Tropeiros fantasmas
Por Beraldo Lopes
Figueiredo
Lá pras bandas do Oriente, no
costado de Livramento, há uma fazenda centenária, toda de pedra, com mangueira
redonda, angicos gigantes, um pé de umbu que aconchegou, em sua sombra, Bento
Gonçalves e sua tropa.
Fazenda tão antiga, mas tão
antiga que nela ainda mora as almas da revolução. Seus donos atuais, com seus
carros modernos, não entendem o que acontece quando nas noites os dois mundos
se encontram.
Surge, num reponte da coxilha,
sob o vento minuano, uma tropa de fantasmas, cavalgando pelo pampa, gritando
pela justiça dessa terra, no trote que treme a terra, no bufar das narinas dos
cavalos, leves relinchos quebram o silêncio e, embaixo do velho umbu, a tropa
que ninguém vê, apeia pra descansar, no clarão da lua cheia.
As esporas trepidam como um guizo
de cascavel, o povo, dentro da casa, escuta tudo quietinho e quando abre a
porta da casa, está tudo silente e embaixo do velho umbu nada tem, nada consta,
está tudo normal. Os guaipecas da estância nem deram sinal.
Porém, quando fecham a porta,
tudo volta lá fora. Umas conversas e risadas, um grita pelo mate, outra pede um
pelego sobrando, pois diz que a noite tá fria. Logo se vê o barulho de gravetos
quebrados, um grita pelo fogo, e logo ele acende e se vê o estalar da madeira
queimando, uma conversalhada. Novamente, o dono da estância abre a porta com
uma arma na mão, mas logo vê que nada tem, apenas os grilos da noite. Agora,
assustado e com medo, sabe que nada vê, mas que quem ele não vê está vendo ele
todo medroso.
Assim é nosso pago, cheio de
mistérios, nas estâncias antigas, ainda mora almas doutro mundo, inconformadas
pelo destino de morrerem tão jovens, deixando o corpo no chão, e agora estão
vagando pelos campos sem fim, fazendo tantas coisas que quando seus corpos
tinham. Montando em cavalos da imaginação, pobres almas perdidas, nos pampas da
escuridão.
O velho peão Geremias, sabendo do
acontecido, reza uma Ave Maria, pedindo que a tropa fantasma descanse noutras
paragens, pois, neste encontro de mundos, a ilusão de estar aqui, pobres almas
só vivem na noite, sem ver o sol estendendo sua luz no manto verde dos nossos
campos.
Logo o dia amanhece, a tropa foge
da luz, pois esta trás uma dúvida que eles não querem descobrir, pois ainda
pensam que vivem nos pagos do pampa gaúcho, mas, na verdade, estão mortos
vivendo nas noites escuras, lutando por uma briga perdida, tão perdida como uma
noite sem lua.
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