sábado, 29 de março de 2014

Segredo de mulher



Como a Fidência se gabasse de discreta, seu marido resolveu tirar a prova. E para isso uma noite acordou-a com ar assustado, dizendo:

− Que estranho fenômeno, Fidência! Pois não é que acabo de botar um ovo?!

− Um ovo?! – exclamou a mulher, arregalando os olhos.

− Pois é para ver. E cá está ele, ainda quentinho. Mas escute: é preciso que isto fique em segredo absoluto entre nós. Você sabe como é o mundo. Se a notícia corre, começam todos a troçar de mim e acabam pondo-me apelido. Segure, pois, a língua. Nunca diga nada a ninguém.

A mulher jurou segredo e soube guardá-lo por umas horas, enquanto era noite e não tinha com quem taramelar. Mas logo que amanheceu pulou da cama e foi correndo em procura da comadre Teresa.

− Você é capaz, Teresa, de guardar um segredo eterno?

− Todo mundo sabe que minha boca é um túmulo...

− Pois então ouça: meu marido está noite botou dois ovos!...

− Não diga!...

− Pois é isso. Mas, olhe!... isto é segredo inviolável. Jure jamais o contará a ninguém.

A comadre Teresa beijou dois dedos em cruz; mas logo que a Fidência se foi, sentiu na língua uma tal comichão que contou a história dos três ovos à tia Felizarda.

Tia Felizarda também jurou segredo, mas contou a história dos quatro ovos à sua prima Joaquina.

Prima Joaquina também jurou segredo, mas contou a história dos cinco ovos à sua amiga Inês...

Inês...

E o caso foi que ao meio-dia a cidade inteira só comentava uma coisa – o estranho fenômeno do Zé Galinha, misterioso homem que punha cada noite doze dúzias de ovos...

*****

Monteiro Lobato, em Fábulas e Histórias Diversas,
Editora Brasiliense.




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