Sérgio Porto
Se você
gosta de ver um homem surrando outro, fazendo-o sangrar, procurando reduzi-lo a
inconsciência ou à perda dos sentidos...
Se você é um daqueles que pagou para
ver seu semelhante derrotado pela força, já semicego de contusões e sangue,
esparramar seu corpo inerte e suado sobre a lona...
Se você já viu um boxeador (ou
lutador) assassinar o seu adversário no ringue (ou octógono), com as imunidades
irrestritas concedidas pela chamada nobre arte...
Se você
também chama o boxe (ou MMA) de nobre arte...
Se você se recordar que Emile
Griffith* poderia ter parado de socar o crânio de Kid Paret, quando este já
estava incapacitado para defender-se, que mesmo assim teria ganhado a luta...
Se você pensar que Emile Griffith,
como tantos outros, cometeu um perfeito e impunível crime esportivo...
Se você teve ocasião de ver as
radiografias de cérebro dos famosos pugilistas reproduzidas por um semanário
norte-americano, frangalhos de homens sem memória ao menos para recordar em que
luta perderam o melhor do seu ser...
Se você um dia tivesse em suas mãos
lista completa dos mortos e inutilizados pelas luvas de couro e de crina...
Se você acha justo que dois homens,
para divertimento de uns e enriquecimento de outros, se destruam
reciprocamente, buscando o massacre mútuo, por uma medalha (ou cinturão) que
não foi cunhada com o ouro que realça a verdadeira nobreza do esporte...
Se você já pôde comprar a aparência
de certos rapazes quando se iniciaram no boxe com a aparência de agora, muitos
anos depois, quando têm a cartilagem do nariz destruída, os olhos semifechados
pela saliência dos zigomas e pelo rebaixamento da fronte, as grossas orelhas
arroxeadas de equimoses indeléveis...
Se você já
teve oportunidade de meditar sobre tudo isso e, depois, ainda gosta de boxe...
Você é uma
besta, meu filho!
*Emile Griffith matou
Benny Paret (foto acima)
numa luta de boxe em
1962.
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