sexta-feira, 5 de maio de 2023

Brasil Anedótico

 

TEIAS DE ARANHA 

Informação do professor Raul Pederneiras 

Fiscal de uma casa de penhores, Emílio de Menezes ia uma vez por mês ao Tesouro receber os magros vencimentos do cargo. E ao entrar ali, encontrava sempre um indivíduo obsequioso, que chorava as suas misérias, as suas moléstias, a sua fome, até que lhe arrancava uma cédula de cinco mil réis. Certa vez, o “mordedor” foi mais longe nas suas lamentações. 

- O senhor não imagina, − gemia, − o que eu tenho passado. Basta dizer-lhe que há quinze dias não como! 

- O quê, homem? − espantou-se o poeta. 

E para os funcionários: 

- Este camarada, com certeza, já está com teias de aranha no céu da boca!... 

FRANQUEZA DE MARIDO 

Osório Duque-Estrada - Discurso da Academia Brasileira de Letras. 

Passava Sílvio Romero, uma tarde, pela Avenida, quando viu grande aglomeração à porta de um cinema. Perguntou O que era, e um cavalheiro explicou-lhe, indicando um violinista: 

- Este homem comprometeu-se a tomar parte no nosso concerto de benefício, e recusa-se agora, por imposição da mulher, de quem tem medo! 

Silvio varou a multidão, indo tomar o “medroso” pelo braço. 

- Coragem, amigo! − Não se importe! − disse-lhe. 

E com a sua costumada bonomia: 

- Aqui está um velho que já casou três vezes, e que só tem feito no mundo o que as mulheres têm querido! 

O CLARIM 

Afrânio Peixoto - Conferência ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro,

a 2 de julho de 1923 

Reunidas em Pirajá, as tropas brasileiras desenvolviam daí, em 1822, o cerco do general Madeira, encurralado na Bahia com o restante das forças portuguesas. A 8 de dezembro Madeira lança um contingente de 2.000 homens contra a ala direita dos sitiantes, levando-os de roldão. Chegam reforços de parte a parte, e os lusitanos vão triunfar, quando o coronel brasileiro Barros Falcão prevendo a derrota e querendo salvar o resto dos seus homens, ordena ao clarim Luiz Lopes, português de nascimento, mas que abraçara, aí, a causa da independência: 

- Toca “retirar!” 

O soldado leva o clarim à boca e o toque que se ouve é: 

- “Avançar, Cavalaria!” 

E logo outro: 

- “Degolar!” 

Apavorados com o que ouviam, os portugueses, quase vitoriosos, recuam, os brasileiros ganham ânimo e avançam de novo. 

Estava ganha a batalha. 

DESARMANDO O INIMIGO 

Múcio Teixeira - “Os Gaúchos”, vol. I, pág. 362. 

Era Salvador de Mendonça diretor do jornal A República, no Rio de Janeiro, quando o governo imperial, não obstante as suas ideias democráticas, o nomeou cônsul do Brasil nos Estados-Unidos. Aceita a nomeação, foi o jornalista, nas vésperas da viagem, despedir-se do Imperador, e pedir as suas ordens para aquele país. 

- Não tenho ordens a dar-lhe, − respondeu-lhe, benévolo, o soberano. 

E sorrindo: 

- Apenas faço votos para que o senhor preste tão bons serviços ao Império, nessa República, quantos prestou à sua República no meu Império. 

PRUDÊNCIA DE POLÍTICO 

J.M.de Macedo - “Ano Biográfico”, vol. I, pág. 11. 

Liberal ardoroso, Manuel Antônio Galvão batia-se valorosamente na Câmara quando, no maior da agitação, em 1826, arrefeceu o entusiasmo, recolhendo-se a um silêncio prudente. Anos depois, quando lhe perguntavam a razão dessa mudança, ele explicava: 

- Tirei, então, a minha acha da fogueira para me não me arrepender na ocasião do incêndio! 

SANGUE E FLORES 

Tobias Monteiro - “Pesquisas e Depoimentos”, pág. 34 

Votava-se no Senado a Lei do Ventre Livre, a 28 de setembro de 1878. Nas tribunas do Senado, repletas, apareciam as figuras mais eminentes do mundo diplomático, entre essas o ministro dos Estados Unidos. A discussão do projeto foi brilhante e vigorosa, sob a presidência de Abaeté. E quando, pela votação, se verificou a vitória de Rio-Branco, o povo que enchia as galerias irrompeu em manifestações ao grande estadista, lançando-lhe sobre a cabeça braçadas e braçadas de flores. Terminada a sessão, O ministro dos Estados Unidos desceu ao recinto para felicitar o presidente do Conselho e os senadores que haviam votado o projeto. E colhendo, com as próprias mãos, algumas flores, das que o povo atirara a Rio-Branco, declarou: 

- Vou mandar estas flores ao meu país, para mostrar como aqui se fez deste modo, uma lei que lá custou tanto sangue! 

O HOMEM E A NATUREZA 

Alfredo Pujol - Machado de Assis, pág. 60. 

Ao iniciar Machado de Assis a publicação, em folhetins diários, do seu romance  “A mão e a luva”, Francisco Ramos Paz, um dos seus poucos amigos e seu confidente literário, lembrou-lhe a conveniência de descrever, em um dos capítulos da obra, o soberbo parque do Conde de São Mamede, no Cosme Velho. 

- A natureza inspirará uma bela página ao teu romance... − disse-lhe. 

Machado recusou, porém, de pronto. 

- A natureza não me interessa... 

E definindo-se: 

- O que me interessa é o homem! 

“OH, LINDA! 

Frei Vicente do Salvador - História do Brasil, pág. 107. 

Andando com outros por entre o mato, em busca de um lugar em que o seu amo fundasse uma povoação, um galego, criado de Duarte Pereira, foi ter a um monte à beira-mar, de onde se divisava um soberbo panorama. E tão encantado ficou com a posição descoberta que, não se contendo, exclamou:

- Oh, linda! 

É essa a origem, vulgarmente admitida, do nome que ainda hoje tem a antiga capital pernambucana. 

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