terça-feira, 25 de março de 2014

A porcelana do rei

        

Achava-se, certa vez, Confúcio, o grande filósofo, na sala do trono.

Em dado momento o rei, afastando-se por alguns instantes dos ricos mandarins que o rodeavam, dirigiu-se ao sábio chinês e perguntou-lhe:

- Dize, ó honrado Confúcio, como deve agir um magistrado? Com extrema severidade – a fim de corrigir e dominar os maus e indolentes, ou com absoluta benevolência – a fim de não sacrificar os bons e trabalhadores?

Ao ouvir as palavras do soberano, o ilustre filósofo conservou-se em silêncio; passados alguns minutos de profunda reflexão chamou um servo, que se achava perto, e pediu-lhe que trouxesse dois baldes: ‒ sendo um com água fervente e outro com água gelada.

Ora, havia na sala, adornando a escada que conduzia ao trono, dois lindos vasos dourados de porcelana. Eram peças preciosas, quase sagradas, que o rei muito apreciava.

Preparava-se o servo obediente para despejar, como lhe fora ordenado, a água fervente num dos vasos e a gelada no outro, quando o rei, emergindo de sua estupefação, interveio no caso com incontida energia:

- Que loucura é essa, ó venerável Confúcio! Queres destruir essas obras maravilhosas! A água fervente fará, certamente, arrebentar o vaso em que for colocada; a água gelada fará partir-se o outro!

Confúcio tomou então de um dos baldes, misturou a água fervente com a água gelada e, com a mistura assim obtida, encheu os dois vasos sem perigo algum.

O poderoso monarca e os venerandos mandarins observavam atônitos, a atitude singular do filósofo.

Este, porém, indiferente ao assombro que causava, aproximou-se do soberano e assim falou:

- A alma do jovem, o ó rei, é como um vaso de porcelana, e a justiça do rei é como a água. A água fervente da severidade ou gelada da excessiva benevolência são igualmente desastrosas para a delicada porcelana; manda, pois, a sabedoria e ensina a prudência que haja um perfeito equilíbrio entre a severidade – com que se pode castigar o mau, e a benevolência – com que se deve educar e corrigir o bom.

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(Do livro “Lendas do Deserto”, de Malba Tahan – Círculo do Livro)


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