Antes do acerto em Ponche Verde , os
farroupilhas esforçaram-se para arrancar cláusulas honrosas ao tratado de paz.
Em 19 de novembro de 1844, o
embaixador da República Rio-Grandense, Antônio Vicente da Fontoura, embarcou
para o Rio de Janeiro para as negociações. As conferências começaram em 13 de
dezembro.
Vicente da Fontoura era tosco para os salamaleques da Corte, vestia-se em desacordo com a moda. No seu diário, registrou “uma indiferença ridícula e um orgulho tolo” por parte dos ministros imperiais, que mal disfarçavam o risinho ao ver o caipira. Mas os cortesãos logo foram obrigados a mudar de postura.
Na tentativa de seduzirem o
visitante, os ministros acenaram com uma audiência especial a ser concedida por
Dom Pedro II. Mas Vicente da Fontoura atalhou com sua rude diplomacia.
Argumentou que respeitava a autoridade do jovem monarca, mas que não poderia
beijar sua mão por não ser um súdito do Império. Representava uma nação
independente.
O embaixador quase blefava. Sabia que
desde a chegada de Luís Alves de Lima e Silva ao Rio Grande do Sul – assumiu a
presidência (governador) e o comando militar em novembro de 1842 – a rebelião
estava com os dias contados. O Barão de Caxias (depois foi duque) dispunha de
20 mil soldados, enquanto os farrapos estavam reduzidos a mil homens em armas. Por outro lado,
esgrimia com um trunfo: o Império precisava da província insurgente para deter
a cobiça dos vizinhos espanhóis. Não haveria melhores sentinelas.
(Do jornal Zero Hora)
Atentado de
Antônio Vicente da Fontoura
Há 157 anos, em 20 de outubro de
1860, Cachoeira do Sul perdia uma de suas figuras mais ilustres, o comendador
Antônio Vicente da Fontoura. Reconhecido pelos títulos que acumulou ao longo
dos seus 53 anos de vida e como Embaixador da Paz, Vicente da Fontoura entrou
para a história ao atuar ativamente nas negociações e na assinatura da Paz de
Ponche Verde, em 1845, documento que colocou um ponto final na Revolução
Farroupilha. Seu assassinato se tornou uma história que desperta curiosidade
por envolver brigas políticas, homens renomados, antigos amigos e traição.
Em 2010, a equipe do Arquivo
Histórico de Cachoeira do Sul, em visita ao Arquivo Nacional, no Rio de
Janeiro, localizou o processo criminal de 650 páginas com a investigação da
morte de Antônio Vicente da Fontoura. O documento foi remetido para Cachoeira
digitalizado, serviço pago por três cachoeirenses descendentes do comendador,
que doaram o valor de R$ 670,00. Há também um processo no Arquivo Público do
Rio Grande do Sul, o qual o grupo já tinha conhecimento.
Apesar de apresentar imagens bastante
escuras, ele permite descobrir detalhes da investigação. O documento original,
todo escrito à mão, está guardado no Arquivo Nacional. Segundo a diretora do
Arquivo Histórico, Ione Sanmartin Carlos, entre os fatos relatados no processo
está a bengalada que Vicente Fernandes de Siqueira desferiu contra Vicente da
Fontoura para lhe distrair, a fim de que então Manoel Pequeno pudesse lhe dar
as três facadas que lhe tiraram a vida.
HISTÓRIA
Para os historiadores, o inquérito da
morte de Antônio Vicente da Fontoura é um documento especial, pois relata
fatos, nomes, idades e mostra um pouco do ambiente hostil que Cachoeira do Sul
viveu logo depois de elevada a categoria de cidade em 15 de dezembro de 1859.
Catedral: palco de um crime que chocou a província
Todo cachoeirense já entrou na
Catedral Nossa Senhora da Conceição, um prédio construído em 1779. Porém, nem
todos sabem que a igreja, hoje sede da Diocese de Cachoeira do Sul, já foi palco
de um crime que chocou a então Província de São Pedro do Rio Grande do Sul,
hoje, o estado do Rio Grande do Sul. Foi dentro da Catedral, em 8 de setembro
de 1860, que o comendador Antônio Vicente da Fontoura recebeu a bengalada e as
três facadas que lhe tirariam a vida 42 dias depois, em 20 de outubro de 1860.
Sem os recursos da medicina de hoje
em dia para curar os ferimentos, Vicente da Fontoura não resistiu a uma
infecção. O clima eleitoral do dia 7 e 8 de setembro de 1860 para escolher os novos
vereadores e juiz de paz (eleição que aconteceu dentro da igreja) não era nem
um pouco amistoso. De um lado estava o partido Luzia (liberais) liderado por
Vicente da Fontoura e o coronel José Gomes Portinho. Do outro, o Saquarema
(conservadores) tendo como principais figuras os coronéis Hilário Pereira
Fortes e Felisberto de Carvalho Ourique (que antes era seu amigo e compadre e,
inclusive, lutou ao lado de Antônio Vicente, na Revolução Farroupilha).
Morte premeditada
Como o prestígio de Vicente da
Fontoura e Portinho era muito maior do que o dos demais, a vitória do partido
Luzia era dada como certa. Premeditar a morte de Vicente da Fontoura era a
forma de estabelecer o terror e o pânico entre os adversários.
Importante
Há relatos que apontam que Manoel
Pequeno não queria cometer o crime. Ao ser chamado para atacar Antônio Vicente
da Fontoura ele teria dito que “nestes tipos de assunto, o fim para os escravos
era a morte ou o mato”. De fato, Manoel Pequeno chegou a fugir para o mato, mas
acabou sendo capturado e condenado.
Manoel Pequeno, o escravo matador
A ordem do assassinato foi dada ao
escravo liberto Manoel Pequeno, que tinha pertencido a Hilário Pereira Fortes,
o Barão de Viamão. A liberdade de Manoel Pequeno era, em partes, devida ao
próprio Vicente da Fontoura, que chegou a dar dinheiro para sua libertação. Em
meio a um tumulto causado pela identificação de um votante, Vicente Fernandes
de Siqueira aproveitou para dar uma bengalada em Vicente da Fontoura e lhe distrair
para que Manoel Pequeno pudesse lhe dar as três facadas que atingiram seu
ventre.
Em meio ao novo tumulto que se formou, Portinho subiu em uma cadeira e pediu ordem e calma aos seus companheiros de partido que queriam vingar a morte do chefe e amigo. Neste momento, se ouviu um tiro e logo depois o segundo e o terceiro. Dois atingiram a parede na direção em que estava Portinho e um pegou em sua farda, mas não o feriu.
Espada
Segundo documento do Museu Municipal
de Cachoeira do Sul, indignado, ele pegou a espada e partiu para cima de
Hilário Pereira Fortes, colocando a ponta dela em seu peito. Apavorado, Pereira
Fortes teria pedido para que não o matasse, pois era chefe de família. Ao
retirar a espada de seu peito, Portinho teria dito “Não te mato porque não sou
assassino como tu”. Sabia-se na época que, apesar de liberto, Manoel Pequeno
continuava morando nas terras de Pereira Fortes, o que mostrava que eles ainda
tinham ligação.
Atenção
O crime ainda é tema de mestrado e
doutorado de vários estudiosos, até mesmo de não cachoeirenses e alguns deles
estão disponíveis no Arquivo Histórico, assim como as cópias digitalizadas dos
processos criminais.
Condenação por enforcamento
Os crimes ocorridos na Catedral resultaram
em apenas uma punição, que foi a de Manoel Pequeno, condenado à morte por
enforcamento. Não se sabe onde foi a sua execução, mas normalmente elas
aconteciam em praça pública. Os demais coronéis (Hilário Pereira Fortes,
Felisberto de Carvalho Ourique, José Pereira da Silva Goulart e Vicente
Fernandes de Siqueira), todos os membros da elite local, apesar de terem sido
presos, apresentaram defesa por escrito e foram despronunciados.
Enquanto estiveram presos, os senhores receberam várias manifestações de apoio de amigos. Na época, se a aplicação da justiça não fosse efetiva, era pelo menos teatralizada. Não era comum encontrar membros da elite econômica e política ingressando como réus nas cadeias públicas, mas era preciso dar uma explicação ao presidente da província, na época Joaquim Antão Fernandes Leão, que mesmo sendo conservador, teve que levar os senhores por um tempo para a cadeia.
*****
Em entrevista à Patrícia Mirando
do Jornal do Povo, Ione Sanmartin Carlos deu informações sobre o atentado a
Antônio Vicente da Fontoura. A reportagem acima saiu no jornal do final de
semana, 19 e 20 de outubro de 2012.
Rico material sobre esse personagem histórico encontra-se à disposição dos interessados, aqui, no Arquivo Histórico.
(Texto contido no
Blog do Arquivo Histórico de Cachoeira do Sul)
Antônio Vicente da Fontoura foi
um político, diplomata e comerciante brasileiro. Principal líder civil da
República Rio-Grandense, negociou a paz de Ponche Verde, que reintegrou o Rio
Grande do Sul ao Brasil.
Comerciante, Veterano da
Revolução Farroupilha, Deputado e Ministro na "República
Rio-Grandense".
Nascimento:
16 de junho de 1807, Rio Pardo,
Rio Grande do Sul;
Falecimento:
20 de outubro de 1860, (53 anos) Cachoeira do
Sul, Rio Grande do Sul;
Livros:
Diário: de
1o. de janeiro de 1844 a 22 de março de 1845.
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