Aeromoça da Panair
Historinha do Edu, famoso comandante
da Panair; motivo da marchinha de carnaval “Oi, zum, zum, zum, zum, zum tá
faltando um”, cantado pelos Cafajestes.
Eduardo Henrique Martins de Oliveira era
um gozador. Muitas vezes entrava mo avião, deixando cair à vista dos
passageiros, porcas e parafusos de um bolso previamente furado.
Mas a melhor
era a seguinte:
Dez minutos antes, Edu ia até o
banheiro do avião escalado, e passava chocolate no tampo da privada. Em
seguida, dizia para a chefe das aeromoças.
- Senhorita,
em cinco minutos vamos fazer a check do avião.
Entravam os dois na cabine e começava a inspeção:
- Poltronas, hum... hum; guarda-bagagens, hum... hum, cobertores...
Até chegarem ao banheiro. E para
horror da moça lá estava aquela massa marrom sobre o tampo.
Edu,
fuzilante, perguntava:
- Senhorita, o que é isso?
- Na... na... não sei, comandante.
Aí Edu passava o dedo, tirava um naco do troço e punha na boca.
- Isto é cocô, senhorita! Cocô!
Mas ela, desmaiada, não ouvia
mais nada.
Nota de
esclarecimento:
O comandante Edu morreu em 28 de
junho de 1950, quando o Constelation PP-PCG, modelo acima, acidentou-se na aproximação para
Porto Alegre. Não houve sobreviventes.
Eduardo Henrique Martins de
Oliveira, o comandante Edu, numa montagem com o Constellation, o avião que fez história na aviação comercial brasileira.
Acervo família de Eduardo.
A música citada foi composta por
Fernando Lobo e Paulinho Soledade, também comandante, e colega de Panair. Diz a
lenda que na mesa em que foi composta, estavam também Aracy de Almeida e
Dorival Caymmi. Vinham todos da missa de sétimo dia do Edu.
Zum zum
(Paulo Soledade e
Fernando Lobo)
Oi, zum, zum, zum,
Zum, zum, zum, zum
Tá faltando um. (bis)
Bateu asa, foi embora,
Desapareceu.
Nós vamos sair sem ele.
Foi a ordem que ele deu.
Oi zum, zum, zum.
Zum, zum, zum, zum
Tá faltando um. (bis)
Ele que era o porta-estandarte
E que fazia alaúza e zum zum.
Hoje o bloco sai mais triste sem
ele
Tá faltando um.
A morte os esperava no Morro do Chapéu
Entre eles ninguém cogitava de ir
para o céu, padecer no purgatório ou arder no inferno. Eram fuzarqueiros,
mulherengos, boêmios, ligadões nas boas farras da vida. Ninguém melhor do que
eles, os membros do “Clube dos Cafajestes”, representava a alma carioca das décadas
de 40 e 50. Para eles, o paraíso, o começo e o fim da vida, era Copacabana.
Heleno de Freitas, centroavante do
Botafogo e da seleção brasileira fazia parte do grupo. O doutor Heleno, como
alguns o chamavam porque havia se formado em Direito, tinha o diploma da
malandragem, exigida pelo Clube dos Cafajestes. Outro galhofeiro da turma era o
jornalista Sérgio Porto, que escrevia com o pseudônimo de Stanislaw Ponte
Preta, e se tornou famoso, mais tarde, como autor do “Samba do Crioulo Doido”.
Mas uma figura que pontificava no
Clube, tendo sido seu fundador e presidente, idolatrado por todos, era o
comandante Edu. Folgazão e irreverente, sempre de bem com a vida, e pronto para
qualquer sacanagem tropical, Eduardo Henrique Martins de Oliveira era piloto da
Panair do Brasil.
Naquele dia 28 de julho de 1950,
pilotando o “Constellation” prefixo PP-PCG, Edu decolara do Galeão às 15h47min,
rumo a Porto Alegre. Como sempre, alegre, brincalhão e festeiro, havia
prometido aos companheiros do Clube a melhor carne gaúcha para churrasco,
chegasse ele a hora que chegasse de volta, na Confeitaria Alvear, em
Copacabana.
Entre os passageiros do
“Constellation” estava Zenir Aita, uma jovem santamariense, certamente
pastoreando seus pensamentos cristãos. De tradicional família católica, exemplo
de retidão cristã, aos 23 anos já era docente do Curso de Formação de
Professores da Escola Normal Olavo Bilac. Acompanhada de seus tios, fora passar
as férias de julho no Rio de Janeiro.
Na hora prevista para o
pouso em Porto Alegre ,
já anoitecia e a região metropolitana estava banhada por uma daquelas chuvas
intermitentes de inverno, acompanhadas de cerração. Ao anunciar aterrissagem à
Torre de Controle, o comandante Edu não obteve permissão, porque o então
Aeródromo São João, naquelas condições climáticas, com sua pista de chão puro,
não comportava pouso de aviões tipo “Constellation” e “Douglas”.
O piloto recebeu então a ordem de
pousar na Base Aérea de Gravataí, onde já havia piso asfaltado. Mas, tinha pela
frente o desafio de encontrar o quadrilátero de aterrissagem, escondido sob a
noite, a cerração e a chuva: a Base não possuía instrumentos sinalizadores de
aproximação.
Eram oito da noite em São Leopoldo , quando
o silêncio do Morro do Chapéu, encoberto pela neblina e pela escuridão, foi
destruído por um estrondo de guerra e um crepitar de chamas gigantescas: havia
um gigante de pedra no caminho daquelas 51 vidas que estavam a bordo do
Constellation da Panair. Sem dar tempo para o calafrio final, o cataclismo a
ninguém poupou, decompondo corpos ou os entregando às chamas.
Ao lhes negar, para sempre, o
amanhecer de todos os dias, o acaso da morte igualou os opostos na vida. O
Clube dos Cafajestes esperou, numa vigília inútil, a volta de seu líder e a
carne para o churrasco. Em
Santa Maria , o jornal A RAZÃO estampava a manchete: “Maior
desastre da aviação brasileira”. E anunciava para a cidade, oprimida entre a
estupefação e a tristeza, a substituição da missa de aniversário dos doze anos
da Escola Normal Olavo Bilac, por uma missa pela alma de Zenir Aita.
Crônica de João Eichbaum
Nenhum comentário:
Postar um comentário