quarta-feira, 11 de agosto de 2021

A hora certa de comer

 Giulia Vidale

“Se você comer tarde da noite ou começar o café da manhã em um horário totalmente diferente a cada manhã, estará constantemente deixando seu corpo fora de sincronia. Não se preocupe, a solução é igualmente simples: basta definir uma rotina alimentar e cumpri-la. Tempo é tudo”, escreveu Satchin Panda, um dos maiores especialistas do mundo em ritmos circadianos, no best-seller The Circadian Code: Lose Weight, Supercharge Your Energy, and Transform Your Health from Morning to Midnight. 

É recomendação baseada no princípio da chamada crononutrição, uma área relativamente nova da ciência e que nos últimos anos ganhou tração inédita. Ela investiga o modo pelo qual o relógio biológico, ou ritmo circadiano, influencia o aproveitamento dos nutrientes que ingerimos. O que foi levantado até agora demonstra que quando comer é tão importante quanto o que comer. Tome-se como exemplo o mais recente estudo divulgado. Feito por pesquisadores da Universidade Waseda, no Japão, e publicado no início de julho na revista Cell Reports, o trabalho buscou esclarecer se consumir a maior parte da quantidade diária recomendada de proteínas no café da manhã, em vez de fazê-lo no jantar, resultaria em maior massa muscular. A resposta: sim. A hipótese é que, pela manhã, o metabolismo de proteínas é mais eficiente, contribuindo para o aumento do volume muscular. 

Outras pesquisas indicam que a digestão e a absorção de carboidratos e de gorduras também variam de acordo com o relógio interno. “Os alimentos são processados de modos distintos dependendo do horário em que os consumimos”, afirma a nutróloga Marcella Garcez, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia. Os horários das refeições, enfim, têm grande influência no ganho e na perda de peso e no risco do desenvolvimento de condições como diabetes e doenças cardiovasculares. 

Determinados hormônios, enzimas e o sistema digestivo estão preparados para a ingestão de alimentos pela manhã e à tarde, quando o organismo precisa de energia para dar conta das tarefas cotidianas. À noite, o que ele necessita é descanso. Por isso o sistema endócrino regula o sobe e desce de hormônios ao longo da vigília e do sono de forma a sincronizar produção e hora. Pela manhã, os níveis de cortisol e de insulina estão no máximo. Os dois hormônios atuam em conjunto para facilitar o armazenamento de energia. O cortisol contribui para a fabricação de insulina, responsável por permitir a entrada da glicose circulante no sangue dentro das células. O metabolismo, ou capacidade de queimar calorias, também é maior. À noite, o corpo se prepara para o relaxamento. A liberação da insulina diminui, o cortisol dá lugar à melatonina, hormônio que induz ao sono, e o metabolismo fica mais lento. Os compassos são precisos. “Mudanças na rotina alimentar podem levar a alterações que prejudicam a saúde”, diz o geneticista Marcelo Sady, diretor do laboratório Multigene. A sinfonia do corpo humano pede harmonia. 

Cada prato a seu tempo 

Regras básicas 

Das 8h às 15h 

Ingerir 75% das calorias diárias nesse intervalo. 

Das 8h às 20h 

Manter a ingestão de alimentos nesse período. De preferência, fazer as refeições em horários regulares. 

O corpo processa as calorias  de forma mais eficiente durante o dia, o que contribui para a perda de peso. Nesse período, a sensibilidade à insulina (hormônio que permite a entrada da glicose nas células) é maior e o metabolismo, mais acelerado. 

Menu 

Entre 8h e 10h 

Ovos e pão integral ou ovos com avocado*. 

A primeira refeição do dia deve ser farta e completa, com carboidrato, proteína, gordura e fibra. A composição fornece energia, reduz impulsos alimentares, favorece o ganho muscular e o aproveitamento do açúcar no sangue. Além disso, no início do dia, o corpo secreta muita lipase e protease, enzimas responsáveis pela digestão de gordura e da proteína. 

Entre 12h e 14h 

Macarrão ou arroz integral, carne e vegetais. 

O organismo ganha o último grande aporte de nutrientes distintos e a leptina, hormônio que dá sensação de saciedade produzindo durante e depois da refeição, mantém a fome sob controle. 

Entre 15h e 17h 

Chocolate meio amargo, ou um punhado de castanhas. 

Momento em que o organismo precisa de uma injeção de energia para aliviar o cansaço do dia. 

Entre 18h e 20h 

Peixe ou frango com legumes no vapor 

O jantar precisa ser a refeição mais leve do dia. Carboidratos devem ser evitados, pois o corpo tem mais dificuldades de processá-los. À noite, ocorre a liberação da melatonina, o hormônio que induz ao sono, e redução da liberação de insulina, prejudicando o aproveitamento da glicose pelas células. O metabolismo também fica mais lento, o que diminui a queima de gordura. 

*Avocado é uma espécie de abacate melhorado; um fruto ainda pouco familiar entre os brasileiros, mas altamente nutritivo, que ajuda a manter o coração em ordem. 

O avocado é uma variedade do abacate, um parente próximo em nome, sabor e aparência. Mas cuja principal diferença é a quantidade de calorias que ele oferece. 

(Texto da revista Veja, agosto de 2021)

Nenhum comentário:

Postar um comentário