(Excerto)
(...) História do marinheiro
irlandês cuja fé religiosa estava prestes a morrer afogada em uísque e que
desembarcou no Rio na noite de 12 de outubro de 1931. Ao descer do navio e
pisar a praça Mauá, ele olhou casualmente para o céu escuro e, de repente, lá
no alto, ao longe, Jesus Cristo surgiu do nada, fosforescente, pairando de pé e
de braços aberto sobre a cidade. Diante daquela visão, o marinheiro quase teve
uma síncope. Era um delírio, ele pensou − o álcool faz ver coisas. Mas podia
ser também um sinal, um aviso de que Deus não se conformava em perder sua alma
para uma destilaria. Correu de volta para o navio, trancou-se no alojamento,
jurou nunca mais beber e entregou-se ao capelão − o qual, se sabia do que se
tratava, não quis desapontar o marujo. Como este poderia acreditar que aquele
Cristo era uma estátua de pedra-sabão, da altura de um prédio de dez andares,
plantada no cocoruto de uma rocha a 704 metros acima do nível do mar e cuja
iluminação estava sendo inaugurada naquele instante? E que a dita iluminação
não tinha nada de sobrenatural, exceto por estar sendo fornecida à distância
por Guglielmo Marconi, o inventor do rádio? Marconi emitira um sinal elétrico a
bordo de seu iate Electra, ancorado
na baía de Nápoles, sinal este captado por uma estação receptora em Dorchester,
na Inglaterra, retransmitido para uma antena no outro lado do Atlântico, em
Jacarepaguá, no Rio, e dali jogado para a estátua no alto do Corcovado − nisso,
sim, é que era difícil de acreditar.
(Do livro “Carnaval
no fogo
– Crônicas de uma cidade excitante demais”
– Crônicas de uma cidade excitante demais”
De Ruy Castro –
Companhia das Letras)
Cristo Redentor,
inauguração.
Cristo Redentor - projeto original
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