Stephen Leacock
‒ Agora, senhoras e senhores ‒ disse
o mágico ‒, tendo-lhes mostrado que este pano está absolutamente vazio, passo a
retirar dele um aquário de peixes dourados. Pronto!
Em torno
dele, a assistência comentava:
Mas o Homem Sabido da cadeira da
frente disse, num cochicho audível, às pessoas ao lado:
- Ele
o tinha escondido na manga.
Então a assistência fez ao Homem
Sabido, com a cabeça, um sinal de concordância inteligente, e disse:
- Claro!
- Ele o tinha escondido na
manga.
E todos cochicharam pelo salão:
- Agora, a minha mágica -
disse o prestidigitador - são as famosas argolas hindustânicas. Observem que as
argolas estão, evidentemente, separadas; um sopro, e ei-las juntas (tlim, tlim,
tlim)... Presto!
Houve um
murmúrio geral de estupefação, até que se ouviu o Homem Sabido murmurar:
Outra vez todos concordaram com
a cabeça, e cochicharam:
O semblante do mágico anuviou-se, com um
franzir de sobrancelhas.
- Agora -
continuou -
vou-lhes mostrar uma mágica bem divertida, que me permite retirar de um chapéu
qualquer quantidade de ovos. Um dos cavalheiros aqui presentes poderia ter a
gentileza de emprestar-me o seu chapéu? Ah, muito obrigado... Presto!
Extraiu dezessete ovos, e durante
trinta e cinco segundos a assistência começou a pensar que ele era maravilhoso.
E então o Homem Sabido cochichou pelo banco da frente:
- Ele tem uma galinha
escondida na manga.
- Ele tem uma porção de
galinhas escondidas na manga.
E todo mundo cochichou adiante
a novidade:
A mágica dos ovos foi um
desastre.
E o espetáculo continuou mais ou menos
assim. Pelos cochichos do Homem Sabido, percebeu-se que o mágico devia ter
escondido na manga, além das argolinhas e peixes, diversos baralhos, um pão, um
berço de boneca, um porquinho-da-índia vivo, uma moeda de cinquenta centavos e
uma cadeira de balanço.
A reputação do mágico descera
rapidamente abaixo de zero. Pelo fim da noite, ele reanimou-se para um esforço
final:
- Minhas senhoras e meus
senhores, para terminar, apresentarei uma formosa mágica japonesa, recentemente
inventada pelos habitantes de Tipperary. O cavalheiro aí -
continuou, dirigindo-se ao Homem Sabido -, o cavalheiro quer ter a
bondade de entregar-me o seu relógio de ouro?
O relógio
foi-lhe entregue.
- O
cavalheiro me autoriza a colocá-lo neste almofariz e a despedaçá-lo? -
perguntou, fulo de raiva.
O Homem Sabido disse que sim
com a cabeça, e sorriu.
O mágico atirou o relógio no
almofariz e agarrou um malho que se achava em cima da mesa. Ouviu-se um barulho
de algo esmagado com violência.
- Ele
o escondeu na manga -
cochichou o Homem Sabido.
- Agora, cavalheiro —
continuou o mágico -,
permite-me tomar o seu lenço e esburacá-lo? Obrigado. Vejam, senhoras e
senhores, não há engano possível; todos estão vendo os buracos.
O Homem
Sabido estava radiante. Desta vez o mistério real da coisa fascinava-o.
- E agora, cavalheiro, quer
ter a bondade de passar-me o seu chapéu de seda e permitir-me dançar em cima
dele? Obrigado.
O mágico fez alguns passes rápidos,
desta vez com os pés, e exibiu o chapéu, irreconhecível de tão amassado.
- E agora, cavalheiro, quer
ter a bondade de retirar seu colarinho de celuloide e permitir-me queimá-lo com
a vela? Obrigado, cavalheiro. E permite-me espatifar os seus óculos com o meu
martelo? Obrigado.
Por essas alturas, as feições do
Homem Sabido estavam tomando uma expressão de perplexidade.
- Não compreendo este
negócio -
cochichou. -
Não consigo entendê-lo nem um pouquinho.
Fez-se grande silêncio no
auditório. Então o mágico se empertigou em toda a sua estatura e, com um olhar
fulminante para o Homem Sabido, concluiu:
- Senhoras e senhores,
queiram observar que, com a permissão deste cavalheiro, quebrei-lhe o relógio,
queimei-lhe o colarinho, espatifei-lhe os óculos e dancei-lhe em cima do
chapéu. Se ele me permitir ainda pintar-lhe o sobretudo de listras verdes e
dar-lhe um nó nos suspensórios, ficarei encantado em poder divertir os meus
espectadores. Caso contrário, está terminado o espetáculo.
Envolto numa explosão de música da
orquestra, caiu o pano e a assistência dispersou-se, convencida de que há
algumas mágicas, pelo menos, que não dependem da manga do mágico.
(Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira e Paulo Rónai,
Mar de histórias –
Nova Fronteira, vol. 8, p. 280)
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