Sinceridade
Sem pai, sem mãe, sem parentes, o Conrado voltara do serviço militar sem saber, mesmo, para onde fosse. Dos amigos da família, poucos restavam; e entre estes estava o Antônio Luiz, proprietário de uma pequena casa de móveis, cuja esposa o havia abandonado no mundo deixando-lhe, apenas, como documento de fidelidade matrimonial, a Ernestina e a Lulu, que andavam, agora, a primeira pelos vinte anos, a segunda pelos dezoito.
Acolhido pelo Antônio Luiz, que lhe deu casa e emprego, achou o Conrado que o melhor modo de pagar ao velho aquela dívida de gratidão seria casar uma das meninas, embora as soubesse alegres demais, para um homem trabalhador. E foi com essa ideia que, um dia, em conversa, tocou no assunto ao comerciante.
− Mas qual das duas você pretende? − indagou o velho.
− Eu? A mim é indiferente. O senhor que as conhece bem, é que pode ver qual das duas me servirá.
Antônio Luiz puxou a última fumaça do cachimbo de espuma, bateu-o, desentupindo-o, e falou, com a mão na consciência.
− Meu filho, isso depende de você. Se você pretende mulher que lhe dê filhos, fique com a mais velha; se, porém, quer uma que não lhos dê, escolha a mais nova.
E a um olhar interrogativo do rapaz:
− Sim, porque, se ela tivesse de tê-los, já os teria tido.
O Ladrão Honesto
O capitão Vicente Bandeira estava já no segundo sono, quando, pelas três horas da madrugada, percebeu barulho na sala de jantar. Ouvido alerta, sentiu um estalar de gaveta, e outros ruídos que lhe denunciavam a presença de estranhos, no andar térreo da casa.
− Lulu? − chamou, sacudindo brandamente a mulher. − Lulu?... Lulu?...
− Hein?... Hein?... Que é?... − fez a boa senhora, despertando.
− Parece que temos gatuno em casa, filha!
Corajoso e decidido, o valente militar engatilhou a pistola, e, de pé ante pé, desceu ao andar térreo. E não se tinham passado quatro minutos quando Dona Lulu conheceu, em cima, pela queda precipitada dos móveis, que o marido havia se atracado com o ladrão.
Confirmada a sua suspeita, desceu. Cabelo alvoroçado, em ceroula, descalço, Vicente Bandeira tinha diante de si, encostado à parede, com as roupas em tiras e o rosto em sangue, um rapazola de uns vinte anos, que tremia, chorando:
− Não me mate, senhor capitão. Eu sou um gatuno honesto! Eu roubo para viver, é certo; mas roubo sem rebaixar-me!
Vicente Bandeira olhava o rapazola, sem compreender. E o desgraçado continuava:
− Eu sou um rapaz de bons costumes, educado com grande carinho. Nunca frequentei lugares suspeitos!
E as mãos juntas, o rosto em lágrimas, um choro de cortar a alma:
−
E a prova, senhor capitão, é que, para roubar, eu só visito casas de família!...
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