quarta-feira, 21 de maio de 2014

As rosas não falam



Cartola, sentado, e Dona Zica na janela,
com a roseira florida, na sua casa em Mangueira.

A história de “As Rosas Não Falam” começou numa tarde de 1975 em que o compositor Nuno Veloso apanhou Cartola e sua mulher Zica para um passeio na Barra da Tijuca, onde pretendia visitar Baden Powell. Não tendo encontrado a casa do violonista, Nuno resolveu aproveitar a viagem para passar numa floricultura e comprar para Zica umas mudas de roseira que lhe havia prometido.

Tempos depois, flores desabrochadas dessas roseiras provocariam a indagação entusiástica de Zica: “Como é possível, Cartola, tantas rosas assim?” - e a resposta desinteressada de Cartola: “Não sei. As rosas não falam...”, que ele acabaria aproveitando como mote para a canção: “Queixo-me às rosas / mas que bobagem, as rosas não falam! Simplesmente as rosas exalam / o perfume que roubam de ti...” Composta quando o autor completava 67 anos, “As Rosas Não Falam” foi lançada em 1976, num elepê notável, produzido por Juarez Barroso, o segundo de Cartola na gravadora Marcus Pereira. Neste álbum ele apresentava outras inéditas como a também obra-prima “O Mundo É um Moinho”. Além da delicadeza e do requinte, o que espanta nessas duas músicas é o fato de terem sido criadas pelo compositor numa idade em que a maioria das pessoas já se encontra aposentada, sem muita coisa a oferecer. Cartola é um caso especial em nossa música popular. Homem de origem e vida modestíssimas, era, ao mesmo tempo, poeta e compositor sofisticado. Pena que somente nos últimos anos de vida tenha conseguido gravar a maior parte de sua obra.

Para os curiosos, faltou dizer que o nome 'Cartola' surgiu na época em que o artista trabalhava como pedreiro, porque usava um chapéu para impedir que o cimento sujasse a sua cabeça. Quem diria que um simples apelido viraria sinônimo de uma das maiores riquezas musicais da MPB.

Cartola morreu de câncer em 30 de novembro de 1980, deixando vários órfãos na música. Seus parceiros, amigos e todos aqueles que desfrutaram de sua convivência até hoje sentem enorme saudade do grande e "divino" mestre de Mangueira.

As rosa não falam

Cartola

(11.10.1908-30.11.1980)

Bate outra vez
Com esperanças o meu coração,
Pois já vai terminando o verão, enfim.

Volto ao jardim
Com a certeza que devo chorar,
Pois bem sei que não queres voltar para mim.

Queixo-me às rosas, mas que bobagem
As rosas não falam,
Simplesmente as rosas exalam
O perfume que roubam de ti, ai...

Devias vir
Para ver os meus olhos tristonhos,
E, quem sabe, sonhar os meus sonhos,
por fim.


Cartola por Baptistão


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