quinta-feira, 25 de maio de 2017

Contrabando em Aceguá


Luiz Coronel

(Seu posto era ali, na fronteira com a Banda Oriental Del Uruguay)

Até parece que seu Goya tinha posto goma arábica nas almofadas. Não saía do cargo nem puxado por cinco juntas de bois.

A impressão que se tinha era de que, se o homem nascesse de novo, já nos cueiros seria fiscal aduaneiro.

Viesse chuva ou sol aberto, seu posto era ali, na fronteira com a Banda Oriental del Uruguay.

Com seus óculos tão espessos que pareciam fundo de garrafa, lá estava ele, com sua autoridade que, sem ser insolente, impunha respeito.

Mas acontece que, na dança dos câmbios, o contrabando andava “livre, leve e solto”.

Numa noite em que a lua fora visitar seus parentes em outras cercanias e não havia, nos céus, uma única estrela para alumiar os passos de São Genaro, protetor dos contrabandistas, vinha pela carreteira de Melo uma caminhonete Chevrolet da mais alta suspeição.

Ao se aproximar da linha divisória, seu Goya fez valsear sua lanterninha, que mais parecia um bando de vaga-lumes em saracoteios.

Três uruguaios levavam, no banco traseiro, uma ovelha de contrabando.

Ao sentirem o perigo, Tertuliano, Paquito e Caballero, mais do que depressa, cobriram a ovelha com o poncho lanudo e enfiaram os óculos no ovino passageiro.

Seu Goya alumiou o interior da condução.

 - Lo que se pasa, paisanos?

- Nosotros estamos llevando nuestra tia Mercedes para el hospital de Bagé. Es cosa urgente, señor.

- Pasen, muchachos, pasen – disse o velho fiscal.

Ao voltar para a cabine onde Esteban se espreguiçava ante uma Norteña vazia, comentou Seu Goya:

- A la pucha, que cara de oveja tiene esta tal Doña Mercedita!

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Do livro “O Cavalo Verde”, de Luiz Coronel
Mecenas Editora e Projetos Culturais




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