segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Comparações poéticas II

Mal Secreto

Se a cólera que espuma, a dor que mora
N’alma, e destrói cada ilusão que nasce,
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora
Ver através da máscara da face,
Quanta gente, talvez, que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez, consigo
Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez existe,
Cuja a ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!

Raimundo Correia

Mal Discreto

Se a prontidão, a pinda, a quebradeira
E os vários males desta mesma classe,
Tudo o que punge a tísica algibeira,
Sobre o rosto do "pronto" se estampasse;

Se se pudesse a crise financeira
Ler "através da máscara da face",
Quanta gente, talvez, que da primeira
Fila, então, para a última passasse...

Quanta gente nós vemos, quanta gente,
Cuja gravata, cautelosamente,
Uma camisa enxovalhada esconde!...

Quanto moço elegante e perfumado
Que anda, imponente, de automóvel... fiado,
Porque lhe faltam níqueis para o bonde!

Bastos Tigre

Mal Sicreto

S'a cólera que põe danada a gente,
Distrói a paz da bida disijada,
Tudo o que nos vilisca intiriormente
Suvisse à nossa cara, qu'istupada!...

Si si pudesse, a ialma padicente,
Bêre pur trás de muita guergalhada,
Canta gente a se rire vestamente,
Que era muito milhóre estar calada!

Canta gente só ri pra disfarçare
Um turco à porta que lhe bem cuvrare
A quemisa, a ciloira, a maia, u cinto...

Cantos há nesse mundo a três por dois,
Que tendo à janta só cumido arroz,
Arrotam p'ru, laitão e binho tinto!

Furnandes Albaralhão



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