segunda-feira, 7 de agosto de 2017

História de Teatro


Terra de Sena*


Ele era ator; ela era atriz.
Ela fazia
Como em linguagem teatral
Se diz
A dama ingênua da companhia.

E ele não representava
Assim tão mal,
Era o cínico e toda gente o achava
Um cínico de verdade
E de uma naturalidade
De espantar.

Um dia,
Num ensaio geral da companhia,
Ele resolve a ela confessar
Toda a grande paixão que lhe vai n´alma.
E ela, calma,
No seu papel de ingênua recatada,
Tossiu, tossiu e não lhe disse nada.
Mas o amor ‒ deixemos de léria –
É uma coisa séria!

E no cartório de uma pretoria,
Ela, a ingênua, honesta e recatada,
Ingressava, depois, como casada,
Na companhia
Do cínico ator feito marido.

Mais tarde,
Era sabido
Como triste verdade,
Que os dois pombinhos não se davam bem.

Isto é,
Constava até,
E ninguém o fato desmentia,
Que a bela ingênua não se contentava
Com uma só companhia.

E toda cheia de sinceridade,
Ao seu próprio marido confessava:
‒ Meu gênero sempre foi variedade!

E os outros murmuravam,
Quando eles, um momento,
Da caixa se afastavam,
Que na comédia final do casamento,
Por ela combinado
Entre cenário de uma cena escura,
Ela fizera o cínico afamado,
E ele a ingênua recatada e pura...


*Sob este pseudônimo se tornou conhecido na imprensa carioca Lauro Carmelino Pereira Nunes, que, entre outros êxitos, conta o de ser pai do humorista radiofônico e autor teatral Max Nunes. Nascido no Rio de Janeiro a 17 de maio de 1897, começou sua carreira jornalística no D. Quixote, ao lado de Bastos Tigre, Antônio Torres, Humberto de Campos e outros. Assumiu a direção dessa revista em 1924 a 1926. Foi um dos fundadores de A farpa, com Jefferson; de Rio Teatro, com Celestino Silveira; de A Máscara, com Renato Alvim; de O Trapo; de O Cartaz, com Seth; de Sua Excelência, com Lane de Lacerda. Redator de vários jornais, alguns dos quais secretariou, escreveu duas revistas para o teatro, Saco de Gatos, com Rubem Gill e Charleston, com Mário Magalhães e Renato Alvim. Dois livros, Diabo a Quatro e Rua da Amargura, reúnem parte de sua obra humorista.

(Do livro “Antologia de Humorismo e Sátira”, de R. Magalhães Junior)



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