Nem ele se reconhecia: estava dando
patadas em casa, na rua, no trabalho. O tal do estresse. Gritava, buzinava,
vociferava. Com muito custo convenceram o cidadão que ele precisava de uma boa
duma análise. Antes que matasse o mundo.
Contrariado, foi. Falou (ou melhor,
gritou) durante os cinquenta minutos regulamentares. O médico disse:
− Você precisa fazer uns exercícios
para relaxar. Por exemplo: aqui no prédio, no térreo, tem um piano-bar. Desça,
vá ao balcão, peça um dry martini.
Mas não vire de uma vez.
Aprenda a controlar a sua ansiedade.
Olhe para a bebida, cheire, admire a azeitona – não vá comendo de cara −, dê um
pequeno gole, ouça a música.
Contrariado, foi. Entrou, casa vazia,
um velhinho tocava Summertine ao
piano. Pediu o dry martini. Já ia
virando de uma vez, ouviu a voz do médico. Levantou a taça, admirou o conteúdo.
Começou a se sentir melhor. Aquela musiquinha ao fundo, o bar vazio. E não é
que a coisa estava funcionando? Nisso, olhou para a direita e viu um macaquinho
andando pelo balcão, vindo na sua direção. Tenho que me conter, pensou rápido.
O macaquinho veio chegando, chegando, parou ao lado da taça, meteu a mão lá
dentro, pegou a azeitona, olhou para a cara dele, deu uma risadinha, deu uma
mordidinha na azeitona e jogou o caroço dentro da taça.
Tudo que o nosso herói queria era
estrangular o macaquinho, quebrar o bar inteiro e pedir o dinheiro de volta ao
médico. Mas ele tinha que se controlar, tinha que se controlar. Olhou em volta,
só tinha o velhinho tocando piano. Foi até ele, com os dentes trincados e
disse:
− Um – macaquinho – enfiou – a mão –
dentro – do meu – dry martini.
O velhinho interrompeu o Summertine, colocou a mão em concha na
orelha e disse:
− Assovia o começo pra ver se eu me lembro da melodia...
− Assovia o começo pra ver se eu me lembro da melodia...
(Crônica de Mário
Prata)
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