Um fenômeno muito parecido com o da
folclorização do samba aconteceu com a feijoada. O prato ganhou a cara de
comida dos negros, mesmo tendo pouquíssima influência africana. Muita gente
repete que a feijoada nasceu nas senzalas, criada pelos escravos com feijão e
carnes desprezadas na casa-grande. Eis um daqueles mitos que de tão repetidos
se tornam difíceis de derrubar. A feijoada tem origem europeia. Quem diz é
próprio folclorista Câmara Cascudo*.
Luís da Câmara Cascudo
Conforme o que ele conta no livro História da Alimentação no Brasil, nem
índios nem negros tinham o hábito de misturar feijão com carnes. A técnica de
preparo vem de mais longe: o Império Romano. Desde a Antiguidade os europeus
latinos fazem cozidos de misturas de legumes e carnes. Cada região de
influência romana adotou sua variação: o cozido português, a paella espanhola, o bollito misto do norte da Itália. O cassoulet, da França, criado no século 14, é parecidíssimo com a
feijoada: feito com feijão branco, linguiça, salsicha e carne de porco. Com o
feijão-preto, espécie nativa da América que os europeus adoraram, o prato virou
atração entre os brasileiros mais endinheirados. A citação mais antiga que
restou sobre a feijoada mostra a refeição bem longe das senzalas. No Diário de Pernambuco de 7 de agosto de
1833, o elegante Hotel Théâtre, de Recife, informa sua nova atração das
quintas-feiras: “Feijoada à brasileira”.
(Do livro
“Politicamente Incorreto – o Guia dos Guias –
de Leandro Narloch)
de Leandro Narloch)
* Luís da Câmara
Cascudo (Natal, 30 de dezembro de 1898 – Natal, 30 de julho de 1986) foi um historiador,
antropólogo, advogado e jornalista brasileiro.
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