Getúlio Vargas no
Palácio do Catete
A Revolução de 1930 foi uma armação
mineira que contou com a participação da Paraíba e o comando dos gaúchos. Os
paulistas, até hoje, guardam algum ressentimento por termos acabado com a
hegemonia deles na política nacional. Passados 80 anos* da Revolução de 1930, a mídia nacional
ignorou o fato por razões que a razão desconhece. Felizmente, três escritores
gaúchos resolveram revirar nosso passado mais glorioso: o imortal Moacyr Scliar,
com o romance “Eu Vos Abraço, Milhões” (Companhia das Letras), eu mesmo,
mortalzinho da silva, com “1930: Águas da Revolução” (Record) e Sinval Medina,
com “A Batalha de Porto Alegre” (Martins Livreiro). Maravilha.
Sinval Medina, romancista premiado,
produziu o que chamou de “reportagem histórica”. Um belo livro sobre o 3 de
outubro de 1930 em
Porto Alegre. O texto é límpido, elegante e fluente. A
história aparece humanizada e muito real. O autor pesquisou a bibliografia e a
imprensa da época. Bebeu também no que lhe foi contado em outros tempos por seu
pai, Sinval Coutinho Medina, um ourives que viveu o “inesquecível 3 de outubro”.
Assim se faz a história, remexendo nos arquivos e no baú das nossas melhores
memórias. Sinval Medina vive há décadas em São Paulo. Sabe
que os paulistas comemoram o 9 de julho, data da Contrarrevolução de 1932, com
entusiasmo. Nesse sentido, se parecem com os gaúchos, embora em grau menor, que
também festejam uma revolução perdida. Não importa. A questão ainda é: por que
não comemoramos o 3 de outubro?
Há excelentes passagens literárias em
“A Batalha de Porto Alegre”: “Para chegar à ponte da Azenha e prosseguir no
rumo de casa, o jovem Sinval Medina precisava atravessar a Rua Venâncio Aires,
pela qual tropas da Brigada Militar avançavam contra a Companhia de
Estabelecimentos. Os tiros disparados pelos defensores do quartel varriam a
rua. Agachado junto às portas cerradas do Cine Avenida, pensou em voltar à
administração da Carta Geral, onde certamente ficaria em segurança. Mas e os
pais, em casa, esperando por ele? Precisava seguir em frente. Respirou
fundo, posicionou-se com o joelho esquerdo flexionado e a perna direita para
trás, como numa largada de cem metros rasos, respirou fundo e partiu. A corrida
o levou até a esquina da Rua Lobo da Costa, onde uma vez mais foi obrigado a
parar devido ao tiroteio". Que belo encontro entre memória e história!
Outra passagem comovente é esta: “Por
volta das cinco da tarde, o aprendiz de ourives Sinval Medina ainda circulava
entre a multidão que se comprimia na Praça da Alfândega. Sentimentos
contraditórios o dominavam. Sentia que algo muito sério estava para acontecer.
Queria ver como aquilo tudo terminaria. De outro lado, pensava no sofrimento
que causaria à mãe -
era filho único -
se não estivesse com ela no momento do estouro da Revolução”. A narrativa do
retorno do rapaz, a pé, para casa, situada entre a Azenha e o Menino Deus, dá o
tempero do livro. Aquele 3 de outubro mudou Porto Alegre. E o Brasil. Nunca se
apagou do imaginário dos Medina. O pai legou ao filho uma herança de valor
incomensurável: suas lembranças.
Juremir Machado da
Silva:
juremir@correiodopovo.com.br
juremir@correiodopovo.com.br
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