugiu e alguns notívagos vieram
ajudá-lo.
- Está machucado? - perguntou
um deles.
- Não,
estou bem. Tudo bem.
- O senhor viu a placa ou a
marca do carro? - perguntou outro.
- Não, meu filho. Não vejo
nada. Sou cego.
Fez-se um silêncio constrangido.
- Mas a buzina do carro era
em Si bemol, completou Arthur, acreditando que prestava uma ajuda inestimável
para identificar seu atropelador.
Do livro “Making
Off”,
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