sexta-feira, 27 de outubro de 2017

O carrasco

Luís Fernando Veríssimo


Pequena história, significando não sei bem o quê. Dizem que, quando recebeu o Robespierre caído em desgraçam para medi-lo para a guilhotina, o carrasco se surpreendeu.

− O senhor aqui?!

− Veja você – disse Robespierre. − Não faz muito, eu é que estava mandando gente para você executar. Agora o condenado sou eu.

Mas isso é a política, um dia você manda, outro dia você é mandado. Inclusive para a guilhotina...

Ao que o carrasco disse:

− Felizmente, estou livre disso. Só eu sei manejar a guilhotina. Tenho o cargo mais estável da República.

− Aliás – disse Robespiere – fui que lhe contratei, lembra?

− Claro – disse o Carrasco – como poderia esquecer?

− Então me ajude a fugir – sugeriu Robespierre.

E o Carrasco sorriu e disse:

− Lembra por que o senhor me contratou? Porque eu era o servidor público perfeito. Eficiente, cumpridor de ordens e incorruptível.

Abra a camisa, por favor.

*****


Robespierre foi o principal líder jacobino. Famoso por sua firmeza, tinha o apelido de “O incorruptível”. Quando se tornou o homem mais poderoso da França, continuou morando na mesma casa, comendo as mesmas refeições moderadas, vestindo as mesmas roupas. Implacável com os inimigos políticos (enviou centenas à guilhotina), defensor dos direitos dos pobres, das mulheres e dos judeus. Não tolerava nenhuma oposição política, pois que ela só servia para atrapalhar “o verdadeiro rumo da revolução”. Essa intolerância com a oposição acabaria destruindo os jacobinos (ele, inclusive) e também muitas outras revoluções.


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