Olavo Bilac
(1865 - 1918)
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”,
Eem que Camões
chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
E
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
Glossário:
Ganga: resíduo em geral não aproveitável
Clangor: som rijo e estridente.
Trom: estrondo produzido por tiros de artilharia.
Silvo: qualquer som agudo e prolongado
Procela: tempestade marítima.
Arrolo: canto, acalanto.
E por que Última flor do Lácio?
A expressão “Última flor do Lácio”,
significa que a Língua Portuguesa foi a última língua a ser derivada do Latim
vulgar, falado no Lácio, uma região italiana. O Italiano, seguramente, foi uma
das primeiras, como francês, o espanhol, o catalão, o romeno, o sardo, o
galego... mas a última, seguramente, ou uma das últimas, foi a Língua
Portuguesa. Por isso, o poeta Olavo Bilac a colocou neste verso: Última flor do Lácio, inculta e bela,.
As línguas
latinas (também chamadas de românicas ou neolatinas) são aquelas que derivaram
do Latim, sendo as mais faladas: Francês, Espanhol, Italiano e Português.
O termo "inculta" usado
pelo poeta, se refere ao Latim Vulgar falado por soldados, camponeses e camadas
populares. Era diferente do Latim Clássico, empregado pelas classes superiores.
Para Olavo Bilac, a Língua Portuguesa continuava a ser "bela", mesmo
sendo originada de uma linguagem popular.
Análise do poema "Língua Portuguesa
Por Paula Perin dos Santos
No poema Língua Portuguesa, o autor parnasiano
Olavo Bilac faz
uma abordagem sobre o histórico da língua portuguesa, tema já tratado por
Camões. Este poema inspirou outras abordagens, como o poema “Língua”, de
Gilberto Mendonça e “Língua Portuguesa”, de Caetano Veloso.
Esta história é contada em catorze
versos, distribuídos em dois quartetos e dois tercetos – um soneto –
seguindo as normas clássicas da pontuação e da rima.
Partindo para uma análise semântica
do texto literário, observa-se que o poeta, com a metáfora “Última flor do
Lácio, inculta e bela”, refere-se ao fato de que a língua portuguesa ter sido a
última língua neolatina formada a partir do latim vulgar – falado pelos
soldados da região italiana do Lácio.
No segundo verso, há um paradoxo: “És a um
tempo, esplendor e sepultura”. “Esplendor”, porque uma nova língua estava
ascendendo, dando continuidade ao latim. “Sepultura” porque, a partir do
momento em que a língua portuguesa vai sendo usada e se expandindo, o latim vai
caindo em desuso, “morrendo”.
No terceiro e quarto verso, “Ouro
nativo, que na ganga impura / A bruta mina entre os cascalhos vela”, o poeta
exalta a língua que ainda não foi lapidada pela fala, em comparação às outras
também formadas a partir do latim.
O poeta enfatiza a beleza da língua
em suas diversas expressões: oratórias, canções de ninar, emoções, orações e
louvores: “Amo-te assim, desconhecida e obscura,/ Tuba de alto clangor, lira
singela”. Ao fazer uso da expressão “O teu aroma/ de virgens cegas e oceano
largo”, o autor aponta a relação subjetiva entre o idioma novo, recém-criado, e
o “cheiro agradável das virgens selvas”, caracterizando as florestas
brasileiras ainda não exploradas pelo homem branco. Ele manifesta a maneira
pela qual a língua foi trazida ao Brasil – através do oceano, numa longa viagem
de caravela – quando encerra o segundo verso do terceto.
Ainda expressando o seu amor pelo
idioma, agora através de um vocativo, “Amo-te, ó rude e doloroso idioma”, Olavo
Bilac alude ao fato de que o idioma ainda precisava ser moldado e, impor essa
língua a outros povos não era um tarefa fácil, pois implicou em destruir a
cultura de outros povos.
No último terceto, para finalizar,
quando o autor diz: “Em que da voz materna ouvi: “meu filho!/ E em que Camões chorou, no
exílio amargo/ O gênio sem ventura e o amor sem brilho”, ele utiliza uma
expressão fora da norma (“meu filho”) e refere-se a Camões, quem consolidou a
língua portuguesa no seu célebre livro “Os Lusíadas”, uma epopeia que conta os
feitos grandiosos dos portugueses durante as “grandes navegações”, produzida
quando esteve exilado, aos 17 anos, nas colônias portuguesas da África e da
Ásia. Nesse exílio, nasceu “Os Lusíadas”, uma das oitavas epopeias do mundo.
(Do Blog InfoEscola)
Luís de Camões
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