segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Ara, que susto danado!

 

Um caminhão velho, desses de carregá tranquera, foi buscar na cidade um caixão de defunto pra ser usado por um dito cujo que tinha falecido lá praquelas redondezas. Lá vinha o caminhão com o caixão (sem o defunto, que ainda tava na casa de moradia). 

Eis que, ao passar por um capiau, o motorista é interpelado na tentativa do referido capiau cavar com isso uma bêra, que é praquelas bandas uma carona. 

Capiau: 

- Oh, moço! Será que o sinhô pode me dar uma bêra até o Lageado?

Motorista: 

- Pode trepá lá em cima, coió. E óia: lá na carroceria tem um caixão de defunto, mas não se preocupe porque ele tá vazio. 

Capiau (trepando): 

- Brigado, moço. 

De repente, começa a chuviscar. O tar capiau tinha tomado remédio quente e não podia levar aquele chuvisqueiro na cachola. Abriu a tampa do caixão de defunto vazio e se agasalhou lá dentro dele, de um jeito até bem que gostoso. Fechou o caixão com a tampa, sem medo de nada. 

Acontece que, conforme o caminhão passava na estrada, outros capiaus também pediam bêra, chegando a juntar uns 20 no caminhão. Achavam naturalmente que ali tinha um defunto fresco, pois o motorista ia sempre avisando: 

- Óia. Pode subi, mas num liga praquele lá de riba, não. 

Eis que a chuva dá uma parada boa. Nessa hora, o capiau que ia dentro do tal caixão abre num impacto a tampa e, sentando-se num gesto brusco, pergunta a todos: 

- Cumé, moçada? Já parô de chovê? 

Nem é preciso dizer o que aconteceu. Foi capiau pra tudo quanto era lado, com o caminhão em movimento. 

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Adaptado de Contando Causos, de Rolando Boldrin, (Nova Alexandria, 2001).

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