Parte 1
AS POMBAS
Raimundo Correia
Vai-se
a primeira pomba despertada...
Vai-se
outra mais... mais outra... enfim dezenas
De
pombas vão-se dos pombais, apenas
Raia
sanguínea e fresca a madrugada...
E
à tarde, quando a rígida nortada
Sopra,
aos pombais de novo elas, serenas,
Ruflando
as asas, sacudindo as penas,
Voltam
todas em bando e em revoada...
Também
dos corações onde abotoam,
Os
sonhos, um por um, céleres voam,
Como
voam as pombas dos pombais;
No
azul da adolescência as asas soltam,
Fogem...
Mas aos pombais as pombas voltam,
E
eles aos corações não voltam mais...
OS VOTOS
Ângelo Bitu
(pseudônimo, entre outros, de Bilac)
Vai-se
a primeira votação passada...
Vai-se
outra mais... mais outra... enfim dezenas
De
votos vão-se da Assembleia, apenas
A
sessão começou da bordoada!
Sopra
sobre Ele a rígida nortada...
Que
saudades das épocas serenas
Tinham
apurações de cambulhada!
O
seu bom-senso todos apregoam...
Afastando-se
d'Ele, os votos voam,
Como
voam as pombas dos pombais...
As
esperanças o seu voo soltam...
E
Ele vê que aos pombais as pombas voltam,
Mas
esses votos não lhe voltam mais!
A REVOADA
Lisindo Coppoli
O
primeiro ministro lá vai indo;
Outro
o segue, outro mais, enfim o bando
Inteiro
solta as asas azulando,
Antes
que a demissão os vá impelindo.
Também
as pombas do soneto lindo,
Na
rósea madrugada, vão deixando
O
ninho amigo, ao qual irão voltando,
Ansiosas,
quando a tarde for caindo.
Mas
aqui não há pombas nem pombais:
Há
ministros que partem em surdina,
Certos
de não voltarem nunca mais.
Deixam
o ministério sem alarde;
E
o povo que lhes deve a triste sina,
Olhando
o voo, suspira: − Já vão tarde!
AS MINHAS NOTAS
Zé Fidélis
Bai-se
a primãira pomba dispertada,
I,
após iéla, oitra, mais oitra i oitra mais!
Aimfim,
uma purçãon bai indo aim buarada,
Nunca
bi uma squadrilha aim prupurções tais!
Lá
bão iélas! Pra longe, pra bãim longe até!
Talbêz
quêir na farra, num pumbal distante,
Vrincare,
guzare a bida qui bãim curta ié!
I
pra bultare nãon prucisam di sistãite...
Tambãim,
como as tais pombas du Reimundo,
Sai
u dinhãiro buando du meu volso fundo.
Cada
notinha linda, cada p'lega nóba!
Mas
as pombas boltam logo qu'anoitece,
Que
ficare nu sireno não lhis ap'tece
E
as minhas notas, essas... boltam uma óba!...
O soneto e as paródias
Parte 2
MAL SECRETO
Raimundo Correia
Se
a cólera que espuma, a dor que mora
N'alma,
e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo
o que punge, tudo o que devora
O
coração, no rosto se estampasse;
Se
se pudesse, o espírito que chora,
Ver
através da máscara da face,
Quanta
gente, talvez, que inveja agora
Nos
causa, então piedade nos causasse!
Quanta
gente que ri, talvez, consigo
Guarda
um atroz, recôndito inimigo,
Como
invisível chaga cancerosa!
Quanta
gente que ri, talvez existe,
Cuja
ventura única consiste
Em
parecer aos outros venturosa!
MAL DISCRETO
Bastos Tigre
Se
a prontidão, a pinda, a quebradeira
E
os vários males desta mesma classe,
Tudo
o que punge a tísica algibeira,
Sobre
o rosto do “pronto” se estampasse;
Se
se pudesse a crise financeira
Ler
“através da máscara da face”,
Quanta
gente, talvez, que da primeira
Fila,
então, para a última passasse...
Quanta
gente nós vemos, quanta gente,
Cuja
gravata, cautelosamente,
Uma
camisa enxovalhada esconde!...
Quanto
moço elegante e perfumado
Que
anda, imponente, de automóvel... fiado,
Porque
lhe faltam níqueis para o bonde!
MAL SICRETO
Furnandes Albaralhão
S'a
cólera que põe danada a gente,
Distrói
a paz da bida disijada,
Tudo
o que nos vilisca intiriormente
Suvisse
à nossa cara, qu'istupada!...
Si
si pudesse, a ialma padicente,
Bêre
pur trás de muita guergalhada,
Canta
gente a se rire vestamente,
Que
era muito milhóre estar calada!
Canta
gente só ri pra disfarçare
Um
turco à porta que lhe bem cuvrare
A
quemisa, a ciloira, a maia, u cinto...
Cantos
há nesse mundo a três por dois,
Que
tendo à janta só cumido arroz,
Arrotam
p'ru, laitão e binho tinto!
O soneto e as paródias
Parte 3
OUVIR ESTRELAS
Olavo Bilac
“Ora
(direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste
o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que,
para ouvi-las, muita vez desperto
E
abro as janelas, pálido de espanto...
E
conversamos toda a noite, enquanto
A
Via Láctea, como um pálio aberto,
Cintila.
E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda
as procuro pelo céu deserto.
Direis
agora: “Tresloucado amigo!
Que
conversas com elas? Que sentido
Tem
o que dizem, quando estão contigo?”
E
eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois
só quem ama pode ter ouvido
Capaz
de ouvir e de entender estrelas.”
OUVIR ESTRELAS
Bastos Tigre
Ora,
direis, ouvir estrelas! Vejo
Que
estás beirando a maluquice extrema.
No
entanto o certo é que não perco o ensejo
De
ouvi-las nos programas de cinema.
Não
perco fita; e dir-vos-ei sem pejo
Que
mais eu gozo se escabroso é o tema.
Uma
boca de estrela dando beijo
É,
meu amigo, assunto pra um poema.
Direis
agora: − Mas enfim, meu caro,
As
estrelas que dizem? que sentido
Têm
suas frases de sabor tão raro?
−
Amigo, aprende inglês para entendê-las,
Pois
só sabendo inglês se tem ouvido
Capaz
de ouvir e de entender estrelas.
UVI STRELLA
Juó Bananére
Che
scuitá strella, né meia strella!
Vucê
stá maluco! e io ti diró intanto,
Chi
p'ra iscuitalas moltas veiz livanto,
I
vô dá una spiada na gianella.
I
passo as notte acunversáno co'ella,
Inguanto
che as otra lá d'un canto
Stó
mi spiano. I o sol come un briglianto
Nasce.
Oglio p'ru céu: − Cadê strella?!
Direis
intó: − Ó migno inlustre amigo!
O
chi é chi as strellas ti dizia
Quano
illas viéro acunversá contigo?
E
io ti diró: − Studi p'ra intendela,
Pois
só chi giá studô Astrolomia,
É
capaiz de intendê istas strella.
OUVIR O MESTRE
Eno Teodoro Wanke
“Ora
(direis) ouvir o mestre... Certo
perdeste
o senso!” − Eu vos direi, no entanto,
que,
para ouvi-lo, muita vez desperto
no
meio da aula, pálido de espanto!
E
como fala o homenzinho, enquanto
meu
relógio não anda... É que, decerto,
parou!
Sacudo. Escuto. Não... E, em pranto,
comprovo
quanto o início ainda está perto.
Direis
agora: “Tresloucado amigo!
E
esse teu professor... Oh, que sentido
tem
o que diz?...” Mas eu nem ligo,
e
vos direi: “Pois queira ser doutor!
−
Só quem tal quer, consegue ter o ouvido
capaz
de suportar um professor!”
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