segunda-feira, 2 de maio de 2022

Oração do bebum

 

Bendito seja o nosso fígado de cada dia,
Venha a nós um copo cheio,

Nunca apenas pelo meio.
Seja feita a nossa cachaçada,

Assim tanto no boteco como na calçada.
O mé nosso de cada dia nos dai hoje,

Amanhã e sempre.
Perdoai as nossas bebedeiras,
Assim como nós perdoamos
A quem não tenha bebido.
Não nos deixai cair no refrigerante
E livrai-nos da água com gás,
Barmem!
 

Miguel M. Abrahão, na obra “O Ônibus” de 1978 

O texto “Oração do Bebum” é, explicitamente, um pastiche do texto “Oração do Pai Nosso”. O autor Miguel Abrahão não tem a intenção de ironizar ou criticar o texto religioso no qual se espelha. Miguel utiliza do bom humor e da compreensão do interlocutor para que seu texto não pareça mal intencionado. 

Reza do bebum 

Pânico 

Santa Cana que estais na roça.

Purificada seja o vosso nome.

Venha a nós o vosso liquido,

Aguardente sem mistura,

Pra ser bebida a nossa vontade,

Assim no boteco como em qualquer lugar. 

Cinco litros por cada dia nos dai hoje,

Perdoai os dias que bebemos menos,

Assim como nós perdoamos o mal que ela nos faz.

Livrar-nos de ficar atordoado e da rádio-patrulha,

Amém! 

Pode beber que não faz mal pra ninguém.

Aí você bebe mais um copo, aí reza o credo:

Creio na subutilidade do gole,

Todo o produto, o da cana e o da caninha.

Creio na aguardente que é o nosso alimento

Qual foi concebida pelo aperto da moenda,

Que foi derramada no cocho ao terceiro dia,

Ressurgiu da garrafa,

Subiu ao céu da boca

Dos cachaceiros paus-d´água. 

Tome outra, mas bem arroiado,

Onde devia alegrar os grande e os pequenos:

Creio no espírito de 40 graus,

Nas santas safras do mel,

Na comunicação dos impostos,

Na remição sem pena,

E na ressaca de todos nós,

Amém!

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