Faustino Xavier de
Novais*
Ó João!... anda cá, quero
falar-te,
Pra ensinar-te a viver d’hoje em
diante;
E nada tens depois pra
desculpar-te,
Se um dia eu te chamar tolo ou
tratante!
Ora olha se escutas bem!
Hein?...
No modo de tratar é mister que
andes
Com mais delicadeza, e com
cuidado:
Olha que já não sou Sêo Zé
Fernandes,
Como sempre até aqui me tens
chamado!
Se não és homem capaz...
Zás!...
E não te queixes! – graças aos
soberanos,
Sou hoje Sêo Barão de cascas
d’alhos:
Já servi, como tu – e há poucos
anos
Que pra sempre deixei esses
trabalhos! –
Inda tu serás barão,
João!
E não te rias! – olha que o
dinheiro
É capaz de fazer virar-se o
mundo!
Não hás de ser barão ou
conselheiro,
Só porque outrora foi carreiro
imundo
Teu pai ou teu avô?...
Bô!...
Não chames a tua ama – Sêra
Aninhas,
Que ela agora é também – Sê
Baronesa;
Se vier a Maria das Soquinhas,
Ou outra minha irmã, Ana Teresa,
“Está cá o meu irmão?”
– Não! –
Que não saiba ninguém que essas
mulheres
São irmãs dum fidalgo tão
distinto;
E previne-as tu lá, como puderes,
Que ouvir delas um – tu – já não
consinto!
Que elas o não saibam já,
Vá!
Carreiros todos são os meus
parentes,
E não sabem tratar com gente
nobre;
Mas quando traga algum roupas decentes,
E tu vejas que à porta se
descobre,
E – “O sêo Barão está cá?”
– Está! –
Sempre à porta estarás – e tem
paciência,
Que para outros serviços te não
chamo:
Darás a toda a gente uma
excelência,
Pra que saibam, assim, que a tem
teu amo;
E se algum se rir de mau,
Pau!...
E quando no portal juntos estejam
À espera de teu amo, alguns
sujeitos;
Embora malcriados eles sejam,
E conversem, notando-me defeitos,
Tu, como quem não ouviu,
Psiu!...
Inda mesmo que algum mais
atrevido
Diga que rico sou por ser tratante,
Que sou por grande parvo
conhecido,
E, por minha conduta degradante,
Na nobreza um labéu,
Chéu!...
Não te esqueças, João, do que te
digo,
Nem faltes ao programa um só
momento;
Bem vês que hoje um Barão é
grande amigo!
E atende a que o teu regulamento,
Sem falta começará
Já!
Se um vosmecê me dás, ou à tua
ama,
Tomando contra ti, por mariola,
Vingança que esse crime atroz
reclama,
Fecho-te... lanço mão duma
pistola,
E sem ter pesar algum,
Pum!...
*Faustino Xavier de Novaes (Porto, 17 de
fevereiro de 1820 - Rio de Janeiro, 16 de agosto
de 1869)
foi um jornalista, poeta e escritor português
radicado no Rio de Janeiro, melhor conhecido como irmão de Carolina Augusta Xavier de Novais,
esposa de Machado de Assis, e amigo do escritor. Foto
abaixo.
Morre Faustino Xavier de Novais a
16 de agosto de 1869, pouco antes do casamento entre Machado e Carolina.
Praticamente quase toda a edição de 29 de agosto da Semana Ilustrada, onde
Joaquim Maria vinha colaborando desde 1860, foi dedicada ao desaparecimento do
poeta, publicando-lhe nota biográfica, algumas de suas poesias e um poema que
Machado de Assis escreveu em sua homenagem. Os dois haviam se conhecido no
Grêmio Literário Português, através de Augusto Emílio Zaluar, e ficaram mais íntimos
durante o convívio na redação da revista O Futuro.
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