Renê Barreto*
*Renê Barreto - Prosador e poeta
brasileiro. Poeta bissexto, isto é, poeta que apesar da escassa produção se
celebrizou por um único poema: O Velho Professor.
Andava muito doente o velho
professor...
Por isso, ele não tinha agora o
mesmo ardor,
que outrora o possuía e que o
animava dantes.
Às vezes, quando em aula, havia
mesmo instantes
em que inclinava a fronte (aquela
fronte austera
onde já desbotara a flor da
primavera)
e cochilava um pouco,
involuntariamente.
O velho professor andava muito
doente.
Era, porém, tamanho o bem que nos
queria
Que jamais quis pedir
aposentadoria
e manter-se do Estado, à custa
dessa esmola.
Era sempre o primeiro a aparecer,
na escola,
com joviais maneiras, tão
simpáticas,
não obstante sentir umas dores
tão reumáticas
que o faziam sofrer, ultimamente.
O velho professor andava muito doente...
Um dia ele chegou mais tarde,
alguns momentos.
Trazia nas feições sinais de
sofrimentos...
A palidez do rosto, os olhos
encovados
denunciavam seus pesares
ignorados.
E, como para tomar a dor mais
manifesta.
cavara-se-lhe fundo uma ruga na
testa.
Franzia-lhe o rosto uma expressão
de dor.
Andava muito doente o velho
professor.
A aula começou. Mas, pouco depois
das onze,
o velho mestre, o bom trabalhador
de bronze,
(que já perto de trinta anos ou
mais, havia
que – gigantesco herói – lutava
dia a dia,
para a glória da pátria e para o
bem da infância,
dando batalha ao vício e combate
à ignorância.)
sentindo de uma dor os agudos
abrolhos,
curvou as nobres cãs, cerrou de
leve os olhos.
Fora, fulgia o sol. A manhã era
calma.
Sorrindo, a natureza abria a sua alma
repleta de alegrias e cheia de esplendores.
Pela janela aberta, entrava o hálito das flores;
em toda a atmosfera azul lavada, fina,
ressoava baixinho, assim como em surdina,
um canto celestial, harmonioso e suave,
anjos tocando, em harpa, alguma canção de ave.
Nisto ergueu-se um aluno, um pândego, um peralta,
fabricou de um jornal um chapéu de copa alta.
e bem devagarinho (oh! que ideia travessa)
chegou-se ao mestre... zás! enfiou-lhe na cabeça.
E rápido se foi de novo ao seu lugar.
O mestre nem abriu o sonolento olhar.
E àquele aspecto vil de truão, de improviso,
rebentou pela aula estardalhante riso.
Sorrindo, a natureza abria a sua alma
repleta de alegrias e cheia de esplendores.
Pela janela aberta, entrava o hálito das flores;
em toda a atmosfera azul lavada, fina,
ressoava baixinho, assim como em surdina,
um canto celestial, harmonioso e suave,
anjos tocando, em harpa, alguma canção de ave.
Nisto ergueu-se um aluno, um pândego, um peralta,
fabricou de um jornal um chapéu de copa alta.
e bem devagarinho (oh! que ideia travessa)
chegou-se ao mestre... zás! enfiou-lhe na cabeça.
E rápido se foi de novo ao seu lugar.
O mestre nem abriu o sonolento olhar.
E àquele aspecto vil de truão, de improviso,
rebentou pela aula estardalhante riso.
De súbito, surgiu o diretor, na
aula...
Demudou-se-lhe o gesto, estremeceu a fala.
quando ele, transformando a sua mansidão de boi
em fúria de leão, nos perguntou: “Quem foi?”
“Quem foi esse vilão que fez tal brejeirice,
“sem respeito nenhum às cãs desta velhice?
“Vamos lá! Sede leais, verdadeiros e francos.
“dizei: quem ofendeu estes cabelos brancos?”
Demudou-se-lhe o gesto, estremeceu a fala.
quando ele, transformando a sua mansidão de boi
em fúria de leão, nos perguntou: “Quem foi?”
“Quem foi esse vilão que fez tal brejeirice,
“sem respeito nenhum às cãs desta velhice?
“Vamos lá! Sede leais, verdadeiros e francos.
“dizei: quem ofendeu estes cabelos brancos?”
Mas ninguém denunciou da brincadeira o autor!
Como um truão dormia o velho professor!
O diretor, então, chegou-se junto à mesa...
Via-se-lhe no rosto, o incômodo, a surpresa,
de que o sono do mestre assim se prolongasse.
Curvou-se meigamente e levantou-se a face.
Mas recuou tremendo, aterrado, absorto,
aniquilado e mudo... O Mestre estava morto.
*****
P.S. O inspetor René de Oliveira
Barreto, foi parceiro de xadrez (o jogo) de Malba Tahan, famoso professor de Matemática,
quando este tinha 11 anos de idade, era formado na Escola Modelo Caetano de
Campos-SP e autor de livros sobre o uso de materiais concretos em aulas de
aritmética e geometria, método chamado “intuitivo” (1912, 1915).
Amei.pena que foi tarde.Quando me deitei para dormir,pensando no dia do professor lembrei-me desta linda poesia que declamava na escola e sempre quando me pediam. O tempo foi passando e mudando os pedidos,Agora só eu não esqueci.Já com 80 anos lembrei-me da poesia.Saí da cama e procurei na internet e recordei-me da poesia inteirinha.Estou muito contente, qualquer hora vou declama-la sem que me peçam. Obrigada.Muita gente nunca ouviu.
ResponderExcluirMuito obrigado pelo seu comentário e pela sua emoção. Também sou professor e coloquei neste meu Blog todos os textos que já me emocionaram e fazem as pessoas felizes. (Nilo da Silva Moraes)
ResponderExcluirAmei minha profissão antes de conhecê-la.Amei meus alunos e muito fui feliz porque fui recompensado, não pelo Estado, mas pelo próprio Aluno.
ResponderExcluirProf. Roberval, tive, como professor, os mesmos sentimentos que o senhor sentiu. O sucesso dos aluno é, também, o nosso sucesso profissional.
ResponderExcluirTbm a tenho guardada em minha memória. Declamei- a uma unica vez, já no ginasial. Mas é muito forte, ficou entranhada. Há mais de 40 anos... Obrigada, pela bela lembrança!
ResponderExcluirEsse cara aí era meu bisavô. Morreu jovem. A minha bisavó sustentou os filhos com a venda da cartilha que escrevia, Corações de criança
ResponderExcluirMuito bonito, boas lembranças..
ResponderExcluirVou dazer uma apresentação em mi ha sala se pedagogia, desse poema que minha saudosa irmã Nilza de Assis sempre declamava.
ResponderExcluirTbem recitei essa poesia, nos meus 6 anos na escola Quinzinho de Barros, Sorocaba, muito linda, lembrança maravilhosa marcou demais,
ResponderExcluirRecitei na década de 70❤
ResponderExcluirE eu, também como um velho professor, sinto a mesma emoção ao ler esse conhecido poema.
ExcluirLinda, comovente...
ResponderExcluirEsse texto é uma singela homenagem a todos os velhos professores deste país, que honram a sua profissão.
ExcluirMuito comovente
ResponderExcluirTexto antigo e sempre atual!
ExcluirMinha mãe nos declama essa poesia desde crianças, e hoje com 80 anos e problemas de memória, eu perguntei a ela se lembrava ainda do Velho Mestre e ela disse claro que sim... até gravei a vozinha dela...
ResponderExcluirAmiga Carla, guarde bem essa gravação de sua avozinha, ela será uma bela recordação de um pessoa querida da família.
ResponderExcluirAh Sim, com certeza, estamos fazendo até um diário das lembranças dela. É muito triste perder a memória, e pra ela ver que as lembranças antigas permanecem, é uma vitória. Ela ainda recita poesias maiores ainda que essa, desde os anos 50.
ExcluirBeleza!
ExcluirRecitei esta poesia nos anos 60, sendo vencedora de um concurso. Desde então procurava por ela, e aqui está! Resgatei um dia feliz da minha vida! Gratidão!
ResponderExcluirArquive-a e guarde as palavras desse poema no seu coração.
ResponderExcluirEu Adenir B Zaratin chorei emocionada. Declamei esta maravilhosa Poesia qdo tinha 11 anos na Escola e fu aplaududa de pé....Hoje estou com 70 anos.Gratidão meu Deus.
ResponderExcluirAmiga Adenir, entendo perfeitamente a tua emoção, o texto arrepia tanto alunos como professores.
ResponderExcluirLindo e emocionante poema!
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