Luiz Coronel*
*Correio do Povo, 14.05.2016
Num estalo de dedos
o Senhor criou a Terra,
o céu, campos e mares.
Quanto aos pecados,
nós os inventamos.
Existe, porém, um pecado
que o Diabo reservou para si
autoria e regência: a tortura.
“– Para esse pecado
não haverá perdão Divino!”
Ufano, proclamou o Demo.
Os torturadores instauram
a República do Medo.
Com tintas de sangue,
redigem relatórios
confidenciais.
Suas mãos mancham
o rosto do filho,
a côdea do pão
e o travesseiro.
O eco
de gritos dilacerantes
os persegue
vida afora.
Em busca do esquecimento,
os torturadores movem-se
entre cartórios e autarquias
em busca de uma Certidão
de Bons Antecedentes.
Mas há sempre uma voz
inesperada
a revelar que aquele rosto,
riso, gesto e semblante
pertencem a um torturador.
E culpas insepultas
rompem o silêncio,
elevam-se sobre a neblina,
espatifam as molduras
e colocam
o passado nos trilhos.
Os torturadores
não se aposentam.
Nem as viagens do vento,
nem as limas do tempo
apagam
suas impressões digitas.
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