terça-feira, 3 de janeiro de 2023

Moreninha

 

Bruno Seabra* 

‒ Moreninha, dás-me um beijo.

‒ E o que me dá, meu senhor?

‒ Este cravo...

‒ Ora, esse cravo!

De que me serve uma flor?

Há tantas flores nos campos!

Hei de agora, meu senhor,

Dar-lhe um beijo por um cravo?

É barato; guarde a flor. 

‒ Dá-me o beijo, moreninha,

Dou-te um corte de cambraia.

‒ Por um beijo tanto pano!

Compro de graça uma saia!

Olhe que perdes na troca,

Como eu perdera com a flor;

Tanto pano por um beijo...

Sai-lhe caro, meu senhor. 

‒ Anda cá... ouve um segredo...

‒ Ai, pois quer fiar-se em mim?

Deus o livre; eu falo muito,

Toda mulher é assim... 

E um segredo... ora um segredo...

Pelos modos que lhe vejo

Queres o meu beijo de graça,

Um segredo por um beijo?! 

‒ Quero dizer-te aos ouvidos

Que tu és uma rainha...

‒ Achas, pois? e o que tem isso?

Queres ser rei, por vida minha? 

‒ Quem dera que tu quisesses...

‒ Não duvides, que o farei;

Meu senhor, case com ela,

A rainha o fará rei... 

‒ Casar-me?... ainda sou tão moço...

‒ Como é criança esta ovelha!

Pois eu pra beijar crianças,

Adeusinho, já sou velha.  

(Do livro “Antologia de humorismo e sátira”, 

de R. Magalhães Junior) 

Nasceu Bruno Henriques de Almeida Seabra a bordo de um barco, em águas paraenses (Tatuoca), a 6 de outubro de 1837. 

Estudou as primeiras letras e preparatórios em Belém, indo depois matricular-se na escola militar da capital da República. 

Foi um trabalhador infatigável, escrevendo, quase que diariamente, folhetins, crônicas, poesias, etc., em vários jornais fluminenses. 

Como funcionário público exerceu, com zelo e dedicação, cargos no Maranhão, na Bahia e no Rio de Janeiro, vindo finalmente a falecer em Salvador (Bahia), no ano de 1876. 


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