O Cantor do Lotação
Lá pelos idos de 1950, pouco tempo
depois da criação da tropa paraquedista, surgiram e cresceram com ela figuras
lendárias de tanto significado, principalmente para os paraquedistas da
‘antiga’.
Um deles foi
o educadíssimo, vibrador e carismático, o senhor Manoel Maurílio do Sacramento – o Cantor do Lotação.
Nascido em 14 de maio de 1915 e
proprietário de um antigo veículo Ford 1938, adaptado para transportar sete
passageiros, principalmente paraquedistas, no percurso Guarda do Regimento
Santos Dumont – Deodoro – Marechal Hermes e vice-versa.
Na mesma época havia esse mesmo tipo
de ‘lotação’ que percorria o trajeto Madureira – Marechal Hermes, subúrbios do
Rio de Janeiro.
Cidadão vibrante, muitíssimo educado e
alegre, só trajava terno e vivia cantando as canções militares paraquedistas –
a maioria de sua autoria –, contagiando assim seus passageiros. Quando o
paraquedista entrava e se sentava, indagava em que Unidade servia e,
a seguir, passava a entoar a canção da unidade do passageiro.
Entre elas,
cuja letra dizia assim:
Mamãe,
que militares são aqueles,
Marchando
com garbo varonil,
Eles
são os paraquedistas,
Audazes
do ar, orgulho do Brasil.
Sua
boina é colorida,
A
farda um esplendor;
Imagem
da própria vida,
Que
tanto lhe traz amor.
Um
deles veio do Norte,
O
outro veio do Sul,
Pra
encontrar a mesma sorte,
Pairando
no céu azul.
Venceram
mil obstáculos,
“pagaram”
mil “cangurus”.
Estes
são os sustentáculos,
Da
fibra que os induz.
Mataram-se
nas flexões,
Sempre
sem esmorecer,
Dizendo
com seus botões,
Isto
faz um PQD.
Corrida,
torre, balanço...
Corda,
pista, aterragem...
Salto,
recuo, avanço...
Charuto,
morte, voragem...
Saltaram
do avião,
Plena
glória de vencer:
Ostentam,
com emoção,
Boina,
boot, seu brevê.
E
é no nylon flutuante,
Pendurados
em cordéis,
Que
a pátria, estuante,
Encima
os seus lauréis.
O Cantor residiu durante muitos anos,
na Rua Verbenas, no bairro de Vila Valqueire, Rio de Janeiro, onde faleceu com
mais de 90 anos.
Na época, já na inatividade, com a
esposa doente, só saía para o supermercado ou para levá-la ao médico, mesmo
assim, com muita dificuldade. Não fora sem razão, que ingressara na inatividade.
Por outro lado, seu veículo, outrora
seu ganha-pão, também atingiu a inatividade, passando a descansar debaixo de
uma cobertura simples no quintal, encapado, empacotado, como que aguardando o
destino final das múmias – enfaixado e eternizado.
O tempo foi passando e o estado de
saúde da esposa piorou, culminando com o seu falecimento.
O tempo foi passando e uma de suas
vistas foi se perdendo, tendo sido inevitável recuperá-la. Era muito teimoso e
não aceitava nenhum tipo de apoio. Com a visão somente em uma vista,
atravessava a rua num ponto difícil, no caminho para o supermercado, haja vista
que seu caminhar também carecia de maior agilidade que aquele percurso exigia.
Usando de uma dedicação às causas
históricas paraquedistas, Carlos Alberto Serra Marques, ex-cabo “Baiuqueiro” e
integrante da diretoria da ASSOBAI, junto ao Comandante do 26º Batalhão de
Infantaria Paraquedista, prestou-lhe os possíveis apoios, que deveriam ser
voluntários e permanentes pela Grande Unidade Paraquedista, por tanto que significou
Manoel Maurílio do Sacramento.
Da antiga canção da Companhia de
Suprimento e Manutenção de Paraquedas em 1965, que assim dizia:
Seja na terra, ou seja no ar,
A Baiuca está sempre a operar
A Baiuca está sempre a operar
A Baiuca, dobrando, costurando paraquedas vai cumprindo a sua missão,
Para frente intendente lutando até morrer, nós cumprimos o nosso dever.
A Escola, a Consulta e a Decisão,
Sempre o DoMPSA está com a razão.
Sempre o DoMPSA está com a razão.
A Baiuca, dobrando, costurando paraquedas vai cumprindo a
sua missão,
Para frente intendente lutando até morrer, nós cumprimos o nosso dever.
Para frente intendente lutando até morrer, nós cumprimos o nosso dever.
Essa canção foi substituída pela
atual Canção do Batalhão DoMPSA, cuja letra e música são da autoria do Sr. Manoel Maurílio do Sacramento - o ‘Cantor do Lotação’.
Salve a Baiuca base
tradicional
Caserna de confiança
brasileira,
Abrigo de conquista por um
ideal
Em ser um bravo de asas
altaneiras.
Heróis da Baiuca de lauréis,
Depende de ti, a vida e a
glória,
Que no velame agarrado aos
cordéis,
Vão saltar os audazes da
vitória
O velame que o audaz conduz,
A Baiuca pulsa de emoção,
Tua alma se enche de luz,
Ao vê-lo planando vencendo a
imensidão
Sentem orgulho e fé no seu talento,
Nos reparos e lançamentos
pesados,
A Baiuca mira a mão sem
tormento
Vendo descer o gigante
inflado.
Baiuca, segurança de nobre missão
Berço heroico, fiel e ordeiro
Batalhão que protege um
campeão,
Campeão de bravura do
Exército Brasileiro!
Batalhão que protege o campeão
(Pereira, Jorge Barcellos. Ninho das Águias - Histórias que a história
não conta, só nós paraquedistas. Edição 2013, Editora Nova Era - SC. ISBN
978-85-86264-60-3. Pág.117)
Acabei de receber a seguinte notícia
do pessoal da ASSOBAI - Associação dos Baiuqueiros.
Faleceu hoje, aos 98 anos de idade, MANOEL MAURÍLIO SACRAMENTO (Cantor do Lotação), foi encontrado em óbito na sua
residência.
MANOEL MAURÍLIO SACRAMENTO partiu no manifesto
de São Miguel Arcanjo, deixando órfão toda família paraquedista e baiuqueiros,
autor das mais belas canções paraquedistas.
Seu sepultamento será realizado na
segunda-feira (13/05/2013) na parte da tarde no Cemitério de Ricardo de
Albuquerque, RJ.
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