17 de março de 2011
Eis uma de minhas
melhores colunas já publicadas:
“Quando eu morrer, quero à beira da sepultura todos os meus amigos e
alguns dos meus inimigos arrependidos. Depois dos risos e lágrimas, voltem para
casa e nunca mais se esqueçam de mim”.
Paulo Sant´Ana
(15.06.1939 ‒ 19.07.2017)
Tenho amigos que não sabem o quanto
são meus amigos! Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade
que tenho deles… Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido
todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos! Até
mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida
depende de suas existências…
A alguns
deles não procuro, basta-me saber que eles existem.
Essa mera condição me encoraja a
seguir em frente pela vida. Porque não os procuro com assiduidade, não posso
lhes dizer o quanto gosto deles!
Eles não iriam acreditar! Muitos
deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada
relação dos meus amigos, mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro,
embora não o declare e não os procure.
Às vezes, quando os procuro, noto que
eles não têm noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao
meu equilíbrio vital, porque fazem parte do mundo que eu, tremulamente,
construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.
Se um deles morrer, eu ficarei torto
para um lado. Se todos morrerem, eu desabo! Por isso é que, sem que eles
saibam, eu rezo pela vida deles e me envergonho porque essa minha prece é, em
síntese, dirigida ao meu bem-estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.
Por vezes, mergulho em pensamento
sobre alguns deles. Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me
alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer… Se
alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me
permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo, falando comigo,
vivendo comigo, todos os meus amigos e, principalmente, os que só desconfiam ou
talvez nunca vão saber que são meus verdadeiros amigos!!!
A gente não
faz amigos, reconhece-os!
*****
Paulo Sant´Ana – um polêmico jornalista gaúcho
Formado em direito,
foi inspetor e delegado da Polícia Civil,
entre 1973 e 1988, o que lhe proporcionou o seu primeiro contato com a
imprensa. Sendo um torcedor gremista fanático, ganhou fama como personagem da
torcida presente no Estádio Olímpico. Assim nasceu a sua primeira atividade
como comunicador desportivo, pois foi convidado a participar do programa
Conversa de Arquibancada, da TV Piratini, retransmissora da TV Tupi no Rio
Grande do Sul. A seguir, entrou no programa Sala de Redação, da Rádio Gaúcha,
no começo da década de 1970. Em 1971, começou a escrever uma coluna esportiva
no jornal Zero Hora,
na qual permaneceu até 2014. Em 1972, passou a integrar os quadros da Rádio
Gaúcha e depois iniciou a sua carreira como colunista do programa da RBS Jornal do Almoço, do qual era um dos membros
mais antigos e o único dos pioneiros ainda em atividade. Escreveu
apenas sobre futebol até 1989, quando ocupou a vaga deixada por Carlos Nobre
como colunista de assuntos gerais na Zero Hora. Sant'Ana foi colunista diário
do jornal entre 1971
e 2014.
A partir de dezembro de 2014, passou a escrever uma coluna semanal, aos
domingos.
Ele também foi vereador
do município
de Porto Alegre
por três legislaturas: as duas primeiras (1973/1977 e 1978/1983) pela ARENA, partido de
sustentação da Ditadura Militar; e a
última (1984/1988) pelo PMDB. Em 2002, recebeu o título de Cidadão Emérito de Porto
Alegre, proposto pelo seu ex-colega de partido, João Antônio Dib. Sant'Ana foi
homenageado pela escola de samba Acadêmicos da Orgia, em 1993, com o enredo: O
Menestrel da Cultura Popular, Francisco Paulo Sant'Ana. Costumava comentar ao
vivo em transmissões de jogos importantes do Grêmio, como nas finais da
Copa Libertadores da América de 1995 e 2007, na Rádio Gaúcha. O
cronista considerava-se viciado em cigarro
e foi diagnosticado com um câncer de rinofaringe. No dia 10 de novembro de 2014, foi
afastado do programa de rádio Sala de Redação, após discutir no ar com outro integrante
do programa, Kenny Braga.
Paulo Sant'Ana morreu em 19 de julho
de 2017, aos 78 anos de idade. Ele estava internado no Hospital Moinhos de Vento, em Porto Alegre. A
causa da morte anunciada foi parada cardíaca. Jayme Sirotsky, presidente
emérito do Grupo RBS, relatou assim a morte do jornalista: “Nos 60 anos da RBS,
muitos companheiros passaram por aqui, cada um deles oferecendo sua
contribuição para a empresa e, especialmente, para o público. Entre todos,
Paulo Sant´Ana se destaca fortemente. Quem não teve, nos últimos 45 anos,
momentos de admiração, antagonismo e de discordância com essa figura incomum
que ele foi? Sant´Ana escreveu sua história profissional dentro da RBS,
conquistando um público que lhe foi cativo durante toda a sua jornada. Deixa
inúmeras lições de competência e muita saudade”.
Paulo Sant´Ana por Edu
O lamento do coração
Paulo Sant´Ana
Não pode mais o coração viver assim desesperado.
Não pode mais o coração restar assim dilacerado.
Não deve mais o coração pulsar assim descompassado.
Nem deve mais o coração gritar depois abandonado.
Não pode mais a ilusão cair de novo ludibriada.
Nem pode mais a ilusão se ver mais uma vez desanimada.
Não suporta mais a tentação, de ser feliz, ser outra vez
desperdiçada.
Nem deve mais a tentação, essa aprendiz, tocar na dor
despedaçada.
Deixem-se estar quieta e calmo a alma e o coração, que de
sofrer já estão sobrados.
E nem se agitem mais a alma e o coração com o aceno de
míseros trocados.
Respeitem enfim a alma e o coração, que de ir morrendo aos
poucos já estão quase inanimados.
Que ninguém se atreva a acenar
com a alegria,
que esta melancolia perpétua não permite mais que ela viceje.
que esta melancolia perpétua não permite mais que ela viceje.
E não me venham mais com a lorota
da ventura, que se algum fiapo de saúde ainda me resta é absolutamente certo
que me vem desta tristeza.
É completamente indispensável que
passem todos ao largo desta minha desolação, se possível só com alguma reverência,
brotada na compaixão, respeitando este período longo e arrastado do meu fim.
Que pelo menos permitam que uma
paz aliviada ronde de longe este crepúsculo estremunhado.
Não pode mais o coração, não deve
mais o coração deixar-se atrair pelas vãs promessas de que vão emergi-lo desta
brutal, mas até que assim, finalmente, bem-vindas solidão.
Não pode mais a solidão ser outra
vez transfigurada.
A solidão é a única parceira fiel
e autenticada.
Não pode mais o coração ceder a
outra empreitada.
Não soe mais o cantochão das
ofertas malogradas.
Nada mais há que anime a alma e o
coração.
Cumpre apenas que repousem na
exígua paz final que quem sabe pode ainda sobrevir a todas as ânsias
malbaratadas.
Deixem agora a alma e o coração
velarem-se na luz quebradiça do desânimo, último direito dos intentos
fracassados.
Não pode mais o coração correr
atrás do séqüito de esperanças infundadas.
O que só agora pode o coração é
lamentar os inúteis sonhos desvairados.
(Publicada em 25 de
abril de 2010)
Paulo Sant´Ana por
Gabriel Renner
E depois que meu corpo fosse coberto de terra, não seria demais pedir que algum amigo recitasse Augustos do Anjos:
"E saí para ver a Natureza,
Em tudo o mesmo abismo de beleza,
Nem uma árvores no estrelado véu,
Mas apareceu-me entre as estrela flóreas,
Como Elias num carro azul de glórias,
Ver a alma de Pablo* subindo aos céus".
*Pablo como Paulo Sant´Ana se autodenominava.
O ciúme
Guilherme de Almeida
(Um dos poemas
prediletos de Paulo Sant´Ana)
Minha melhor lembrança é esse
instante no qual
pela primeira vez me entrou pela
retina
tua silhueta provocante e fina
como um punhal.
Depois passaste a ser unicamente
aquela
que a gente se habitua a achar
apenas bela
e que é quase banal.
E agora, que te tenho em minhas
mãos, e sei
que os teus nervos se enfeixam
todos em meus dedos,
e os teus sentidos são cinco
brinquedos,
com que brinquei;
agora que não mais me és inédita;
agora
Que compreendo que, tal como te
vira outrora,
nunca mais te verei;
agora que, de ti, por muito que
me dês,
já não me podes dar a impressão
que me deste,
a primeira impressão que me
fizeste
– louco talvez,
tenho ciúme de quem não te
conhece ainda
e, cedo ou tarde, te verá, pálida
e linda,
pela primeira vez!
Chega ser emocionante , tal a maneira que relata em suas crônicas, o meu pensamento o seu pensamento os nossos pensamentos, essa em especial deveria ser lida diariamente,amigos são sempre especias.
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