Fosse simples, o problema não estaria em uma coletânea de enigmas. A charada pertence ao livro O enigma de Sherazade, do norte-americano Raymond Smullyan.
Para as respostas arregimentaram-se três exércitos. O primeiro apontou a resposta de “um terço”. O segundo insistiu: a chance seria de 75%. O terceiro disse que a chance dos dois serem machos é a mesma do segundo bichano ser varão, ou seja, de 50%.
Mas pode ser que todas as respostas podem estar certas, pois a resposta vai depender de com o as pessoas entendem a pergunta. O rico é que cada um interpreta ao seu jeito e os três estão certos. Cada um transforma ao seu modo o enunciado coloquial em uma equação matemática.
Primeira resposta: Um terço
1. Há quatro combinações possíveis de sexo para os dois gatos:
a) Um macho e uma fêmea
b) Dois machos
c) Uma fêmea e um macho
d) Duas fêmeas
3. Sobram três opções. Como apenas uma delas interessa, as chances são de uma em três.
Segunda resposta: 50%
Se um dos gatos é macho, não entra no cálculo.
Existem duas possibilidades para o segundo gato: ser macho ou ser fêmea. Portanto, a chance de ser macho é de uma em duas (50%).
Terceira resposta: 75%
O enunciado define que pelo menos um é macho. Isso já assegura 50% de chance de os dois virem a ser machos.
A chance de o segundo bichano ser macho é metade dos 50% restantes, o que representa 25%. Resultado 50% + 25% = 75%
Quarta resposta: 100%
Para uma minoria bem-humorada, a resposta está na primeira frase da charada. Um homem tinha dois gatos...
O importante não é acertar, é pensar.
Discutir a solução de um enigma pode ajudar a construir a paz no mundo?
Na opinião da especialista em psicologia genética Léa Fagundes, sim. Com 60 anos* de magistério, a professora da UFRGS não esconde a satisfação com o debate em torno do enigma de Sherazade.
− Quando vi a discussão no jornal, eu disse: barbaridade, isso está maravilhoso!
Para Léa, mais importante do que a resposta é confronto de ideias. A troca de experiências e a descoberta de outras formas de raciocínio ajudariam a formar uma sociedade mais tolerante.
(...)
− Os professores deveriam analisar todos os raciocínios utilizados, e não privilegiar a forma única de resolver um problema. A ciência passa por um processo de relativização − argumenta.
Um sintoma disso estaria na Medicina. Segundo Léa, em vez de garantir que certo remédio representa a cura de uma doença, os cientistas têm afirmado que o medicamento tem determinada chance de funcionar, sob certas circunstâncias.
(...)
*60 anos na época da reportagem
De
uma reportagem de Rodrigo Cavalheiro, para o jornal Zero Hora, janeiro de 2006.
Nenhum comentário:
Postar um comentário