Os sete pecados da grafia
O arco-íris
tem sete cores — vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta. Tem,
também, outros nomes. Alguns o chamam de arco-celeste. Outros, arco da aliança.
Há os que preferem arco da chuva, arco-da-velha ou arco de Deus. Seja qual for
a denominação, o fenômeno óptico representa algo mais que o show multicolorido
do céu.
Cristianismo,
islamismo e judaísmo dizem que, depois do Dilúvio, quando a arca de Noé pousou
sobre o Monte Ararat, Deus fez um pacto com os homens. Prometeu que nunca mais
inundaria a Terra. Depois de cada chuva, o arco nas nuvens simbolizaria a
aliança entre o Todo-Poderoso e os seres vivos do planeta.
Pacto
semelhante firmaram as criaturas humanas. Trata-se da grafia das palavras.
Emprego das letras, do hífen, dos acentos sempre foi uma grande confusão. Muita
conversa rolou. Não faltaram xingamentos e sopapos. Mas valeu a pena. Saiu o
acordo. Ele está no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (Volp). Os
dicionários se baseiam nele. Segui-los pega bem. Informa que temos
familiaridade com a escrita.
Pacto da aliança
Leis existem para serem cumpridas. Mas nem todos o fazem. As principais
vítimas são palavras que soam do mesmo jeito, mas se escrevem de forma diferente.
O ouvido, infiel, engana. A gente se descuida. Ops! A punição não tarda. Cai a
classificação
Hora e ora
Hora significa 60 minutos: É uma hora. Que horas
são? A velocidade da via é de
Ora quer dizer alternância, por enquanto, por
agora: Ora, estuda, ora trabalha. Lamento, mas, por ora, nada posso fazer.
* Ora do
verbo Orar, 1ª conjugação, 3ª pessoa do singular Ele ou Ela ora.
Demais, de mais
Demais joga no time do exagero. Tem a acepção de
muito, demasiadamente: Como demais. Fala demais. Corre demais.
De mais quer dizer a mais. Opõe-se
a de menos: Ele me deu troco de mais (de menos). Até aí, nada de mais (de
menos). O Brasil tem processos de mais e juízes de menos.
Mal e mau
Mau, adjetivo, opõe-se ao também adjetivo bom. Na dúvida, parta para o
troca-troca. Reescreva a frase com o antônimo. Se soar natural, escreva o monossílabo
com u sem susto: lobo mau (lobo bom), mau humor (bom humor), mau funcionário
(bom funcionário).
Mal
tem dois papéis. Pode ser substantivo ou advérbio. Em ambos, opõe-se a bem: Nos
filmes românticos, o bem vence o mal. As drogas são o mal da atualidade. Não
tenho paciência com mal-humorados.
Mais e mas
Mais é o contrário de menos: Um mais um é igual a
dois. Trabalho mais do que ele. É isso, sem mais nem menos.
Mas, conjunção adversativa, quer dizer porém,
todavia, contudo, no entanto: Estudei muito, mas não passei. O deputado fala
muito, mas não convence. Muitos trabalham pouco, mas ganham altos salários.
Ó, oh
Ó
aparece no vocativo, quando chamamos alguém: Deus, ó Deus, onde estás que não
me escutas? Até tu, ó Brutus, meu filho! Ó Paulo, entra, que está chovendo.
O
oh! é interjeição. Tem vez quando ficamos de boca aberta − de admiração ou
espanto: Oh! Que linda criança. Oh! Que trapaceiro! Ó Rafa, não entendi seu oh!
de espanto. Pode me explicar?
Resumo da arca
É
isso. Tomada e focinho de porco são salientes e têm dois buracos. Mas um dá
choque. O outro cheira. Confundi-los cria problemas. E como! Na língua, ocorre
o mesmo. Há palavras que, na aparência e na pronúncia, são quase iguais. Mas
confundir-lhes a grafia faz estragos. Xô!
(Do Correio Braziliense – Blog da
Dad*)
* Dad Squarisi fez curso de letras na UnB. Tem especialização
em linguística e mestrado em teoria da literatura. É editora de Opinião do
Correio Braziliense e comentarista da TV Brasília.
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