E tudo começou com um encontro insólito...
Foi um artigo sobre discos voadores,
publicado por Paulo Coelho na revista A
Pomba, em 1973, que levou Raul seixas a conhecê-lo, embora, em entrevista
ao Pasquim, ele tenha emprestado a
esse encontro uma versão bem menos prosaica: “Eu conheci o Paulo Coelho na
Barra da Tijuca, num dia em que eu tava lá. Às cinco horas da tarde eu tava
meditando. Paulo também tava lá meditando, mas eu não o conhecia. Foi o dia em
que nós vimos um disco voador. Enorme, rapaz, um negócio muito bonito.” De um
jeito ou de outro, o fato é que ainda em 1973 Raul e Paulo assinariam juntos
metade das músicas do disco Krug-Ha Bandolo e, um ano depois, a canção “Gita”,
de grande sucesso, além de outras sete do elepê homônimo. Produto assim da
parceria de um roqueiro extravagante com um futuro autor de bes-sellers
esotéricos, “Gita” inspira-se na “Bhagavad-Gita” (“A Canção do Senhor”), que
faz parte do Mahabharata e é
considerado o mais importante texto sagrado do Hinduismo. O poema milenar trata
de um diálogo do Senhor (Krishna) com o guerreiro Arjuna que – num momento de
desespero por ter de combater seus próprios irmãos – o interpela sobre sua
existência divina. Vem daí o tema da canção, desenvolvido em dezenas de versos
afirmativos: “Eu sou a luz das estrelas / eu sou a cor do luar / eu sou as
coisas da vida / eu sou o medo de amar / (...) / eu sou, eu fui, eu vou /
(Gita, Gita, Gita, Gita, Gita). A composição é cantada por Raul de forma
vigorosa, em tempo de rock, sustentada por um arranjo que procura criar um
clima de mística suntuosidade. O sucesso de “Gita” proporcionou ao Maluco
Beleza o seu primeiro disco de ouro. Anos depois, ele a relançou em inglês com
o título de “I am”.
Do livro “A Canção no
Tempo – 85 anos de Músicas Brasileiras”,
de Jairo Severiano e
Zuza Homem de Mello
Volume 2: 1958-1985
Raul Seixas por J. Bosco
Gita
Raul Seixas
e Paulo Coelho
Eu que já andei pelos quatro
cantos do mundo procurando,
foi justamente num sonho que Ele
me falou:
Às vezes você me pergunta
Por que é que eu sou tão calado?
Não falo de amor quase nada,
Nem fico sorrindo ao teu lado.
Por que é que eu sou tão calado?
Não falo de amor quase nada,
Nem fico sorrindo ao teu lado.
Você pensa em mim toda hora,
Me come, me cospe, me deixa.
Talvez você não entenda,
Mas hoje eu vou lhe mostrar:
Me come, me cospe, me deixa.
Talvez você não entenda,
Mas hoje eu vou lhe mostrar:
Eu sou a luz das estrelas,
Eu sou a cor do luar,
Eu sou as coisas da vida,
Eu sou o medo de amar,
Eu sou a cor do luar,
Eu sou as coisas da vida,
Eu sou o medo de amar,
Eu sou o medo do fraco,
A força da imaginação,
O blefe do jogador,
Eu sou, eu fui, eu vou.
A força da imaginação,
O blefe do jogador,
Eu sou, eu fui, eu vou.
Gita! Gita! Gita! Gita! Gita!
Eu sou o seu sacrifício,
A placa de contra-mão,
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição.
A placa de contra-mão,
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição.
Eu sou a vela que acende,
Eu sou a luz que se apaga,
Eu sou a beira do abismo,
Eu sou o tudo e o nada.
Eu sou a luz que se apaga,
Eu sou a beira do abismo,
Eu sou o tudo e o nada.
Por que você me pergunta,
Perguntas não vão lhe mostrar,
Que eu sou feito da terra,
Do fogo, da água e do ar.
Você me tem todo dia,
Mas não sabe se é bom ou ruim,
Mas saiba que eu estou em você,
Mas você não está em mim.
Das telhas, eu sou o telhado;
A pesca do pescador,
A letra A tem meu nome,
Dos sonhos eu sou o amor.
Eu sou a dona de casa,
Nos pegue-pagues do mundo.
Eu sou a mão do carrasco,
Sou raso, largo, profundo.
Perguntas não vão lhe mostrar,
Que eu sou feito da terra,
Do fogo, da água e do ar.
Você me tem todo dia,
Mas não sabe se é bom ou ruim,
Mas saiba que eu estou em você,
Mas você não está em mim.
Das telhas, eu sou o telhado;
A pesca do pescador,
A letra A tem meu nome,
Dos sonhos eu sou o amor.
Eu sou a dona de casa,
Nos pegue-pagues do mundo.
Eu sou a mão do carrasco,
Sou raso, largo, profundo.
Gita! Gita! Gita! Gita! Gita!
Eu sou a mosca da sopa
E o dente do tubarão.
Eu sou os olhos do cego
E a cegueira da visão.
Mas eu sou o amargo da língua,
A mãe, o pai e o avô.
O filho que ainda não veio,
O início, o fim e o meio.
Eu sou o início, o fim e o meio.
Eu sou a mosca da sopa
E o dente do tubarão.
Eu sou os olhos do cego
E a cegueira da visão.
Mas eu sou o amargo da língua,
A mãe, o pai e o avô.
O filho que ainda não veio,
O início, o fim e o meio.
Eu sou o início, o fim e o meio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário