Frei Antonio das Chagas foi o nome adotado,
no Convento Franciscano, pelo militar e poeta português Antonio da Fonseca
Soares. Antonio nasceu em Vidigueira, em 25 de Junho de 1631 e faleceu em
Varatojo, em 20 de Outubro de 1682. Passou sua infância e juventude no Alentejo
e estudou no Colégio dos Jesuítas, em Évora, não tendo concluído os estudos devido
à morte do pai. Alistou-se, então, no exército, em plena Guerra da
Restauração, iniciando carreira militar promissora. Envolveu-se nas mais
diversas aventuras, cometendo todo o tipo de excessos, fruto do seu temperamento
impetuoso. Em 1653, com 22 anos de idade, um desses episódios obrigou-o a fugir
para o Brasil, perseguido pela justiça, por ter causado a morte de um rival, em duelo. Passou três
anos na Bahia, sem alterar o seu modo de vida irreverente. De regresso a
Portugal,em 1656, voltou a participar, ativamente, na guerra.
Foi promovido a capitão, em Setúbal,
como reconhecimento pelo seu valor. Em Maio de 1662, com 31 anos de idade,
renunciou à vida militar e abraçou os votos monásticos, na Ordem de São
Francisco, em Évora. Desde então, Antonio da Fonseca Soares passou a ser Frei
Antonio das Chagas. Dedicou o resto da sua vida ao evangelho e a pregar a fé,
com o ardor e a paixão que o caracterizavam. Escreveu nos mais diversos gêneros
poéticos: sonetos, madrigais, romances, décimas, glosas e dois poemas heróicos –
Mourão Restaurado e Canto Panegírico à Vitória de Elvas. Ficou conhecido por um
de seus sonetos mais famosos, aqui reproduzido:
Conta e Tempo
Frei Antonio das Chagas (1631-1682)
Deus pede hoje estrita conta do
meu tempo.
E eu vou, do meu tempo dar-Lhe conta.
Mas como dar, sem tempo, tanta conta.
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para ter minha conta feita a tempo
O tempo me foi dado e não fiz conta.
Não quis, tendo tempo fazer conta,
Hoje quero fazer conta e não há tempo.
Oh! vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passa-tempo.
Cuidai, enquanto é tempo em vossa conta.
Pois aqueles que sem conta gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Chorarão, como eu, o não ter tempo.
E eu vou, do meu tempo dar-Lhe conta.
Mas como dar, sem tempo, tanta conta.
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para ter minha conta feita a tempo
O tempo me foi dado e não fiz conta.
Não quis, tendo tempo fazer conta,
Hoje quero fazer conta e não há tempo.
Oh! vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passa-tempo.
Cuidai, enquanto é tempo em vossa conta.
Pois aqueles que sem conta gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Chorarão, como eu, o não ter tempo.
(O Sul de Minas)
O poeta
carioca Laurindo Rabelo (1826-1864) readaptou o poema por volta de 1850.
O tempo
Deus pede estrita conta de meu tempo,
É forçoso do tempo já dar conta;
Mas, como dar sem tempo tanta conta,
Eu que gastei sem conta tanto tempo?
Para ter minha conta feita a tempo
Dado me foi bem tempo e não fiz conta.
Não quis sobrando tempo fazer conta,
Quero hoje fazer conta e falta tempo.
Oh! vós que tendes tempo sem ter conta
Não gasteis esse tempo em passatempo:
Cuidai enquanto é tempo em fazer conta.
Mas, oh! se os que contam com seu tempo
Fizessem desse tempo alguma conta,
Não choravam como eu, o não ter tempo.
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