domingo, 17 de novembro de 2019

O cabaré da Chininha



(...)

Quem no Alegrete não se lembra de como corria rápida a notícia da chegada de alguma mulher nova na Chininha? Fato que era sinônimo de casa cheia. A casa, através da sua gerenta, criava imediatamente uma regulamentação, que visava a isolar a recém-chegada dos guspidores*, reservando-a aos coronéis*.

A propósito, se diz de mercadoria oferecida com pouca vontade e muita exigência: “É como china francesa em cabaré de fronteira”.

Quando tinha seus 18 anos, Paulino Leães Dornelles foi certa noite na Chininha. Guri novo, pouca plata, ficou amarrando até tarde para conseguir um pouso mais barato, e fazia noites que estava de olho na Gina.

Lá pelas tantas, notou que ela já havia feito três instantes* e, carregando no charme, convidou-a para passar a noite, oferecendo-lhe quinhentos cruzeiros. Embora, de acordo com a tabela, fosse mil cruzeiros, ela concordou, pois já havia feito a féria e o Paulino não lhe era indiferente. Mas avisou:

− A chave* é com a Dona Chininha e ela não faz por menos de mil cruzeiros.

Quinhentos mais mil dava mil e quinhentos e o capital de Paulino era de novecentos e poucos pilas*.

Sem pedir rebaixa, perguntou:

− Mas será que não tem um quarto mais barato? Por mim nem precisa ter chave; pode ser só com tramela*.

*****

*Guspidores: de cuspe, indivíduos comuns, duros, homens do povo em geral.

*Coronéis: fazendeiros ricos.

*Instante: tempo mínimo para um programa numa zona de meretrício; só um orgasmo masculino e deu.

*Chave: a senha para que um freguês pudesse ocupar um dos quartos do cabaré, pois já havia pago, antecipadamente, o valor da ocupação do mesmo

*Pila: forma gaúcha de nomear moeda em voga.

*Tramela: espécie de tranca para portas, moldada em madeira, com um furo no centro, é pregada no batente das portas, de tal forma que pode ser girada, mantendo a porta travada quando necessário. O nome correto oficial para esta tranca de acordo com dicionários é a taramela.


O compadre Abílio Nogueira de Oliveira, quando moço, passou uma temporada em Bagé e de lá voltou com ares mundanos. Certa feita, na Chininha, noite de chuva e pouca frequência, mesas desertas, meu compadre, sentado a beber devagarito a consumação, estava de dono do campinho. Moço novo, bem apessoado, além de normalmente não beicear, já havia levado umas quantas cantadas para pouso, ao que respondia:

− Só se tu me fizeres o que fazem as mulheres de Bagé.

O mulherio ficava meio cabreiro e não topava, mesmo sem saber o que faziam em Bagé.

A las cansadas*, uma delas, vendo que topava ou dormiria sozinha, disse a ele:

− Então vamos, meu bem.

Passaram uma noite muito boa, pois meu compadre era bom de cama: deitava e dormia.

Ao se preparar para ir embora, já vestido, a mulher não resistiu mais e lhe perguntou:

− Meu bem, fizemos tudo papai-mamãe*, mas o que afinal fazem as mulheres de Bagé?

Meu compadre, já saindo porta afora, esclareceu:

− Nunca me cobraram nada.

*****

A las cansadas: significa algo que se faz atrasado, no último momento, com as últimas forças, no final da noite.

Papai-mamãe: clássica posição sexual: homem por cima e mulher por baixo.


Outra vez, um cliente, gaúcho de bota e bombacha, após beber bastante, convidou sua acompanhante para irem ao quarto. Despiram-se e começaram as preliminares, notando a mulher que o parceiro, devido ao trago, estava pouco possibilitado para as lides do amor.

A mulher se excitando, e o parceiro nada, até que ela teve uma ideia: pegando-o carinhosamente pelos cabelos, foi encaminhando sua cabeça para baixo, fazendo-lhe um pedido sussurrado:

− ..................................................................................................................

“No hay cosa como el peligro para curar el mamão”*, de um salto, sóbrio, repentinamente, entre brabo e chocado, respondeu:

− Mas nem de canudinho!

*****

Do livro “Esbarrada Final”, de Luiz Odilom Pereira Rodrigues,
Martins livreiro-Editor

*Não existe perigo para curar mamão. Nada com uma coisa inusitada para deixar um bêbado sóbrio repentinamente.

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